Polícia Marítima em operação para controlar imigrantes no Mediterrâneo
Autorização, dada há um mês pelo ministro da Defesa, envolve uma embarcação preparada para realizar operações noturnas
A Polícia Marítima ( PM) vai participar, no último trimestre do ano, numa operação da Agência Frontex para controlar “fluxos migratórios irregulares” no Mediterrâneo ( ver pág. 27).
A autorização, dada há um mês pelo ministro da Defesa, envolve uma embarcação preparada para realizar operações noturnas de combate à imigração ilegal, sete agentes da PM – um deles a colocar no centro de coordenação do quartel- general da Guarda Costeira Grega – e um técnico de manutenção.
Portugal assumiu ainda a disponibilidade para manter, até 30 de setembro de 2016, o mesmo nível de participação da PM – em cooperação com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras ( SEF) – na Operação Poseidon da Agência Frontex, responsável pela gestão das fronteiras da União Europeia.
Portugal participa há vários anos nas operações da Frontex no Mediterrâneo através do SEF, da PM e da GNR ( as três com poder de autoridade policial), e ainda com o apoio de meios militares da Força Aérea e da Marinha.
A PM já interveio na Operação Poseidon ao largo da Grécia em abril de 2014, com uma embarcação cabinada e equipada com câmara de visão noturna que permitiu resgatar 57 imigrantes clandestinos ( maioritariamente sírios).
Essa lancha tem estado avariada desde então, pelo que será enviada outra para a missão deste ano – uma especificamente equipada com meios de fiscalização da pesca ( que terão de ser retirados) destacada na região Norte, em vez de outras em que não seria necessário gastar tantas verbas para enviar para o Mediterrâneo, adiantaram fontes policiais ao DN.
Esta é a primeira vez que a participação da PM nas missões da Frontex é autorizada por despacho ministerial e tendo por base um ofício da Autoridade Marítima Nacional ( AMN), disseram fontes do setor ao DN. Competências Esta opção foi assumida após a exoneração do anterior comandante- geral da PM e contém uma novidade: o despacho, publicado na Ordem da PM, identifica aquela força de segurança através de uma fórmula sem existência jurídica – Autoridade Marítima Nacional- Polícia Marítima ( AMN- PM) – e que motivou um pedido de audiência ao primeiro- ministro por parte da Associação Socioprofissional da PM.
Daí parece resultar que as operações policiais da PM ficam inse- ridas no âmbito da defesa nacional em vez de na segurança interna, alertou uma fonte, pois o responsável da AMN é o chefe militar da Marinha. Acresce que a AMN não tem autoridade de polícia conferida pela lei, necessária para intervir no âmbito da Agência Frontex ( na qual Portugal está representado pelo SEF).
Para o juiz- conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça António Bernardo Colaço, as Autoridades Nacionais que são órgãos de coordenação – como a AMN – “não podem dispor de uma força policial própria”. No caso da AMN, a lei diz que “é a entidade responsável pela coordenação das atividades […] a executar pela Armada, pela Direção- Geral da Autoridade Marítima ( DGAM) e pelo Comando- Geral da Polícia Marítima ( CGPM)”. Note- se que a legislação relativa à PM ( e das restantes forças de segurança) é matéria de reserva absoluta do Parlamento.
Esta referência AMN- PM recorda um episódio similar ocorrido em 2007, quando num diploma legal apareceu o termo Marinha/ AMN – significando que o ramo naval das Forças Armadas ( FA) também era a AMN.
Essa formulação foi eliminada pelo atual governo, porque não tinha existência jurídica nem era reconhecida por outras estruturas do Estado com poder de autoridade marítima.
Agora, asseguram fontes do setor, trata- se de replicar o mesmo processo: fazer que a PM seja vista como “parte integrante” da AMN, pois o seu responsável é o chefe militar da Marinha.
O Ministério da Defesa disse ao DN que o despacho com a nova sigla AMN- PM “está de acordo” com o diploma que visou clarificar as competências militares da Marinha face às da AMN ( civis).
Só que esse decreto- lei ( 235/ 2012) diz que “o comandante- geral é o órgão superior de comando da PM”, pelo que está diretamente subordinado ao ministro da tutela – e não é um chefe militar, via AMN, quem dirige ou comanda a PM, sustentaram as fontes.
Note- se que o diploma diz “que o exercício da Autoridade Marítima […] se insere no quadro constitucional da Administração Pública e do exercício de polícia, distinto do que a Constituição reserva quanto ao enquadramento das FA e, em moldes concretos, à defesa militar da República”.
Em 2014, a lei orgânica daquele ramo militar extinguiu todos “os órgãos e ser viços da AMN, enquanto estrutura da Marinha, sendo as suas atribuições integradas na AMN”. Fundamentos O despacho de João Pedro Aguiar- Branco também invoca a Lei de Defesa Nacional ( LDN) para fundamentar a participação da PM na operação policial da Frontex.
Só que a PM é uma força de segurança, pelo que a sua ação “não se enquadra na matéria de defesa nacional”, disse um jurista ouvido pelo DN. Acresce que a LDN também não faz qualquer referência à AMN ou à DGAM, que são estruturas civis integradas no Ministério da Defesa mas pertencem ao Sistema de Segurança Interna.