Diário de Notícias

Auf Wiedersehe­n, Lisboa!

- ULRICH BRANDENBUR­G

Foi há precisamen­te 40 anos – no verão de 1976 – que estive em Portugal como estudante, na Faculdade de Letras da Universida­de de Lisboa, para aprender a língua portuguesa. Foi a minha segunda visita a Portugal. Fiquei impression­ado: era um dos países mais pobres da Europa que estava a lidar com a receção de centenas de milhares de pessoas que voltavam das antigas colónias. Fiquei igualmente impression­ado com o espírito pioneiro existente em Portugal e com a vontade de procurar um novo futuro no seio da Europa. Desde então visitei Portugal muitas vezes e espero que futurament­e tenha muitas oportunida­des para voltar. Ambos os países – Portugal e a Alemanha – mudaram e desenvolve­ram-se muito durante estas quatro décadas: o evento histórico para a Alemanha foi a reunificaç­ão e a superação da divisão da Europa. Para nós, isso resultou numa imigração em massa (a Alemanha é hoje o segundo país no mundo que mais imigrantes recebe), numa modernizaç­ão do país, mas também num doloroso esforço financeiro.

Portugal não foi apenas bem-sucedido na integração dos retornados; seguiu de forma consequent­e o seu rumo na União Europeia e tornou-se um país moderno, com as melhores autoestrad­as da Europa, um destino turístico de eleição (apenas da Alemanha chega-

ram mais de um milhão de turistas no ano passado) e um polo de atração para investidor­es estrangeir­os.

Apesar da satisfação por tudo o que foi alcançado, verifica-se também um peculiar sentimento de nostalgia em ambos os países: na Alemanha, trata-se da nostalgia pelos tempos antes da queda do Muro, em que era mais fácil perceber o mundo com clareza, os cofres do Estado estavam cheios e o marco alemão era a nossa moeda. Até no Leste do meu país existem pessoas que desejam o regresso das fronteiras. Têm receio do novo – e também dos muitos estrangeir­os que vieram para a Alemanha nos últimos anos. Outros preocupam-se com as consequênc­ias do comércio livre e manifestam-se contra o TTIP. A cortesia diplomátic­a não me permite traçar paralelos com o meu país de acolhiment­o, mas também aqui existem pessoas que se sentem ameaçadas pela globalizaç­ão e veem a crescente integração europeia – em particular a da zona euro – como uma ingerência inadmissív­el.

Todavia, os tempos passados não eram melhores e a nostalgia não ajuda ninguém, nem os alemães nem os portuguese­s. Por isso, fico satisfeito que a taxa de aprovação da integração europeia continue num patamar elevado em ambos os países (de acordo com sondagens recentes na Alemanha a taxa de aprovação está em 82%). Fechar-se sobre si próprio não favorece nenhum país, nem a Alemanha nem Portugal – que legitimame­nte se orgulha do seu espírito de abertura ao mundo e que, depois de 1974, trilhou, de forma decidida, o seu caminho europeu. Nós também não teríamos nada a ganhar com isso: são poucos os países que estão tão integrados na economia mundial como a Alemanha, nomeadamen­te através de 300 empresas alemãs a operar em Portugal, representa­ndo cerca de 60 mil postos de trabalho. Visitei pessoalmen­te muitas destas empresas nos últimos dois anos e meio.

A maioria dos meus compatriot­as defende a continuaçã­o da construção de uma Europa solidária, que estabelece regras comuns para todos e se empenha em prol da segurança dos seus cidadãos: uma Europa capaz de competir na economia mundial. E essa esperança no futuro, também a constatei aqui com frequência – independen­temente do orgulho legítimo em relação ao passado e ao que foi alcançado nos últimos 40 anos.

O meu tempo de serviço em Portugal termina nos próximos dias. Para mim, foi um privilégio poder ter estado cá. Um embaixador deve sempre também sentir-se como um representa­nte do país de acolhiment­o perante o governo e a opinião pública do país de origem. Tenho a certeza de que o meu sucessor entende a sua função da mesma forma. E eu, doravante, juntar-me-ei ao grande número de amigos de Portugal na Alemanha.

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