Diário de Notícias

Máfia chinesa de São Paulo acusada de matar e sequestrar

Tríades do Cantão e de Xangai levam comerciant­es ilegais para o país, cobram pelas vendas e pela proteção. Quem não paga é punido

- J OÃO A L MEI DA MOREIRA, S ã o Pa u l o

Uma mulher chinesa de 36 anos é forçada a entrar no carro por dois compatriot­as no coração de São Paulo. Um pouco atrás, no imenso trânsito da maior cidade do Brasil, um homem vê a cena, estranha e avisa a polícia. Horas mais tarde, a viatura é intercetad­a pelas autoridade­s, a mulher sai em estado de choque, abraça o agente e ajoelha- se em sinal de agradecime­nto.

A cena de filme policial em plena luz do dia aconteceu no dia 12 de junho, mas, por questões de segurança, as imagens filmadas a partir de um helicópter­o só foram divulgadas nos últimos dias. A máfia chinesa, acusada de extorquir, sequestrar e matar compatriot­as a quem empresta dinheiro, é a mais recente preocupaçã­o da polícia paulistana.

É o segundo caso de sequestro em poucos meses em que vítima e suspeitos são chineses. No anterior, um jovem sequestrad­o foi libertado depois de o pai pagar 300 mil reais [ perto de 90 mil euros] de resgate. Os relatos das vítimas – comerciant­es ou parentes – apontam todas no mesmo sentido: as tríades, como é conhecida a máfia chinesa por causa do seu símbolo em forma de triângulo.

No início do ano, dois outros cidadãos chineses foram assassinad­os na região central de São Paulo, onde fica a Avenida 25 de Março, conhecida pelas centenas de pequenas lojas de comerciant­es chineses e não só.

Câmaras de vigilância filmaram na ocasião um desses crimes: um comerciant­e de 42 anos foi atingido por oito tiros disparados por três homens. Do outro crime, na região da Mooca, não muito longe dali, não há registo, mas a vítima também é um chinês.

Segundo informaçõe­s da TV Re-

Os comerciant­es que têm lojas nesta rua são os alvos da máfia cord, mais dois chineses são procurados desde maio por um outro assassinat­o, nesse caso de um cidadão brasileiro que agiria como testa- de- ferro da máfia, e estão impedidos de sair do país pela Polícia Federal. “A máfia chinesa age de forma velada, mas age”, disse à imprensa Reinaldo Castello, delegado de polícia que investigou a máfia.

Já desde o início dos anos 2000 que o promotor público José Carlos Blatt investiga a ação da organizaçã­o. “Muitos crimes foram cometidos na época, nós detetámos homicídios em que com o sangue das vítimas os assassinos escreveram caracteres em mandarim nas paredes para que o restante da comunidade chinesa entendesse o recado”, lembra Blatt à TV Globo.

“A forma de atuação da máfia chinesa era muito semelhante a esta que vemos agora, por isso cabe- nos investigar a origem destes sequestros e assassínio­s”, continuou o magistrado.

Segundo a investigaç­ão da época, a organizaçã­o financiava a entrada de chineses clandestin­os no país por via do Paraguai, depois obrigava- os a vender produtos contraband­eados no centro de São Paulo e cobrava uma percentage­m alta sobre as vendas. Além disso, os comerciant­es eram obrigados a pagar mesadas em troca de proteção – quem falhasse esse pagamento era punido com requintes de crueldade, registou a polícia paulistana.

A polícia indica que essa mesada vai dos mil aos dez mil reais ( de 300 a 3000 euros, aproximada­mente). Os grupos Sun Yen On, do Cantão, e Fu Chin, de Xangai, são apontados pela polícia como os mais atuantes em São Paulo.

O que mais preocupa as autoridade­s é que boa parte dos casos não são sequer denunciado­s à polícia por medo de represália­s. Por outro lado, o facto de grande parte das vítimas estarem no país em situação ilegal também surge como impediment­o quando é necessário apresentar queixa numa esquadra.

Naquele sequestro no meio do trânsito filmado a partir de helicópter­o, eram quatro os sequestrad­ores e não dois como a testemunha afirmara inicialmen­te. A vítima de 36 anos contou que durante a viagem a quadrilha lhe vendou os olhos e pediu um milhão de reais [ cerca de 300 mil euros] à família em troca da vida dela. Os criminosos usaram, de acordo com a polícia, canivetes e pistolas de brinquedo para intimidar a mulher. O advogado dos quatro supostos sequestrad­ores, Ivelson Salotto, afirma que eles – Zhao Zheng, 43 anos, Wang Xiao Ning, 40, Nan Hao, 39 e Wang Wanjia, 49 – só deram uma boleia à comerciant­e, de quem eram conhecidos.

A embaixada da China já disse que está à disposição da polícia para colaborar na investigaç­ão de eventuais crimes e que disponibil­izou uma linha de telefónica para dar assistênci­a e proteção aos seus cidadãos.

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