Diário de Notícias

Este catalão deixou de ser independen­tista depois de percorrer Espanha de norte a sul

Joan Planas, cineasta de 33 anos, era um separatist­a “racional” e “não emocional”. Depois de falar com espanhóis em bares de todo o país, mudou de ideias. A sua jornada deu origem a um documentár­io e a um livro

- B E L É N RODRIGO, Madr i d

Joan Planas era até há uns meses um jovem catalão de 33 anos que defendia, como muitos outros, a independên­cia da Catalunha. Sem ser militante de nenhum partido, discutia publicamen­te as suas ideias e sentia que existia uma rejeição por tudo o que é catalão. Era um separatist­a “racional” e “não emocional”. Decidiu então fazer uma viagem de mais de dois meses por Espanha, percorrend­o o país de norte a sul e falando com os espanhóis das várias comunidade­s, em cem bares – onde as pessoas falam mais abertament­e – e conhecer a opinião que os outros tinham dos catalães.

O objetivo era, como cineasta, fazer um filme com esta temática e a sua experiênci­a serviria para o guião do mesmo. Mas quando estava a meio da sua viagem, depois de percorrer todo o Norte de Espanha, apercebeu- se de que a sua perspetiva tinha mudado. “Voltei uns dias a Barcelona, para o referendo de 9 de novembro e votei não à independên­cia”, explica Joan Planas ao DN.

“A minha mudança foi um processo interno, houve muita reflexão. Quando entreviste­i as pessoas, muitas delas faziam- me perguntas, queriam saber coisas sobre a Catalunha. E, pouco a pouco, fui mudando a minha perspetiva”, garante o jovem. Depois de várias entrevista­s em meios de comunicaçã­o espanhóis, Joan Planas está incomodado com o título que quase todos escolheram – “Um independen­tista que deixa de sê- lo” –, porque, diz, “não sou o único, muitas pessoas também mudam de opinião, isto não é novidade, acho que o interessan­te é o meu projeto, que se ouça as opiniões de todos os espanhóis”.

Joan Planas nasceu na pequena aldeia de Sant Fruitós de Bages. Aos 10 anos foi para Manresa e com 20 para Barcelona. Depois disso, tornou- se “um cidadão do mundo”, que já percorreu muitos países a trabalhar. De pais catalães, com a família da mãe andaluza, na sua casa não se falou nunca de temas políticos, ninguém lhe impôs ideias. “A minha convicção pelo independen­tismo era mais emocional, não tinha um fundamento teórico ou político.”

Quando estava com um projeto profission­al em Madrid, há quatro anos, “senti que a situação da Catalunha provocava um conflito em

A meio da sua viagem por Espanha, Joan Planas voltou à Catalunha para o referendo. E votou no não Espanha e pensei em fazer um filme. Em Madrid não percebiam o que se estava a passar e existiam preconceit­os sem fundamento. Não é lógico que digam que os catalães são mal- educados porque respondem em catalão quando alguém lhes fala em castelhano. Nós estamos acostumado­s a falar sempre as duas línguas indistinta­mente”. Mas nessa altura acabou por ir fazer um documentár­io na Ásia, durante 10 meses, e adiou a ideia. O que se passa na Catalunha? No ano passado retomou o projeto. “Fui falar com as pessoas aos bares, onde se expressam com mais sinceridad­e”, explica Joan Planas. Passou pelas capitais de todas as províncias espanholas e algumas localidade­s mais pequenas, numa viagem que lhe custou 2000 euros. Entrava nos bares, escolhia as pessoas e iniciava uma conversa com elas, a lançar perguntas para o ar enquanto ficava a ouvir. “Pela minha experiênci­a ninguém conhece bem o que se passa nas outras comunidade­s, muitos queixam- se, pensam que o dinheiro do Estado só vai para Madrid e Barcelona”, conta o cineasta, que percebeu que os catalães não são os únicos que se sentem incompreen­didos.

“Muitas das pessoas com quem falei não se sentiam espanholas, mas aceitam bem o país onde vivem, não é um problema”, continua. E sublinha que de forma geral todos perguntava­m o mesmo: “O que se está a passar na Catalunha?” As pessoas “veem os políticos a brigar e não compreende­m a verdadeira situação”.

Entre os entrevista­dos houve casos extremos, como o asturiano segundo o qual “os catalães não são pessoas” ou um jovem que pensava que deviam voltar a conquistar Portugal, mas do conjunto de cem entrevista­s Joan Planas ficou com uma boa sensação. Tanto que vai usá- las num livro, España desde el Bar, que espera publicar em setembro. Eleições de 27 de setembro Dois meses antes das eleições na Catalunha, Joan Planas pensa que a sociedade catalã está tranquila, “quer expressar o que sente”, mas este é um tema “muito mediático”. O cineasta considera que votar vai ser a oportunida­de para que os governos e partidos tomem medidas a partir do resultado. “Pergunto- me se realmente muita gente quer a independên­cia.”

Muita coisa mudou na Catalunha no último ano. A esquerda radical conquistou a Câmara de Barcelona e a CiU parece ter assinado o seu epitáfio. Antes de ser anunciada a Lista Única pela independên­cia de Artur Mas as sondagens davam a vitória ao Ciudadanos de Albert Rivera, seguido da referida lista e do Podemos. E segundo o Centro de Estudos de Opinião da Generalita­t, num hipotético referendo 50% dos catalães diriam não à independên­cia contra 42,9% para o sim.

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