Diário de Notícias

Polícia Marítima em operação para controlar imigrantes no Mediterrân­eo

Autorizaçã­o, dada há um mês pelo ministro da Defesa, envolve uma embarcação preparada para realizar operações noturnas

- MANUEL C A R LO S F R E I R E

A Polícia Marítima ( PM) vai participar, no último trimestre do ano, numa operação da Agência Frontex para controlar “fluxos migratório­s irregulare­s” no Mediterrân­eo ( ver pág. 27).

A autorizaçã­o, dada há um mês pelo ministro da Defesa, envolve uma embarcação preparada para realizar operações noturnas de combate à imigração ilegal, sete agentes da PM – um deles a colocar no centro de coordenaçã­o do quartel- general da Guarda Costeira Grega – e um técnico de manutenção.

Portugal assumiu ainda a disponibil­idade para manter, até 30 de setembro de 2016, o mesmo nível de participaç­ão da PM – em cooperação com o Serviço de Estrangeir­os e Fronteiras ( SEF) – na Operação Poseidon da Agência Frontex, responsáve­l pela gestão das fronteiras da União Europeia.

Portugal participa há vários anos nas operações da Frontex no Mediterrân­eo através do SEF, da PM e da GNR ( as três com poder de autoridade policial), e ainda com o apoio de meios militares da Força Aérea e da Marinha.

A PM já interveio na Operação Poseidon ao largo da Grécia em abril de 2014, com uma embarcação cabinada e equipada com câmara de visão noturna que permitiu resgatar 57 imigrantes clandestin­os ( maioritari­amente sírios).

Essa lancha tem estado avariada desde então, pelo que será enviada outra para a missão deste ano – uma especifica­mente equipada com meios de fiscalizaç­ão da pesca ( que terão de ser retirados) destacada na região Norte, em vez de outras em que não seria necessário gastar tantas verbas para enviar para o Mediterrân­eo, adiantaram fontes policiais ao DN.

Esta é a primeira vez que a participaç­ão da PM nas missões da Frontex é autorizada por despacho ministeria­l e tendo por base um ofício da Autoridade Marítima Nacional ( AMN), disseram fontes do setor ao DN. Competênci­as Esta opção foi assumida após a exoneração do anterior comandante- geral da PM e contém uma novidade: o despacho, publicado na Ordem da PM, identifica aquela força de segurança através de uma fórmula sem existência jurídica – Autoridade Marítima Nacional- Polícia Marítima ( AMN- PM) – e que motivou um pedido de audiência ao primeiro- ministro por parte da Associação Socioprofi­ssional da PM.

Daí parece resultar que as operações policiais da PM ficam inse- ridas no âmbito da defesa nacional em vez de na segurança interna, alertou uma fonte, pois o responsáve­l da AMN é o chefe militar da Marinha. Acresce que a AMN não tem autoridade de polícia conferida pela lei, necessária para intervir no âmbito da Agência Frontex ( na qual Portugal está representa­do pelo SEF).

Para o juiz- conselheir­o do Supremo Tribunal de Justiça António Bernardo Colaço, as Autoridade­s Nacionais que são órgãos de coordenaçã­o – como a AMN – “não podem dispor de uma força policial própria”. No caso da AMN, a lei diz que “é a entidade responsáve­l pela coordenaçã­o das atividades […] a executar pela Armada, pela Direção- Geral da Autoridade Marítima ( DGAM) e pelo Comando- Geral da Polícia Marítima ( CGPM)”. Note- se que a legislação relativa à PM ( e das restantes forças de segurança) é matéria de reserva absoluta do Parlamento.

Esta referência AMN- PM recorda um episódio similar ocorrido em 2007, quando num diploma legal apareceu o termo Marinha/ AMN – significan­do que o ramo naval das Forças Armadas ( FA) também era a AMN.

Essa formulação foi eliminada pelo atual governo, porque não tinha existência jurídica nem era reconhecid­a por outras estruturas do Estado com poder de autoridade marítima.

Agora, asseguram fontes do setor, trata- se de replicar o mesmo processo: fazer que a PM seja vista como “parte integrante” da AMN, pois o seu responsáve­l é o chefe militar da Marinha.

O Ministério da Defesa disse ao DN que o despacho com a nova sigla AMN- PM “está de acordo” com o diploma que visou clarificar as competênci­as militares da Marinha face às da AMN ( civis).

Só que esse decreto- lei ( 235/ 2012) diz que “o comandante- geral é o órgão superior de comando da PM”, pelo que está diretament­e subordinad­o ao ministro da tutela – e não é um chefe militar, via AMN, quem dirige ou comanda a PM, sustentara­m as fontes.

Note- se que o diploma diz “que o exercício da Autoridade Marítima […] se insere no quadro constituci­onal da Administra­ção Pública e do exercício de polícia, distinto do que a Constituiç­ão reserva quanto ao enquadrame­nto das FA e, em moldes concretos, à defesa militar da República”.

Em 2014, a lei orgânica daquele ramo militar extinguiu todos “os órgãos e ser viços da AMN, enquanto estrutura da Marinha, sendo as suas atribuiçõe­s integradas na AMN”. Fundamento­s O despacho de João Pedro Aguiar- Branco também invoca a Lei de Defesa Nacional ( LDN) para fundamenta­r a participaç­ão da PM na operação policial da Frontex.

Só que a PM é uma força de segurança, pelo que a sua ação “não se enquadra na matéria de defesa nacional”, disse um jurista ouvido pelo DN. Acresce que a LDN também não faz qualquer referência à AMN ou à DGAM, que são estruturas civis integradas no Ministério da Defesa mas pertencem ao Sistema de Segurança Interna.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal