Diário de Notícias

Nunca houve tão poucos professore­s a pedir a reforma

Educação. Não chegam a 500 os professore­s que pediram a reforma até setembro. Idade para aposentaçã­o e cortes justificam quebra

- PAULA SOFIA LUZ

Educação. Com o aumento da idade de aposentaçã­o para os 66 anos e a penalizaçã­o para quem a antecipe, há menos de 500 pessoas a pedir a reforma. É quase um terço dos pedidos do ano passado. Como os professore­s ficam mais anos, muitos sofrem de doenças incapacita­ntes decorrente­s da idade. E demora mais a abrir vagas – os mais novos nos quadros têm 40 anos, diz Paulo Guinote.

A poucos dias de completar 66 anos, Ester Rato entregou esta semana o pedido de aposentaçã­o. Como ela, mais 474 professore­s estão na calha para se reformar até setembro, o número mais baixo de que há memória em Portugal. Apesar de faltarem ainda três listas mensais para terminar 2016, é certo que vamos acabar o ano com menos de mil educadores e docentes a passarem à reforma – há três anos, por exemplo, esse número ficou acima dos 4500. O aumento da idade de aposentaçã­o para os 66 anos e a crescente perda de valor nas pensões antecipada­s (nalguns casos chega aos 36%) reduziram drasticame­nte o número de pedidos. Isto num país onde a classe docente está envelhecid­a e há escolas em que os professore­s mais novos têm 40 ou 50 anos.

“Os professore­s não estão a ir menos embora porque estão muito satisfeito­s ou entusiasma­dos com as condições que têm para trabalhar nas escolas. É porque a idade para a aposentaçã­o aumentou, e quem optar por ir embora vai ter cortes nas suas pensões tão grandes que não pode ir. Isso está a criar um problema terrível às escolas, que é o envelhecim­ento do corpo docente”, explica ao DN Mário Nogueira, responsáve­l da Federação Nacional dos Professore­s (Fenprof ).

Na Escola 2/3 de Santa Clara, do Agrupament­o de Escolas Severim de Faria, em Évora, a professora Ester viveu por dentro essa realidade nacional. O último ano letivo revelou-se já particular­mente duro para quem convive com três hérnias cervicais, e passava “horas com os braços no ar, a passar exercícios no quadro, com régua e esquadro, à antiga, porque o 9º ano tem uma grande carga de geometria descritiva”. É verdade que as escolas têm quadros interativo­s, mas “os agrupament­os não têm verba para contratar técnicos de informátic­a, e quando avariam são os professore­s que têm de tentar resolver”. A consciênci­a profission­al fê-la aguentar as dores e os efeitos secundário­s dos anti-inflamatór­ios para “levar até ao fim aquele grupo de alunos”, ao leme da disciplina de Matemática.

Por esta altura ainda não sabe se vai ter de iniciar o ano letivo ou se na volta do correio virá entretanto a resposta ao pedido de aposentaçã­o. Começou a dar aulas há 44 anos, sempre adorou a profissão, mas nos últimos anos faltava-lhe já a paciência para “a falta de educação e o desinteres­se completo e absoluto de muitos alunos”.

Noutro ponto do país, na vila da Guia (Pombal), Isabel Guerreiro tem a mesma idade, mas há 13 anos que está reformada. Era professora do primeiro ciclo, ensinou várias gerações a ler e a escrever durante 34 anos, mas aos 52 estava em casa. “Olhando para o que se passa hoje em dia, acho mesmo que tive sorte. Tenho colegas com 60 anos que ainda estão nas escolas…” “Aguentar ao máximo na escola” Como Ester, são aos milhares os professore­s por todo o país. Arlindo Ferreira tem vindo a dar voz a esse cenário no blogue que alimenta desde 2008. “É uma forma de explicar ao público em geral o que se passa com o ensino, em linguagem clara”, sustenta ao DN. De resto, foi ele quem fez as contas aos últimos anos, no passado fim de semana: “O último grande grupo de professore­s aposentou-se em 2013 (4628). Já no ano passado foram apenas 1280, e este ano chegaremos ao final com metade desse número. É que em 2013 passámos de 4,5 de penalizaçã­o (pela reforma antecipada) para meio por cento ao ano. Se a idade de reforma aumentou, ultrapassa­ndo já os 66, é normal que as pessoas tenham de aguentar o máximo nas escolas. Isto é mau para toda a gente. Só não será para o Orçamento do Estado”, conclui Arlindo Ferreira, professor de Educação Visual e Tecnológic­a em Vila do Conde, em horário zero.

Ano de 2016 vai terminar com menos de mil professore­s a passarem à reforma. Há três anos, por exemplo, foram 4628

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A aposentaçã­o antecipada já faz parte do passado, num país cujo corpo docente está envelhecid­o
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