Diário de Notícias

O que há para ver nos primeiros dias do Lisbon & Estoril Film Festival

Alvo de uma retrospeti­va no Lisbon & Estoril Film Festival, o veterano Barbet Schroeder chega a Portugal para também apresentar o seu mais recente filme, Amnesia, com estreia comercial para o dia 19. Na sua apresentaç­ão no Festival de Cannes, o DN falou c

- RUI PEDRO TENDINHA, em Cannes

Filmou em Ibiza nos anos 60 o seu primeiro filme, More [faz parte da retrospeti­va que o Lisbon & Estoril Film Festival tem programado]. Agora, com Amnésia, enceta um regresso ao mesmo local. Que diferenças encontrou naquela ilha passados todos esses anos? As mesmas diferenças que encontro em diversos locais do mundo por onde já passei. As grandes mudanças da humanidade ocorreram entre os anos 50 e o começo do novo século. O planeta nunca mudou tanto na sua história. Neste momento, estamos a viver o momento da viragem digital. Claro que quando cheguei a Ibiza aquilo era só estradas com pó e pessoas vestidas com trajes tradiciona­is. Era uma terra intocada há séculos! De que forma Amnésia é um projeto tão pessoal? Tem a ver com uma situação que se passou com a minha mãe quando lá esteve em Ibiza. Há dez anos tive esta ideia de filmar de novo em Ibiza, quis filmar uma história de amor não sexual de uma senhora. Filmar uma história de amor verdadeira e espiritual foi algo que achei que poderia ser interessan­te. Achei também que colocar um jovem alemão como objeto amoroso seria qualquer coisa de interessan­te do ponto de vista dramático. Claro que o facto de a personagem da senhora ser alemã e se recusar a falar alemão torna tudo ainda mais apelativo em termos dramáticos. A partir do momento em que ambos falam alemão é para serem ditas coisas sérias. Vejamos, a primeira coisa que ela diz na sua língua é a história do autocarro com as crianças que vêm do campo de concentraç­ão... Curiosamen­te, o Barbet não fala alemão e é filho de uma alemã... Nunca fui incentivad­o a falar alemão. A minha mãe nunca quis falar alemão lá em casa. Sabe, tenho de aprender. Aliás, a minha mãe casou-se com um suíço por não falar alemão... Qualquer dia deixo o cinema para ir aprender alemão. Depois, claro, poderei regressar. Este é um filme que monta uma reflexão sobre a maneira como os alemães lidam com o passado. Isso é uma questão bem alemã. O Barbet, por também ter sangue alemão, enfrenta também esse tipo de pensamento­s? Não, acabei por ficar com o olhar da minha mãe. Na verdade, lembro-me de quando tinha 14 anos ir com ela para a Áustria fazer esqui e ter ficado impression­ado com os hotéis das montanhas ainda terem o sinal nazi. Estávamos nos anos 50! Para a minha mãe isso era revoltante! Que tipo de debate o filme pode criar na Alemanha? Gostava eu de saber... não faço ideia. Nem sei se poderá ser um filme doloroso para os alemães. Imagine que agora faço um filme sobre Portugal e a personagem principal é... portuguesa mas recusa-se a falar português e a beber vinho do Porto. Enfim, espero que o filme seja controvers­o. Por outro lado, há a personagem do Bruno Ganz, cujo ponto de vista é daqueles que dizem que quiseram fazer algo contra o nazismo mas que depois não conseguira­m... E isso aconteceu também! É tão doloroso como verdadeiro! De alguma forma, o epílogo do filme tem algo de cinema de suspense... Sim, é intenciona­l. Por isso, digo que é um filme americano! Tem as fundações de uma construção dramática americana. Aprendi também com o Éric Rohmer que é sempre importante tentarmos encontrar nos filmes momentos para colocar um pouco de suspense. Qual a memória que tem da rodagem de More? Lembro-me de que precisava de filmar à luz da vela e, na altura, ainda não havia câmaras que conseguiss­em captar essa luz. Desenrascá­mo-nos muito, ao ponto de no exterior da casa utilizarmo­s espelhos para refletir na parede. Era um outro sistema. Agora, chego a Amnésia com uma câmara digital que tem três vezes mais definição do que a câmara de 35mm...

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Amnesia – regresso de Schroeder a Ibiza para filmar uma história de amor “verdadeira e espiritual”

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