No Prison Insider “queremos um mundo com menos prisões”
Disponível em três idiomas, inglês, francês e espanhol, projeto conta para já com duas dezenas de correspondentes em 25 países
“Tentar sondar o que se passa dentro dos muros da prisão é uma tarefa gigantesca”, confessa Bernard Bolze, cofundador do primeiro site de informação dedicado à atualidade dos estabelecimentos prisionais. Antigo jornalista, fundador do Observatório Internacional das prisões (OIP) em 1990, e ex-membro do organismo independente de controlo das cadeias francesas, Bolze dedicou mais de três décadas de carreira a denunciar as injustiças e falhas do sistema prisional. Uma “pena” perpétua para o militante dos direitos dos reclusos que, após o encerramento da secção internacional da OIP, decidiu reincidir, aos 65 anos, sem circunstâncias atenuantes.
A lista de motivações do novo projeto é longa, a sobrelotação prisional acima dos 260% em países como o Benim, os maus-tratos nas prisões chinesas ou da Arábia Saudita, as condições dos idosos e pessoas com deficiência, ou os casos de violência e suicí- dio de detidos. “É um tema extremamente mal tratado, a começar pela classe política. Assistimos a uma instrumentalização do medo, porque não nos preocupamos em estar do lado das vítimas.” O novo site, Prison Insider, disponível para já em três idiomas (inglês, francês e espanhol), tem duas dezenas de correspondentes permanentes em 25 países, responsáveis por relatar, analisar, investigar e comparar o dia-a-dia nas cadeias dos cinco continentes. Uma tarefa gigantesca quando “as informações são escassas, inexistentes ou truncadas”, diz Bolze. Filmar as condições de detenção O site, financiado por crowdfunding e por assinaturas (30 euros anuais para particulares e 300 para as instituições) propõe relatórios atualizados sobre a situação das cadeias em cada país, reportagens de investigação (a primeira sobre a pena perpétua), artigos de opinião de advogados ou militantes dos direitos humanos, testemunhos de reclusos e uma secção, de acesso gratuito, com informação para “o que fazer em caso de detenção”.
“Há casos preocupantes, como em certos países africanos, nos quais, na impossibilidade de capturar um suspeito, prende-se um membro da família”, afirma Bolze, que denuncia igualmente uma “industrialização do sistema prisional”, quando vários países ocidentais constroem cadeias em países africanos, “com um modelo totalmente alheio à realidade local”. No futuro, os responsáveis de Prison Insider, esperam que os prisioneiros possam denunciar as condições de detenção, com o envio de vídeos filmados dentro da prisão. “Temos um público alvo de mais de dez milhões de detidos no mundo, e de mais de 30 milhões de leitores, com as famílias, funcionários dos serviços penitenciários, advogados e académicos.” Contracorrente(s) Prison Insider apresenta-se como um projeto militante, sem álibis. “Queremos um mundo com menos prisões”, afirma o cofundador, também ele um ex-recluso, condenado durante os movimentos sociais nos anos 1970 a seis meses de cadeia. “A prisão hoje é antes de mais o reflexo da miséria, no interior encontramos pessoas idosas, pessoas detidas por delitos rodoviários ou tráfico de droga, pessoas afetadas pela crise, há cada vez menos pessoas detidas por homicídios ou assaltos a bancos”.
Uma constatação confirmada pelo relatório anual das prisões nos 50 Estados membros do Conselho da Europa que, apesar de uma ligeira diminuição, denuncia há décadas a sobrelotação de um quarto das prisões do continente, com países como França e Portugal, no topo da lista. “É necessário adaptar as penas. Cada vez que são comutadas, temos menos reincidência, mas vemos que, cada vez mais, a classe política defende o cumprimento integral das penas de prisão.” Segundo Bolze, a duração média do período de detenção tem vindo a aumentar em alguns países da Europa, como em França, onde duplicaram de 5 para 10 meses nas últimas décadas.
Estudo recente do Ministério da Justiça francês revela que a taxa de reincidência é quase três vezes menor entre detidos em prisão domiciliária com pulseira eletrónica (63%-23%). “A prisão é por vezes uma má solução, não sou um abolicionista, mas reconheço que muitas das vezes a prisão é o produto da miséria e, ao mesmo tempo, uma forma de punição demasiado cara para os resultados que produz”.