Diário de Notícias

Governo Dilma asfixiado por tribunais e Parlamento

Brasil. Tribunal de Contas rejeita resultados de 2014, um dia após Tribunal Eleitoral reabrir investigaç­ão à campanha. Deputados aliados ausentam- se em votação essencial para executivo

- J OÃO A L MEI DA MOREIRA, S ã o P a u l o

Em dois dias, Dilma Rousseff sofreu seis derrotas. Quatro nos tribunais, uma no Parlamento e a última, consequênc­ia das primeiras cinco, no mercado cambial. Depois da reforma ministeria­l que se supunha garantir- lhe uma acalmia nos próximos meses, a presidente do Brasil, eleita pelo Partido dos Trabalhado­res ( PT), volta a sentir- se asfixiada pelas pressões dos poderes judicial, legislativ­o e financeiro. O impeachmen­t, ou destituiçã­o, da chefe de Estado, volta à ordem do dia.

Na terça- feira à noite, Dilma soube que o Tribunal Superior Eleitoral ( TSE) decidira abrir uma investigaç­ão ao financiame­nto da sua campanha presidenci­al de 2014. Ao longo de quarta- feira, foi informada que os oito juízes do Tribunal de Contas da União ( TCU) votaram pela rejeição das contas públicas de 2014, que o Supremo Tribunal Federal ( STF) indeferiu o pedido do governo no sentido de suspender a de- cisão com base em irregulari­dades processuai­s cometidas pelo relator Augusto Nardes e que o próprio TCU rejeitou afastar Nardes. No Parlamento, a base aliada não obteve quórum para votar os vetos de Dilma e chumbar as “pautas- bomba”, que ameaçam elevar os gastos públicos em tempo de ajustament­o orçamental. Finalmente, no mercado, o preço do dólar voltou a subir.

“Em entrevista recente, Dilma foi otimista demais ao dizer que já vê a luz ao fundo do túnel”, opinou Bernardo Mello Franco, colunista da Folha de S. Paulo. “Com a decisão do TCU, o facto concreto para impeachmen­t passa agora a existir, foram derrotas políticas poderosas para Dilma”, defendeu Marcelo de Moraes, de O Estado de S. Paulo.

A reprovação das contas públicas – situação que não ocorria no Brasil desde 1937 – mereceu do presidente do PSDB o epíteto de “decisão histórica”. Aécio Neves disse ainda que “ficou comprovado que a presidente cometeu crime de responsabi­lidade e caberá agora ao Congresso tomar a decisão correspond­ente”, dando a entender que se refere ao impeachmen­t.

“Houve pressão política a interferir no resultado”, reagiu Humberto Costa, líder do PT no Senado. A bancada petista reagiu no Twitter acusando o relator Nardes de “golpista”. “Nardes irá para a lata de lixo da história”, lia- se na mensagem. A decisão do TCU precipitou, por ordem de Dilma, a primeira reunião do executivo desde a reforma ministeria­l da semana passada.

Na ocasião, a presidente reduziu de 39 para 31 o número de ministério­s mas, mesmo assim, achou espaço para aumentar a participaç­ão do PMDB, aliado rebelde do governo, oferecendo- lhe pela primeira vez desde a chegada do PT ao poder a pasta da saúde, com o maior orçamento. E ainda nomear Celso Pansera, acusado por um dos delatores da Petrobras de ser “um pau mandado” de Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados em rota de colisão com o governo, para o Ministério da Ciência e Tecnologia. Suspeito de receber subornos em contratos da Petrobras, Cunha viu ontem o banco suíço Julius Baer congelar uma conta sua de 2,1 milhões de euros. O Julius Baer é o mesmo banco em que os ex- diretores da Petrobras Renato Duque e Jorge Zelada, e o ex- gerente Pedro Barusco tinham contas.

O objetivo de Dilma era abrandar a hostilidad­e do PMDB no poder legislativ­o, obtendo apoios na votação das “pautas- bomba”, um conjunto de projetos de lei que visam aumentar em até 70% o salário de funcionári­os públicos e que, se aprovados, deitarão por terra o esforço orçamental do executivo.

Mas a sedução não bastou para o insaciável PMDB: parte dos seus deputados faltaram à votação do veto por influência de Cunha, deixando o governo em alerta vermelho. “O que o governo fez na reforma foi apenas aumentar o nosso número de suites no Titanic”, resumiu Romero Jucá, senador do PMDB, que como Cunha defende o rompimento com o PT, à revista Veja.

A instabilid­ade política refletiu- se nos mercados com nova alta do dólar após dias de queda.

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