Dilma quer virar o resultado, Temer aposta numa goleada
Ela vai ao Senado para convencer e constranger os seus ex-ministros. Ele tem montado operações de charme aos anti-impeachment menos convictos
A etapa final do processo de impeachment, que começa amanhã, é como uma segunda mão de uma eliminatória da Liga dos Campeões: na primeira mão, a equipa do presidente interino Michel Temer, do Partido do Movimento da Democracia Brasileira (PMDB), venceu por margem confortável, quase irreversível, a presidente suspensa Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT ), e os seus defensores. Temer, no entanto, recusa-se a defender o resultado e promete ampliar a vantagem para não deixar margens para dúvidas da sua superioridade, enquanto Dilma jogará até à última gota de suor por uma surpresa. O futebol é um terreno mais fértil para surpresas do que a política – mas, a acontecerem surpresas na política, o Brasil é o lugar propício.
Comecemos pelo resultado da tal primeira mão, ou seja, a votação de há duas semanas que tornou Dilma ré pelas “pedaladas fiscais”, ou manobras orçamentais, de que é acusada: na ocasião, 59 senadores votaram pela substituição definitiva por Temer e 21 pelo regresso da petista ao cargo. Renan Calheiros, na qualidade de presidente do Senado, absteve-se. Para o inquilino do Palácio do Planalto mudar de vez bastam 54 votos – o campo dilmista precisa então de convencer seis dos seus julgadores a mudar de opinião.
Sabendo disso, Dilma aposta tudo no dramatismo da sua ida ao Senado, na próxima segunda-feira. Lerá um discurso, previsto para 30 minutos, e depois deve sujeitar-se a perguntas dos senadores pró e contra o impeachment. “Ela agiganta-se nas dificuldades e sob pressão, vai mudar o voto de muita gente e até a perceção da opinião pública”, prognostica Lindbergh Farias, senador do PT. “A presença dela será suficiente para convencer os indecisos”, acrescenta Gleisi Hoffman, também petista. “Não cometeu nenhum crime, por isso está de consciência tranquila, ao contrário de alguns dos senadores”, completa José Eduardo Cardozo, o advogado de Dilma, que lhe vem dando “aulas” antes da ida ao Senado.
E Dilma quer, de facto, tocar a consciência de alguns dos seus senadores. Nomeadamente, Fernando Bezerra Coelho, do Partido Socialista Brasileiro (PSB), Edison Lobão, Garibaldi Alves Filho, Eduardo Braga e Marta Suplicy, todos do PMDB mas seus ex-ministros, e ainda Cristovam Buarque, do Partido Popular Socialista (PPS), que foi ministro de Lula. “Se não os convencer vai, pelo menos, constranger”, afirma um apoiante de Dilma.
Temer e os seus apoiantes, porém, confiam que nenhum daqueles nomes mude de campo. Mais: acreditam poder alterar o voto de três senadores contrários ao impeachment. Como? O senador Roberto Muniz, do Partido Progressista (PP), confidenciou no dia seguinte à votação que fez de Dilma ré, e na qual votou contra o impeachment, que estava desolado pela extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário, área que lhe é cara. Ouvindo o desabafo, Eliseu Padilha, ministro da Casa Civil, prometeu de imediato o regresso da pasta, em caso de afastamento definitivo de Dilma. “Estou muito feliz, eis um novo olhar para a importância da agricultura”, reagiu Muniz.
Ao até agora dilmista Otto Alencar, do Partido Social Democrático (PSD), foi concedida nos últimos dias uma honra rara: discursou no Planalto, onde normalmente só fala o presidente da República, numa solenidade sobre o lançamento de um projeto hidrográfico que lhe dizia respeito. Sendo Alencar da Bahia, a iniciativa foi interpretada como uma tentativa de agradar aos senadores nordestinos, como Elmano Ferrer, do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) do Piauí, outro capaz de mudar de lado. “Tenho votado contra o impeachment apenas de acordo com a vontade do meu eleitorado...”, confessou. Como o PTB é da base aliada do governo interino, o campo de Temer avalia Ferrer como um eleitor volúvel. A estes três, Michel Temer quer ainda juntar o colega de partido Renan Calheiros, que até agora tem optado pela imparcialidade.
Para o inquilino do Planalto mudar de vez bastam 54 votos