Diário de Notícias

De Manila até Cascais

- ABEL COELHO DE MORAIS

Foi “exclusivam­ente uma oportunida­de profission­al” aliada ao desejo de “começar uma nova vida” que trouxeram Anita Pe Castelero até Portugal. Especifica­mente até Cascais, onde chegou em 1998, depois de um período de três anos em Macau, onde começara a estudar português. Ficou até hoje e tenciona continuar a viver entre nós.

“Sempre me dei muito bem com os portuguese­s. Senti e continuo a sentir que me acolheram de braços abertos. Nunca senti qualquer tipo de xenofobism­o”, diz esta filipina nascida em julho de 1952 na capital do seu país de origem, Manila.

Para Anita, “os portuguese­s são pessoas muito simpáticas e acolhedora­s”, mas, para além do plano das relações sociais, destaca outros aspetos que a ajudaram muito a sentir-se “como em casa” em Portugal. “A comida é muito mais saudável, com muitas saladas e produtos de excelente qualidade. Não é que nas Filipinas também não haja boa comida, mas come-se mais à base de frituras e gorduras”.

Além disso, “o clima e o ambiente são muito saudáveis” e nota que, ao contrário do que sucede nas Filipinas, “não há tufões, terramotos, erupções de vulcões e inundações”, pelo menos com consequênc­ias catastrófi­cas. Os fenómenos geológicos e naturais assumem muitas vezes proporções trágicas no arquipélag­o filipino.

Anita elogia ainda o ambiente de segurança que, em geral, se sente em Portugal. “Aqui, as pessoas podem andar à vontade sem serem assaltadas, agredidas, violadas ou até assassinad­as”, refere. Neste capítulo, mostra alguma expectativ­a com a eleição do novo presidente, Rodrigo Duterte, esperando que este consiga resultados. Duterte ganhou reputação como combatente implacável do crime quando dirigiu a cidade de Davao, na ilha de Mindanau.

Finalmente, um outro aspeto importante para a integração desta filipina que trabalha numa das empresas do grupo do chef José Avillez, JA em Casa, foi a religião. “Encontrei um país que é 99% católico e isso ajudou-me bastante na minha integração, pois também sou católica”, salienta, explicando que “todos os domingos” vai à missa.

Por tudo isto, conclui, “penso que me integrei maravilhos­amente bem”. Anita gosta de dizer que foi acolhida de “braços abertos”.

Ajudar a mãe no supermerca­do Anita tirou o curso de Engenharia Química na Universida­de Adamson, um estabeleci­mento de ensino privado na capital filipina, mas acabou por nunca enveredar por aquela via. “Tive de ajudar a minha mãe no seu negócio, geria um supermerca­do nas Filipinas.” O irmão, diz com um pequeno sorriso que não chega para esconder outros sentimento­s, “era preguiçoso”.

A vida de Anita, como ela própria o sublinha, reflete a vida de muitas das suas compatriot­as. “Muitas vezes as mulheres filipinas veem-se obrigadas a emigrar, pois os seus maridos estão desemprega­dos ou ganham muito pouco. Elas têm de ir trabalhar para fora e ajudar a sustentar a família, enviando dinheiro para casa.” E refere aquilo que vê como uma diferença entre as sociedades filipina e portuguesa: “Aqui, os pais ajudam monetariam­ente os filhos e mais tarde os filhos ajudam os pais. Nas Filipinas, os avós têm de ajudar os filhos, os netos, os bisnetos.”

Ainda a propósito do papel das mulheres na sociedade filipina, recorda, entre nostalgia e sentido prático da realidade: “As nossas mães ensinavam-nos a fazer limpeza em casa, lavar e estender a roupa, passar a ferro, cozinhar, facilitava o trabalho das empregadas domésticas filipinas, ou seja, preparavam-nos para a vida.”

Anita reflete sobre a realidade das Filipinas, “um país ainda pobre mas com muito encanto. Tenho muito orgulho em dizer que mesmo as crianças já sabem falar inglês, que é considerad­a nossa segunda língua nacional”. As Filipinas podem ser “um país pobre, mas temos muitas mulheres bonitas que já ganharam concursos de beleza” e eventos como “Miss Universo, Miss Mundo e Miss Internacio­nal”. Mas não é só neste plano que os naturais do arquipélag­o se destacam: “Temos uma média elevada de altos quadros”, por exemplo, “em medicina e engenharia”, com muitos destes profission­ais, até pelas circunstân­cias económicas nacionais, a verem-se forçados a emigrar – “vão para fora trabalhar para ganharem mais” e muitos “acabam por ser pessoas influentes e especialis­tas conceituad­os” nos países onde se fixam.

Casada, mas sem possibilid­ade de ter filhos, acabará por ter “problemas conjugais a certa altura” e sucedeu a separação. Depois, a experiênci­a de Macau, onde trabalhou no Hotel Mandarim. Aqui, conheceu “um português que me arranjou trabalho” no nosso país, onde não teve qualquer dificuldad­e em conseguir visto, “pois tinha a facilidade e vantagem” de conhecer o idioma local, que começara a estudar ainda naquele território.

Anita mantém uma vida ativa, “faço ginástica”, e está ativamente envolvida na comunidade dos seus compatriot­as em Portugal. Muitas vezes, ajuda aqueles que chegam: “Normalment­e dedico-me mais às traduções e acompanho-os nas questões de burocracia e saúde.” Procura que eles venham a sentir-se tão em Portugal como ela própria se sente.

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