Nevermind dos Nirvana continua fresco
Mais do que mudar a cara do rock alternativo, o segundo álbum mediatizou a banda de Kurt Cobain. Foi há 25 anos.
Osegundo álbum dos Nirvana, Nevermind, foi para as lojas há precisamente 25 anos. Talvez este seja mesmo o último álbum rock de impacto universal. Nascido num nicho underground num meio mais isolado (Seattle, pois claro), Nevermind magnetizou outros mundos exteriores ao rock indie, como o grande público rock (e até pop) e franjas metaleiras, a uma velocidade inédita, sem qualquer apoio da internet (que à altura ainda não existia).
O guitarrista e vocalista (e líder incontestável) Kurt Cobain e o altíssimo baixista Kris Novoselic (de mais de dois metros de altura) ha- viam fundado a banda quatro anos antes. Não foram precisos muitos concertos no invernoso estado de Washington, no noroeste dos Estados Unidos (bem coladinho ao Canadá), para o power trio se tornar um fenómeno local a quem rapidamente prognosticaram grandes voos.
A pequena editora Sub Pop, que se tornaria uma plataforma de apoio fundamental para a cena musical de Seattle ao editar também os Soundgarden e os Mudhoney, acredita nos Nirvana e dá-lhes tudo o que tinha. Que era pouco: um orçamento na quantia módica de 600 dólares e um prazo de três dias para Cobain e companhia gravarem Bleach que se estreou nas lojas em 1989.
As apostas quanto a um futuro maior aumentaram, mesmo que o som do grupo ainda estivesse em maturação.
Três dados juntaram-se depois e permitiram a confirmação do vaticínio da grandeza do grupo: os Nirvana finalmente encontram o baterista ideal, Dave Grohl; a banda assina por uma subsidiária da editora Geffen; e Butch Vig é o produtor escolhido (com quem a banda já tinha trabalhado meses antes) para a gravação de Nevermind.
De 24 de setembro de 1991 para a frente, ninguém estancaria o sucesso à escala mundial dos Nirvana. Nem mesmo o próprio Kurt Cobain. O álbum é todo ele envolvente, artilhado por um arsenal de riffs carismáticos e de melodias empáticas que tem um impacto imediato em qualquer ouvinte.
Hinos de uma geração estavam à mercê numa maneirinha coleção de 12 canções (mais uma faixa-bónus) que se atravessava nos gostos de um fã de Beatles, de um seguidor de punk-hardcore (ou pós-hardcore) ou até de um metaleiro.
O murro na alma da faixa inicial Smells Like Teen Spirit poderia deixar KO qualquer canção subsequente, só que o disco chamava-se Nevermind, onde abundavam outros assombros: In Bloom, Come as You Are, Lithium, Territorial Pissings, Drain You. Em todos eles, o bombardeamento do baterista Dave Grohl responde à altura àquele tiroteio sonoro nascido na cabeça de Cobain e tocado em conjunto com Novoselic. O vigor e a frescura de todos os temas, sem exceção, são contagiantes.
Mas Nevermind não era só catarse rocker. O disco podia respirar um pouco fora daquela neurose elétrica com as baladas acústicas Polly (faixa n.º 6) e Something in the Way (faixa n.º 12), o que dava a noção da amplitude de Kurt Cobain como compositor.
Em Polly, Kurt Cobain dava azo ao seu sarcasmo, colocando-se na figura de um violador que queria raptar e atar uma rapariga para seu próprio prazer – tema inspirado num caso verídico.
Em Something in the Way, o guitarrista canhoto coloca-se desta vez na primeira pessoa de um sem-abrigo, a sós com a guitarra acústica e o microfone, grande parte da canção sem banda, deixando transparecer bem o seu comovente poder vocal. Causas e consequências O desprezo familiar a que foi votado Kurt Cobain, e que fez dele um jovem rebelde, instigou-o a mergulhar na música e nos desenhos. Além das sessões no quarto com a guitarra elétrica, Cobain tornou-se num rato de discoteca, aprofundando um conhecimento musical que se tornou enciclopédico.
À paixão pelos Beatles e pelo punk britânico e norte-americano dos finais dos anos 1970 e inícios de 80, este jovem de Aberdeen que sonhava ter uma banda contou com uma conjuntura rock que preparou o terreno para a afirmação dos Nirvana. O crescimento do rock alternativo ao longo dos anos 1980 leva algumas das grandes editoras a apostarem em algumas bandas icónicas: a Warner assina com os pós-hardcores Hüsker Dü e com os R.E.M., a Elektra torna-se o selo norte-americano dos Pixies e a Geffen passa a editar os Sonic Youth. A entrada dos Nirvana no raio da Geffen tem antecedentes.
Por outro lado, cresce uma forte cena musical no estado de Washington, entre as cidades de Olympia, Tacoma, Aberdeen (de onde vinham os Nirvana) e a grande metrópole Seattle. Calvin Johnson dinamizava a cultura do do it yourself em Olympia, através da sua editora Ke a sua banda principal Beat Happening. E os Melvins, venerados por Cobain, cavalgavam um som cavernoso, inspirado no doom-metal, que com a sua fusão com o punk, teria repercussões no que se tornaria o grunge.
O acontecimento Nirvana tornou-se um acontecimento à volta de Seattle, projetando mundialmente outras bandas da região como os Soundgarden, os enigmáticos Alice in Chains, os gozões Mudhoney e sobretudo os Pearl Jam que em 1993 já vendiam mais do que os Nirvana. A MTV, que ainda era um canal de música, deu-lhes espaço a todos eles e aos demais alternativos pós-grungers como Beck, que rapidamente criou o seu espaço autónomo.
Kurt Cobain tanto falou dos Pixies que, mesmo já extintos, tornaram-se uma banda intergeracional. O que os obrigou a um regresso de grande impacto em 2004.