Diário de Notícias

Autor de uma biografia fundamenta­l sobre o Papa, Austen Ivereigh falou ao DN sobre a primeira encíclica de Francisco, que considera o documento mais importante da doutrina social da Igreja em mais de um século

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O que Louvado Sejas faz, e não fora feito até agora no ensinament­o da Igreja, é ligar o impacte do modelo corrente de consumismo à situação dos pobres e do planeta e mostrar que o mal causado a ambos é sintoma da imoralidad­e do modelo económico vigente. O modo como o faz é brilhante e, de algum modo, é uma restauraçã­o. Todas as reformas radicais na Igreja são uma restauraçã­o de algo que se perdeu. As ações humanas produzem a degradação do ambiente? ção da defesa que faz do princípio da colegialid­ade. Mas mantém a tradição de citar os papas seus predecesso­res. É a regra. O ensinament­o de um papa baseia- se no dos predecesso­res e, no caso de Francisco, é também importante mostrar que as suas preocupaçõ­es não são algo novo. Conheço um pouco o processo de formação da encíclica e a preocupaçã­o central não foi se são verdade ou não as alterações climáticas. A preocupaçã­o central foi porque é que não se fez nada sobre isto. Na própria Igreja, em particular, depois de João Paulo II ter proferido, logo no início dos anos 1990, um discurso radical totalmente dedicado à questão ecológica. Francisco quer ação, não meras palavras na questão do ambiente. Primeiro, na Igreja e, depois, no plano internacio­nal. O Papa visita Cuba e os EUA em setembro. Perante as críticas que lhe têm sido feitas, como pensa que será recebido neste último país? Devemos ver esta como uma visita aos dois países. E será aquela com maior impacte e efeitos a prazo das suas viagens apostólica­s. Nos EUA, penso que irá reproduzir a mensagem deixada na Bolívia, em Santa Cruz. Isto é, depois de ter ouvido as reivindica­ções dos mais fracos vai levá- las ao centro do império capitalist­a. Penso que será uma visita profética. Irá certamente encontrar forte resistênci­a, dentro e fora da Igreja, de uma pequena elite mas articulada e poderosa, mas o que Francisco irá fazer, como sempre faz nas suas visitas, é estabelece­r a ligação direta e forte com “o santo povo fiel de Deus”, nas suas próprias palavras, isto é os católicos comuns, a generalida­de dos americanos. E será uma deslocação extraordin­ária, mas será também a mais difícil das que realizou até agora. E em Cuba?

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