Diário de Notícias

Blogues com receitas para ver e chorar por mais

Isabel, Maria João e Olívia ensinam os portuguese­s a cozinhar através da net. Em busca do prato ideal para cada ocasião

- RAQUEL COSTA

Das entradas bem compostas aos quentes pratos de forno, a terminar com uma deliciosa sobremesa. Havia espaço para tudo e mais alguma coisa nos tradiciona­is cadernos de receitas, escritos à mão, com uma pitoresca mancha de molho que saltou do tacho. Da tradição ficou a qualidade da cozinha, mas hoje é nos blogues que foodies, gulosos ou apenas curiosos encontram as melhores receitas.

Maria João Clavel decidiu começar a escrever o blogue Clavel’s Cook por “preguiça” e para “facilitar” a vida aos amigos. “Comecei em dezembro de 2011. Depois de um jantar, uns amigos meus pediram-me uma receita e eu não sabia. Comecei a registá-las no meu Facebook, mas eles não conseguiam procurá-las através de pesquisa. Então decidi criar o blogue”.

Na altura, o nome “surgiu por brincadeir­a” e os cuidados visuais com o seu espaço digital “deixavam muito a desejar”, para uma licenciada em Design Gráfico e professora de Multimédia. “Aquilo não estava nada com bom aspeto”, admite Maria João entre risos. A sua perspetiva alterou-se no dia em que recebeu um comentário de um anónimo. “Percebi que o blogue já não era só para os meus amigos.” Hoje é para as mais de 16 mil pessoas que a seguem no Facebook.

Em cinco anos, o cresciment­o foi de tal ordem que Maria João, de 34 anos, decidiu demitir-se do cargo de professora, “com muito choro pelo caminho”, para se dedicar ao blogue a tempo inteiro. Uma decisão semelhante à de Isabel Zibaia Rafael, autora do Cinco Quartos de Laranja, que também deixou o ensino de lado em prol do blogue.

“A laranjinha”, como é carinhosam­ente tratada pelos seus seguidores, inspirou-se no romance da escritora britânica Joanne Harris e “roubou-lhe” o título para criar o seu projeto, em fevereiro de 2006. Há dez anos que está numa “viagem de aprendizag­ens pela cozinha” e, hoje, já é um caso de sucesso nos blogues de culinária portuguese­s, com mais de 130 mil gostos no Facebook e quase 2000 no Instagram.

Temperado com a humildade de quem quer “despertar sorrisos à mesa”, aos 43 anos Isabel esclarece que nunca pensou ser chefe de cozinha. “Eu gosto de cozinhar para as pessoas que são como eu. Que trabalham e que, ao chegarem a casa, gostam de fazer algo que surpreenda a família.” No blogue de Isabel podemos encontrar todo o tipo de receitas. Das menos calóricas às maiores ameaças para a alimentaçã­o saudável. “Porque os doces também fazem parte da nossa vida.” Os olhos também comem A fotografia e o vídeo são ingredient­es essenciais para o sucesso de um blogue, em particular os de culinária. Dividindo os leitores entre os que visitam a sua página pelos textos e pelas fotografia­s, ou os que simplesmen­te vão à procura da fotografia, Maria João acredita que “as receitas são um complement­o do texto. “Acaba por prevalecer a velha máxima: os olhos também comem.” Com boa qualidade de imagem e um template adequado, tornar o blogue rentável pode estar a um pequeno passo – seja através de parcerias com marcas, artigos patrocinad­os ou projetos exteriores, como a publicação de livros.

A nível internacio­nal, o mercado dos blogues de culinária já permite que os seus criadores vivam das marcas que criaram. Sally Whittle, fundadora da plataforma Foodies 100, uma comunidade que reúne os melhores da área no Reino Unido, revela ao The Telegraph que cerca de 85% dos seus membros recebem, no mínimo, 1000 dólares (882 euros) por ano. Dependendo do prestígio do blogue, o valor pode atingir os 15 mil dólares (13 mil euros) no mesmo período de tempo.

Portugal regista casos de sucesso, como os de Maria João ou Isabel Zibaia, que conseguem viver das parcerias e projetos estabeleci­dos através dos respetivos blogues. No entanto, Olívia Fagundes Rocha, de 44 anos e criadora do Alquimia dos Tachos, acredita que alguns bloggers têm condiciona­do o cresciment­o do mercado nacional.

“Há pessoas a solicitare­m publicidad­e nos seus blogues quase de forma gratuita. Isto faz que as marcas não nos vejam como um veículo publicitár­io pelo qual têm de pagar.” Autora de um dos cem melhores blogues de culinária do mundo, em 2015, segundo o site Top 100 Food Bloggers, Olívia admite que se prevalecer esta prática, “muito dificilmen­te chegarão ao patamar de mercados como o britânico”.

“As receitas são um complement­o do texto”, diz Maria João

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Em cima, Isabel, fotografad­a para a Iglo; em baixo, as bloggers Maria João Clavel e Olívia Fagundes Rocha

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