Obrigar os filhos a manter rotinas nas férias? Só até aos 3 anos
Férias com crianças pedem horários flexíveis e programas simples. Alguns dias antes do regresso às aulas, é importante voltar à normalidade, recuperando os horários
JOANA CAPUCHO Se um bebé de 1 ano vir as suas rotinas alteradas durante as férias em família, muito provavelmente ficará irritado e fará mais birras. Ninguém quer isso. Mas uma criança de 7 anos pode perfeitamente acordar às 10.00, almoçar perto das 14.00 e ir para a cama depois das 23.00. As férias pedem alguma flexibilidade nos horários, programas simples e diferentes e, claro, muita paciência. Se a criança se aborrecer, não há problema, dizem os psicólogos. Talvez seja o ponto de partida para ser criativa e pensar no que quer fazer.
“As férias são um tempo de flexibilidade de horários. Contudo, até à idade do pré-escolar, é importante manter um fio condutor nas rotinas da alimentação e do sono, fatores com um impacto grande no humor”, diz a psicóloga infantil Inês Afonso Marques. As mudanças podem fazer que os mais novos fiquem “mais irritados e stressados e façam mais birras”. Já nos mais velhos, “são uma oportunidade para lidarem com os imprevistos e se adaptarem a situações novas”.
Depois de terem passado o último mês em campos de férias, nas casas dos avós ou no ATL, muitas crianças estão agora com os pais. Para o pediatra Mário Cordeiro, estes “podem e devem ser mais flexíveis, tendo em conta a idade”. Um bebé pequeno “terá pouca maleabilidade de horários, mas a partir dos 2-3 anos, a flexibilidade aumenta e é bom que toda a família – não apenas as crianças – mude as suas rotinas, porque isso é que é precisamente ter férias: não repetir o quotidiano”.
Há ingredientes essenciais para que as férias não se tornem um pesadelo. “Uma enorme dose de flexibilidade, tolerância e paciência”, diz Magda Dias, especialista em parentalidade positiva. Quando o casal tem apenas um filho, será “muito mais fácil manter as rotinas”, uma vez que até poderá fazer sentido, “porque dá descanso aos pais e, sobretudo, ao filho, que, menos cansado, será capaz de aproveitar melhor”. Mas as coisas “mudam de figura” quando há mais do que um filho. A formadora nas áreas comportamentais e comunicacionais diz que a maioria dos pais “se torna mais flexível”, quando “o mais velho já não faz a sesta e come outro tipo de coisas. “No entanto, e sempre que possível, é importante manter-se a hora de dormir (sesta e noite) em alguns dos dias. Porquê? Para se recuperar. Caso contrário, pode ser uma mistura explosiva: criança cansada e férias. E quando eles descansam, nós também. Ou jogamos com o que não dorme”, propõe. Simplificar é palavra de ordem Para que as férias não sejam stressantes, nem para pais nem para filhos, o melhor é simplificar. “Nas roupas que se leva, no que se come, nos compromissos que assumimos. E não nos chatearmos uns com os outros, sobretudo o casal”, indica Magda Gomes Dias. Para a autora do blogue Mum’s the boss, outra dica importante é “assegurar o mínimo”: “Saco com protetor solar, roupa de muda, toalhetes (sempre), pacote de bolachas, peça de fruta e água. Uma bola para brincar, cartas, folhas e canetas para desenhar.” De resto, “toca a brincar com eles. O stress passa e a felicidade que os miúdos sentem quando têm os pais só para eles não tem preço”.
Na opinião do pediatra Mário Cordeiro, “depois de os pais definirem o que é ‘obrigatório’, ou seja, aquilo que não podem mudar porque poriam em causa o bem-estar das crianças”, devem pensar em atividades diferentes daquelas que fazem habitualmente. “É bom fazer programas na natureza, passear, estar... não é preciso sempre uma atividade frenética”, ressalva. Se os pais “simplificarem a vida e o que querem fazer”, diz o pediatra, “podem descansar e respirar”. Além disso, frisa, “também é bom que arranjem alguns programas só eles, sem as crianças, se for exequível.”
Brincar com água, trepar uma árvore no parque ou dar um mergulho no rio. “São coisas que não se fazem ao longo do ano e que as crianças valorizam”, diz Inês Afonso Marques, responsável pela área infantojuvenil da Oficina de Psicologia. Ou dar uma caminhada, por exemplo. “Ao início podem achar que a ideia é uma seca, mas o que vem dali será valorizado.” Os pais devem dar sugestões, mas, sobretudo, escutar a criança. “Deixar que ela pense como quer ocupar o dia. Claro que se podem aborrecer. Mas isso não é um problema, porque vai permitir que escolham o que querem fazer. É bom que haja pouca estrutura em termos de atividades”, explica a psicóloga.
Se durante as férias existir uma mudança radical nas rotinas da criança, os horários devem ser ajustados alguns dias antes do início do novo ano letivo. “Creio ser boa política começar a regressar à normalidade uns dias antes do início das aulas, para haver uma habituação, não apenas psicológica mas também fisiológica”, propõe Mário Cordeiro. No entanto, adverte, “é bom que isso não se faça através de trabalhos para casa...”.