ABORDAGEM DA DISLIPIDEMIA HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR, UMA TAREFA PARA TODOS
A DOENÇA ATEROSCLERÓTICA TEM UMA NATUREZA MULTIFATORIAL E RESULTA DE UMA MULTIPLICIDADE DE FATORES INTERVENIENTES (AMBIENTAIS, DIETÉTICOS, METABÓLICOS, HEMODINÂMICOS, INFLAMATÓRIOS E GENÉTICOS) QUE SE DESENVOLVEM NUM LONGO PROCESSO EVOLUTIVO
Aaterosclerose prematura, fruto do “estilo de vida” inapropriado, aliada ao envelhecimento populacional, fazem da aterosclerose um importante problema de saúde pública em Portugal. As doenças do aparelho circulatório cujas principais expressões clínicas são a doença vascular cerebral (AVC) e a doença cardíaca isquémica (enfarte do miocárdio), continuam a ser a principal causa de morbimortalidade não só nacional mas também das sociedades industrializadas.
Dois importantes estudos de base populacional – o INTERSTROKE e o INTERHEART, abrangendo populações de diferentes áreas geográficas, condições socioeconómicas e hábitos dietéticos, permitem identificar nove variáveis de risco atribuíveis à doença vascular cerebral e à doença cardíaca isquémica. A hipertensão arterial e a dislipidemia (alterações do metabolismo das lipoproteínas) destacam-se pela sua importância no risco atribuído para a doença vascular cerebral e para a cardiopatia isquémica, respetivamente. A prevenção e tratamento destes fatores de risco, previne a ocorrência dos eventos vasculares iniciais e recorrentes, e constitui um objetivo importante na abordagem do doente com doença aterosclerótica (DA).
A hipercolesterolemia familiar (HF) é uma doença hereditária que causa níveis elevados de colesterol total e muito particularmente do colesterol LDL (LDL é a sigla de Low Density Lipoproteins, que significa lipoproteínas de baixa densidade, também chamado de “mau colesterol”), desde criança. Na HF, há uma ou mais alterações genéticas que são transmitidas de geração em geração, favorecedoras do desenvolvimento precoce da DA nos diferentes territórios vasculares (por exemplo contribuindo para o enfarte do miocárdio, o acidente vascular cerebral, a doença arterial periférica), com diferente gravidade clínica. Se à HF se agregarem outros fatores de risco bem conhecidos da DA como a hipertensão arterial, o tabagismo, o excesso de peso, a diabetes mellitus, então a DA terá não só uma expressão clínica mais precoce como ainda uma gravidade mais impactante na mortalidade e morbilidade (avaliado em anos potenciais de vida perdidos).
Não se sabe com precisão, a prevalência da HF heterozigótica em Portugal, mas estima-se que possa ser < 1/500. Por isso se compreende a importância de estratégias que visem um diagnóstico precoce da HF que é, entre nós, uma entidade subdiagnosticada e sub-tratada. Para atingir este desiderato, é preciso juntar esforços dos profissionais de saúde e da sociedade civil, para o reconhecimento da entidade HF, entenda-se o seu diagnóstico, para o seu posterior tratamento. A par do tratamento farmacológico precoce e adequado, é preciso nunca esquecer a importância de uma adoção de estilos de vida saudáveis (por exemplo, não fumar, controlar o peso, reduzir a ingestão de gorduras saturadas, fazer exercício físico regularmente, etc.).
De uma maneira simples diria que se deve suspeitar de HF quando o valor do colesterol total for superior a 310 mg/dl e/ou o colesterol LDL for superior a 190 mg/ dl, em idade adulta.
Apesar da HF ser uma doença hereditária, não resisto citar Sir William Osler in Quotable Osler (2003),
“More commonly the arteriosclerosis results from the bad use of good vessels” - (Nota do Editor: traduzido do inglês, “Frequentemente, a aterosclerose resulta da má utilização de bons vasos sanguíneos.”)
NA HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR, HÁ UMA OU MAIS ALTERAÇÕES GENÉTICAS QUE SÃO TRANSMITIDAS DE GERAÇÃO EM GERAÇÃO, FAVORECEDORAS DO DESENVOLVIMENTO PRECOCE DA DOENÇA ATEROSCLERÓTICA NOS DIFERENTES TERRITÓRIOS VASCULARES