Turcos e América

Joe Biden visita a Turquia e no mesmo dia tanques turcos entram na Síria. A coincidência ajuda a explicar a dificuldade que atravessa a relação entre os Estados Unidos e a Turquia, parceiros na NATO e os dois maiores exércitos da Aliança Atlântica. Na Síria, americanos e turcos conseguem ao mesmo tempo partilhar objetivos e divergir a sério.

Vejamos: tanto Estados Unidos como Turquia querem derrubar o regime de Bashar al-Assad. E também concordam que o Estado Islâmico é o alvo a abater, por ter aproveitado a rebelião para criar um califado que serve de base ao terror jihadista. Mas para os turcos outro alvo são as milícias curdas da Síria, acusadas de serem fiéis ao PKK, o grupo curdo da Turquia que luta pela independência e é considerado terrorista. Porém, os americanos consideram os combatentes curdos sírios aliados eficazes contra o jihadismo.

Na frente de batalha, ontem os tanques turcos avançaram contra o Estado Islâmico mas também contra as milícias curdas. Estas, por seu lado, atacaram o Estado Islâmico com cobertura aérea americana, mas avisadas para não passarem a oeste do Eufrates, procurando expandir o território curdo.

É um frágil equilíbrio e cheio de riscos. Sobretudo porque da Rússia à Arábia Saudita, passando pelo Irão, outras potências estão envolvidas na Síria. Há uma linha vermelha que nem americanos nem turcos querem ultrapassar e que é ficar em lados opostos. Seria terrível para a NATO e de custo tremendo para os dois países. A América precisa da Turquia como parceiro no Médio Oriente, a Turquia não se pode dar ao luxo de renegar a aliança americana.

Neste contexto, que importância dar à extradição de Fethullah Gülen, o clérigo que a Turquia acusa de ter ordenado a recente tentativa de golpe? Para o presidente Recep Erdogan é tema vital, para o vice americano Biden nem tanto. Se algo foi negociado durante a visita é segredo, mas ambos sabem que nada nem ninguém pode ser mais importante do que a solidez da NATO.