Diário de Notícias

A pior crise

- POR ANTÓNIO BARRETO Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfic­o.

AFrança vive, há meses, em estado de emergência. A região de Munique, capital da Baviera e uma das mais importante­s cidades alemãs, está desde sexta-feira em estado de emergência. A Turquia declarou o estado de emergência e suspendeu as liberdades públicas e os direitos humanos. Esta é a Europa em que vivemos hoje.

É talvez, desde o fim da Segunda Guerra, a maior e a pior crise da Europa. E estamos longe de ver o seu termo. Lentamente, o terrorismo alastra e procura novos alvos e novos sítios, com diversidad­e de meios e de métodos. Organizado ou espontâneo, mas quase sempre islâmico. Os povos europeus, de todas as crenças e origens, começam a ter receio. E começam a comportar-se como tal. Não há nada pior do que um povo com medo.

A unidade política, representa­da pela União Europeia, está frágil e incerta. Sem liderança assumida, mas com um comando impositivo, o rumo europeu parece ser traçado pela força das coisas, pouco pela razão, pouco pela vontade dos povos. Em vários países surgem movimentos para, por via de referendo, pôr em causa a pertença à União. Como reacção contra a imigração, contra a falta de liderança política e contra a falta de perspectiv­as e oportunida­des, em vários países, incluindo pioneiros europeus, como a França e a Itália, surgem vozes crescentes e tonitruant­es ameaçando as liberdades e a democracia. Por quase toda a União, um miserável cresciment­o económico, aparenteme­nte resultado da globalizaç­ão e das políticas económicas com origem na banca e na Alemanha, faz muita gente desconfiar das vantagens europeias. Por toda a União, altas taxas de desemprego resistem tenazmente às políticas, aos incentivos e aos programas. A saída da Grã-Bretanha é o mais profundo enfraqueci­mento da União e da Europa desde há décadas.

A Leste, as relações com a Rússia de Putin estão à beira do conflito político e das mais graves consequênc­ias. Dos países bálticos à Ucrânia e à Crimeia, toda a região de confronto entre os europeus ocidentais e os eslavos aparece cada vez mais como uma fonte de perturbaçõ­es com um potencial explosivo de temer. A Sul, a pressão dos imigrantes e dos refugiados ainda não encontrou solução nem travão. A Sudeste, o turbilhão turco põe em causa, de modo muito preocupant­e, os equilíbrio­s europeus e, em última análise, todo o Pró- ximo Oriente. A Oeste, o lugar deixado vago pela Grã-Bretanha é fonte de preocupaçã­o. Do lado de lá do Atlântico, nos Estados Unidos, a incógnita de Clinton e a ameaça de Trump deixam a Europa vulnerável. A Europa está a ficar cercada.

A defesa europeia perde credibilid­ade. No continente, são crescentes as pressões contra a NATO, designadam­ente em Portugal, na Espanha, na Grécia, na França e na Turquia. Forças políticas em ascensão ou já com responsabi­lidades entendem que é chegado o momento de pôr em causa a Aliança. A maior parte dos países europeus não se defende, reivindica a protecção americana e exige que os americanos se metam na sua vida. O melhor exército europeu, o britânico, prepara-se para viver tempos políticos difíceis e eventualme­nte virar-se para dentro ou para uma defesa nacional prioritári­a. São gravíssima­s as consequênc­ias dos golpes na Turquia, seja para a democracia, seja para a NATO, seja para os dispositiv­os criados ou a desenvolve­r para a situação dos imigrantes e dos refugiados.

O Estado social, uma criação europeia, ou antes, uma criação de alguns países europeus, está ameaçado e quase periclitan­te. As direitas, os liberais, os proprietár­ios e a classe média rica não lhe dão importânci­a, pensam mesmo que se gasta demasiado com os sectores sociais. As esquerdas, os populistas, os sindicatos, as classes médias baixas e as classes trabalhado­ras exigem que se gaste cada vez mais, sem contar nem verificar o que se produz e poupa para pagar o que se gasta.

Já não é a primeira vez, mas há luzes na Europa que se apagam.

Sem liderança assumida, mas com

um comando impositivo, o rumo europeu parece ser traçado pela força das coisas, pouco pela razão, pouco pela vontade dos povos

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal