Acionistas mansos
Há empresas totalmente controladas pelos gestores, há outras onde os gestores vivem numa espécie de incesto com os principais acionistas. Ambas têm uma característica comum: revelam fraca fiscalização e pouca transparência, os salários e os prémios das administrações são escandalosamente elevados e as políticas de dividendos, investimento ou recompra de ações obedecem mais aos interesses específicos do CEO ou de um acionista só do que ao prosseguimento dos objetivos estratégicos da empresa. O que aconteceu na Portugal Telecom é um caso expressivo desta péssima governação, mas a verdade é que a PT está longe de ser um exemplo isolado entre as cotadas portuguesas. Os resultados são lamentáveis: a má governança de uma empresa acaba sempre por traduzir-se em maus resultados ou, no pior dos cenários, na implosão de companhias que até seriam viáveis e lucrativas. A CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), o polícia da bolsa nacional, anda há anos a pregar no deserto, mas a falta de transparência e a ausência de democracia corporativa permanecem intactas, relegando o mercado de capitais português para a cauda deste campeonato, com prejuízo para a economia nacional, já que torna mais difícil esta forma de financiamento. O que aconteceu no Banif é, também aqui, paradigmático: Horácio Roque, o fundador do banco, pôs e dispôs da empresa e os pequenos acionistas assentiram sempre de cabeça baixa e confiança ilimitada. Satisfaziam-se com umas migalhas de dividendos pagos no final de cada ano. Nunca puseram verdadeiramente em causa o acionista maioritário e a gestão que ele comandava como bem lhe apetecia. Daí os abusos repetidos na concessão de crédito que acabaram por abrir o caminho à catástrofe. Faltam em Portugal acionistas ativistas, tenham eles maior ou menor dimensão. Faltam investidores informados que pressionem e exijam respostas, que reclamem justificações nas assembleias gerais e que percebam que a empresa também é deles, por pequeno que seja o investimento. O que sobra em grupos de lesados, quando já não há nada a fazer, falta em grupos de interessados, quando ainda está tudo por acontecer.
P.S. Ontem escreveu-se aqui que o relatório parlamentar sobre o Banif se tinha transformado numa arma de arremesso partidário. O problema não é do relatório em si, bem construído, mas do pós-operatório, isto é, da querela política que se seguiu e que atirou a culpa dos gestores para segundo plano.