Testemunhos de responsáveis da CGD libertaram Armando Vara
Operação Marquês. Ministério Público está a ouvir elementos do banco público e isso atenuou perigo de perturbação do inquérito. Ex- administrador pagou 300 mil euros de caução
O Ministério Público propôs e o juiz Carlos Alexandre aceitou: Armando Vara, suspeito de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais na Operação Marquês, deixa de estar em prisão domiciliária, mediante a prestação de uma caução de 300 mil euros. Segundo informações recolhidas pelo DN, o procurador do processo argumentou junto do juiz que, estando em curso a recolha de depoimentos de elementos da Caixa Geral de Depósitos relacionados com o financiamento do empreendimento de Vale do Lobo ( Algarve), o perigo de perturbação do inquérito imputado a Vara estava atenuado.
O antigo administrador da CGD foi detido em julho no âmbito da Operação Marquês, a mesma que envolve o ex- primeiro- ministro José Sócrates, por suspeitas de ter recebido, em 2007, uma comissão na sequência de um financiamento que a CGD fez aos promotores do resort de Vale do Lobo. A investiga- ção do Departamento Central de Investigação e Ação Penal terá detetado uma transferência de 1 milhão de euros para uma conta num offshore titulada pela filha de Armando Vara, Bárbara Vara.
Ao mesmo tempo que deteve Armando Vara, o MP realizou dezenas de buscas por todo o país, inclusive na sede da Caixa Geral de Depósitos, na residência e nos escritórios de Armando Vara. Estas estiveram relacionadas com a compra de 25% do empreendimento turístico de Vale do Lobo, no Algarve, pela Caixa Geral de Depósitos, com perdas superiores a 100 milhões de euros. A operação financeira data de 2006, quando Vara era administrador da CGD. Porém, testemunhos já recolhidos pelo DN garantem que toda a operação de financiamento decorreu dentro das normas internas do banco público.
A revisão da medida de coação, por sua vez, surgiu ainda antes do Tribunal da Relação de Lisboa decidir um recurso de Armando Vara, contestando a prisão domiciliária, que lhe foi decretada em julho. Se, por hipótese, o TRL vier a dizer que a primeira medida de coação foi exagerada, tal decisão não terá efeito, uma vez que houve uma reapreciação, ou seja, uma nova decisão do juiz de primeira instância. Tal como José Sócrates ( em prisão domiciliária e suspeito dos crimes de corrupção, branqueamento de capitais e fraude fiscal) e os restantes arguidos da Operação Marquês, Armando Vara também está à espera que o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa – que decretou o fim do segredo de justiça no processo – transite em julgado para conhecer todo o conteúdo dos autos, sobretudo a matéria recolhida pela investigação. Caução é outra medida de coação O penalista Paulo Sá e Cunha explica que a fixação de uma caução carcerária, como foi o caso com Armando Vara, é, em si, uma outra medida de coação “mas menos grave do que a prisão preventiva ou a obrigação de permanência na habitação”. Significa “que o juiz de instrução Carlos Alexandre entendeu que era suficiente nesta fase do processo aplicar a caução em substituição da prisão domiciliária”, adianta Sá e Cunha.
Foi aplicada agora, na revisão da medida de coação, mas também podia ter sido fixada no início do inquérito, se o juiz tivesse entendido que eram diminutos os perigos de fuga ou perturbação do inquérito. “O que aconteceu nesta fase foi uma atenuação das exigências cautelares. Não quer dizer que os perigos já não se verifiquem mas é uma questão do grau com que subsistem”, refere o advogado. Esta caução carcerária “é uma garantia financeira de um valor que só é pago ao Estado se o arguido violar as obrigações que lhe estão impostas”. Ou seja, se Armando Vara tentar fugir ou perturbar o inquérito, por exemplo, o valor dos 300 mil euros de caução que estava depositado numa conta do tribunal é descontado. Quando um arguido é absolvido dos crimes de que vinha acusado em sede de julgamento, o valor que prestou de caução tem de ser devolvido, referiu Paulo Sá e Cunha. O mesmo terá de acontecer se chegar um novo juiz ao caso e revogar a medida de caução que tinha sido aplicada.
Antes de fixar a fiança a um arguido, o juiz de instrução tem de se certificar dos rendimentos deste. “A caução não pode ser desproporcional aos rendimentos que a pessoa tenha”, adianta o penalista. Pode ser paga de várias formas: em dinheiro, por garantia bancária ou através da hipoteca de um imóvel.
A caução económica tem uma natureza diferente da prisão, como explica Sá e Cunha. “Uma caução económica pode servir para garantir pedidos de indemnização cível. Esse valor é que pode ser perdido, com esse objetivo.”