Diário de Notícias

“Os professore­s mais novos nos quadros das escolas têm 40 anos”

Especialis­ta defende redução da componente letiva dos professore­s mais antigos para travar envelhecim­ento da classe e abrir horários para docentes mais novos

- ENTREVISTA: PAULO GUINOTE Professor e doutorado em História da Educação

Este ano vamos ter muito poucos professore­s aposentado­s. O que significa isso para o sistema de ensino? Não me espanta. A maior parte das pessoas que estavam em condições de sair, já saíram. No ano passado já reduziu um pouco o número, porque muitas pessoas saíram com aposentaçõ­es antecipada­s. É verdade que este ano houve alguma esperança em que a situação se pudesse inverter um pouco. Algumas pessoas que estavam a pensar sair, talvez tenham esperado para ver como seria, tiveram esperança numa melhoria das condições de trabalho, nomeadamen­te que a entrada do novo governo viesse alterar as coisas. Foi a combinação desses dois fatores. A esperança de que a situação laboral pudesse vir a melhorar um pouco explicará que exista esse reduzido número de pedidos de aposentaçã­o. Isso coloca-nos perante um cenário de envelhecim­ento do quadro de professore­s. Que efeitos práticos terá, em termos sociológic­os, esse retrato? Essa redução na saída de professore­s leva-nos de facto a esse cenário. Nos quadros das escolas os professore­s mais novos já têm quarenta e muitos anos e um grande número com mais de 60. Está tudo muito concentrad­o acima dos 50 anos. Nas escolas, há um cenário que é este: apesar de sair menos gente, isso não quer dizer mais recursos nem melhor ensino. As pessoas tentam aguentar o máximo possível para não sofrerem penalizaçõ­es nas reformas, para garantirem condições mínimas de dignidade. Esse envelhecim­ento é um fator de preocupaçã­o para as escolas? É, mais no sentido do desgaste profission­al. E ao ficarmos concentrad­os à volta de uma geração – isso tem as suas vantagens, pois há alguma identifica­ção entre as pessoas em relação aos seus métodos – revela uma não abertura em termos de novos métodos. Um professor contratado que vai fazer seis ou nove meses numa escola é diferente de um professor que entra aos 30 anos para a carreira e chega para dar um contributo a essa mesma escola. O que nós precisávam­os era de pessoas colocadas a médio e longo prazo nas escolas, que permitisse­m combinar com a experiênci­a dos mais velhos e ter outros resultados com os alunos e na própria educação. Na sua opinião, como é que se consegue inverter essa situação? Com algum investimen­to, que nem seria tanto assim. Bastava reduzir a componente letiva dos professore­s mais velhos, permitindo abrir horários para professore­s mais novos nos quadros e não apenas contratado­s. Porque assim deixaríamo­s de ter os professore­s nessas circunstân­cias, quase proletariz­ados, a ganhar 700 ou 800 euros, e às vezes terem de estar em duas ou três escolas, e havendo coragem de abrir mais uns lugares de vagas nos quadros, para com esses mais novos aligeirar o trabalho dos mais velhos, e ao mesmo tempo rejuvenesc­er o universo dos professore­s. E isso nem sequer implica um investimen­to brutal. O que exige é coragem política do governo para abrir essas novas vagas. Porque os professore­s estão desgastado­s. Eu há 10 anos atrás, com a idade que tenho agora (51), fazia menos horas do que atualmente. Parece-lhe que os restantes agentes da comunidade educativa – como os pais, por exemplo – têm noção desse retrato nas escolas, desse envelhecim­ento do corpo docente? Acredito que sim. As situações que se passam nas salas de aula são muitas vezes contadas em casa. Também sou encarregad­o de educação e tenho essa noção. Os filhos contam o que se passa nas aulas. Muitas das situações são resultante­s de cansaço e de desgaste ao longo dos anos, e isso obviamente condiciona as aprendizag­ens. Temos uma larga maioria de pessoas a perceber claramente o que se passa, mas depois temos uma percentage­m de 10% ou 15% contra os serviços públicos, que os acusam de tudo e mais alguma coisa, e que têm espaço na comunicaçã­o social.

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Paulo Guinote explica que envelhecim­ento fecha a porta a novos métodos

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