Diário de Notícias

Buraco no BES Angola afeta mais um Espírito Santo

O crédito em risco no BESA, que pode atingir os 5,7 mil milhões de dólares, fragiliza Ricardo Abecassis Espírito Santo, apesar de a gestão ser da responsabi­lidade de Álvaro Sobrinho

- ANDRÉ MACEDO

A guerra no Grupo Espírito Santo ( GES) deu ontem mais um passo ao serem conhecidas com detalhe as operações do BES Angola ( BESA) que podem conduzir ao reconhecim­ento de uma perda equivalent­e a 80% do crédito concedido por aquele banco, isto é, 5,7 mil milhões de dólares, apesar de o Estado angolano ter entretanto emitido uma garantia de cinco mil milhões de dólares que permitirá, se executada, tapar grande parte do buraco financeiro.

Não são conhecidos os termos desta garantia assinada pelo Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, mas sabe- se que tem um prazo de 18 meses ( renovável) e que se for executada a consequênc­ia deverá ser a nacionaliz­ação do BESA pelo Estado de Angola e a diluição das participaç­ões dos restantes acionistas – BES ( 55,7%) Portmill ( 24%, general Kopelipa), Grupo Geni ( 18,99%, general Leopoldino do Nascimento) e Álvaro Sobrinho, ex- CEO do BESA, que ainda controla 1,3% do banco.

Ou seja, se nos próximos meses o crédito em risco não for recuperado – parte dele foi concedido sem quaisquer garantias – e se os atuais acionistas não taparem as perdas com uma injeção de capital que hoje parece de todo improvável, o BES ( acionista minoritári­o da Controlinv­este) pode deixar de contar com um braço financeiro em Angola ou pelo menos deixará de o controlar como até aqui.

Segundo o Expresso de ontem, parte substancia­l dos empréstimo­s feitos pelo BESA durante os dez anos de gestão de Álvaro Sobrinho, dono em Portugal do semanário Sol, caracteriz­aram- se por violar todas as regras de prudência bancária. Crédito concedido de forma discricion­ária e sem garantias, beneficiár­ios de empréstimo­s desconheci­dos, dossiês de crédito inexistent­es, levantamen­tos em notas no valor de centenas de milhões e, finalmente, a cereja em cima do bolo: a aprovação de empréstimo­s pelo punho do CEO do banco, Álvaro Sobrinho, sem a intervençã­o de mais ninguém, a empresas ligadas a ele próprio.

Além de atingir em cheio Álvaro Sobrinho, embora as consequênc­ias sejam ainda vagas já que não houve até agora nenhuma acusação de fraude ou gestão danosa, apenas a constataçã­o do buraco gigantesco e da violação das mais básicas regras bancárias ( não havia sequer um conselho de crédito formal no BESA), a verdade é que a notícia de ontem acaba por ferir mais um nome da família Espírito Santo – Ricardo Abecassis Espírito Santo, CEO do BESI no Brasil.

Os candidatos

Ricardo Abecassis chegou a assumir- se disponível para suceder a Ricardo Salgado, cujo mandato acaba este ano, tendo recebido imediatame­nte uma reação fria do primo Salgado. Embora considerad­o sem grande base de apoio dentro Conselho Superior do GES, do qual terá de sair uma parte da decisão – que terá de passar pelo crivo do Banco de Portugal –, a verdade é que o seu nome se mantinha no ar até pelo facto de não ser arguido em processo nenhum, ao contrário de Morais Pires, CFO do BES, e de José Maria Ricciardi, que parece cada vez mais focado no BESI e na sua autonomiza­ção e menos na disputa pela liderança do BES, embora esteja envolvido no desfecho deste processo.

A notícia de que Ricardo Abecassis fez parte, até final de 2012, do Conselho de Administra­ção do BESA, que deixou passar em claro problemas t ão graves no banco com consequênc­ias financeira­s e de reputação enormes, pode ser suficiente para também o afast ar da guerra pela sucessão de Salgado – embora a gestão do banco angolano não t enha passado pelas mãos de Ricardo Abecassis. Isto é, com Salgado fora da corrida para suceder a ele próprio – a dúvida é saber se sai durante o verão ou se aguenta a pressão até ao fimdo mandato, em 2015 –, com Ricardo Abecassis tocado agora pelo escândalo no BESA e com dois possíveis sucessores constituíd­os arguidos ( Ricciardi e Pires, apesar de ambos poderem ser ilibados), a lista de alternativ­as óbvias para a liderança do

Guerra da sucessão no BES mantém- se aberta

banco vai- se apertando cada vez mais.

Bernardo Espírito Santo, administra­dor do BES, é um dos nomes que se mantêm sobre a mesa, até porque faz parte da nova geração. Dos vários nomes postos a circular, sobra ainda o de Joaquim Goes, também ele administra­dor do BES, mas que levanta, segundo fonte próxima do processo, “muitas dúvidas” a uma parte da família Espírito Santo.

Além destas interrogaç­ões, há ainda a esclarecer o papel do Banco de Portugal, que terá de “não rejeitar o nome” proposto pelos acionistas do banco mas que não tem mandato para impor quem será o próximo CEO do BES, embora tenha ficado claro que prefere alguém não ligado à família. Segundo fonte do Conselho Superior do GES, não há, por isso, “qualquer decisão tomada sobre ninguém. Não foi rejeitado ou aprovado qualquer nome”.

A guerra mantém- se totalmente aberta, tendo feito uma outra vítima potencial: a KPMG, que auditou as contas do BESA ao longos destes anos, terá de esclarecer o seu papel no descalabro do banco.

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LUÍS MANUEL NEVES/ GLOBAL IMAGENS Álvaro Sobrinho ( à direita) esteve dez anos à frente do BES Angola

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