CTT impediram acesso a mercado que vale 400 milhões
Concorrência diz que empresa abusou de posição dominante no mercado de correio tradicional. CTT preparam defesa
“Os CTT utilizaram o controlo sobre a única rede de distribuição de correio tradicional com cobertura nacional em Portugal para impedir a entrada ou a expansão de concorrentes no mercado nacional de prestação de serviços de correio tradicional, um mercado avaliado em pelo menos 400 milhões de euros por ano.” A acusação é da Autoridade da Concorrência (AdC), depois de uma investigação ter concluído que a empresa presidida por Francisco Lacerda abusou da sua posição dominante.
Os Correios, contactados pelo DN/Dinheiro Vivo, garantem que vão “prestar todos os esclarecimentos necessários” ao processo. “Os CTT receberam a nota de ilicitude e vão analisá-la com a devida atenção”, garante fonte oficial da empresa presidida por Francisco Lacerda, referindo que “faz parte da vida das empresas serem objeto de ações de clarificação pelas entidades de supervisão”.
Não está definida qualquer multa ou penalização para a empresa, pois está ainda na fase da acusação. Os CTT terão de preparar a sua defesa e só depois, se a Concorrência mantiver as suas conclusões, é que se avançará para uma multa.
“Os operadores postais concorrentes necessitam de aceder a uma rede de distribuição postal com cobertura nacional para poderem prestar serviços de correio tradicional a clientes empresariais”, lembra a Autoridade da Concorrência. “Como o desenvolvimento de uma rede de distribuição postal com cobertura nacional não é economicamente viável para os operadores postais concorrentes, o acesso à rede de distribuição postal com cobertura nacional dos CTT revela-se indispensável.”
Impedir o acesso à rede de distribuição tem uma “elevada probabilidade de produzir um prejuízo significativo, por criar obstáculos ao desenvolvimento de uma concorrência efetiva”, frisa o regulador.
A preocupação prender-se-á, sobretudo, com o mercado empresarial, sendo um entrave à concorrência “designadamente por parte de empresas nacionais que procuram enviar correio de clientes empresariais, contribuindo para reduzir as possibilidades de escolha, aumentar os preços, reduzir a qualidade e prejudicar a inovação”. A Associação dos Operadores Alternativos de Correio (APOE) não quis comentar a decisão.
António Ferreira Gomes, presidente da Autoridade da Concorrência, já tinha avisado, numa audição no Parlamento, em junho, que estava a analisar se havia abuso de posição dominante no mercado postal e se os CTT estavam a restringir o acesso dos operadores alternativos à rede, já que a abertura do acesso decorre da lei postal, no âmbito da liberalização do setor. Na altura, o responsável não quis avançar detalhes, mas prometeu uma decisão para breve. A Autoridade da Concorrência considera, na nota de ilicitude com data de 12 de agosto, que a conduta dos CTT “é grave, tendo ocorrido na sequência da liberalização do setor postal, introduzida pela Lei Postal de abril de 2012, que visou abrir o setor postal à concorrência”.
Os CTT foram privatizados, através da dispersão em bolsa, no final de 2013 e em 2014. Hoje, o maior acionista é a Gestmin (7,69% do capital), do empresário Manuel Champalimaud. A empresa é a prestadora do serviço universal postal, obrigação que lhe foi atribuída em 2011 antes da liberalização do setor, com um contrato válido até 31 de dezembro de 2020, menos dez anos do que o calendário inicial. Está obrigada a garantir a utilização da sua rede postal por empresas que assim o solicitem, mediante um acordo entre as duas partes, negociando o acesso à infraestrutura.