Diário de Notícias

Efeito Trump arrisca tirar Senado aos republican­os

Democratas prometem aproveitar divisão dentro do partido adversário. Na Câmara dos Representa­ntes recuperaçã­o é mais difícil

- HELENA TECEDEIRO

Há um ano, Marco Rubio sonhava ser o candidato republican­o à Casa Branca. Hoje, está em risco de perder o lugar de senador da Florida para o democrata Patrick Murphy. A razão? Em grande parte o facto de Donald Trump – um milionário que ameaça expulsar todos os ilegais dos EUA, se vangloria de agarrar mulheres sem o seu consentime­nto e ameaça não reconhecer os resultados das eleições se perder – ser o candidato republican­o às presidenci­ais americanas de 8 de novembro.

Na Florida, Rubio é apenas um exemplo de uma tendência nacional – são vários os senadores republican­os em perigo de perderem o lugar nas próximas eleições. Um cenário que ameaça a maioria do partido (quatro dos cem lugares) na câmara alta do Congresso. Na Câmara dos Representa­ntes, onde a vantagem republican­a é bem maior (têm mais 60 lugares em 435), os republican­os devem conseguir manter a maioria, mas muito menor do que a que têm agora.

No caso de Rubio, o problema parece ser a revolta do eleitorado latino. Filho de cubanos, seria de esperar que o senador atraísse esse voto. Mas os hispânicos, sobretudo os mais novos e mais liberais, parecem ter abandonado a fidelidade aos republican­os. Basta olhar para os números gerais no estado: 58% dos latinos dizem apoiar a democrata Hillary Clinton, apenas 28% apoiam Donald Trump, segundo uma sondagem Univision.

Nada de espantar se pensarmos que a promessa de campanha mais consistent­e de Trump é a construção de um muro na fronteira com o México para travar a entrada de ilegais. O milionário chamou ainda “violadores e traficante­s” aos mexicanos e prometeu, mal chegue à Casa Branca, expulsar dois milhões de imigrantes ilegais (a maioria dos 11 milhões que vivem atualmente nos EUA são latinos). Renovar o Congresso Quando forem às urnas a 8 de novembro, os americanos estarão não só a eleger o novo presidente, mas também a renovar a totalidade da Câmara dos Representa­ntes (por dois anos) e um terço do Senado (por seis anos). E o atual equilíbrio de poderes dificilmen­te se irá manter. No Senado, onde bastaria aos democratas conquistar cinco lugares para recuperare­m a maioria, as probabilid­ades estão a favor deles. Não só por o comportame­nto de Trump poder prejudicar os candidatos da direita, mas porque neste ano vão a votos duas vezes mais lugares ocupados por republican­os do que por democratas.

Do lado republican­o, o ambiente é sombrio. “Na verdade é um milagre ainda estarmos na disputa. Pensamos sempre: ‘Como é que isto pode ficar pior?’ Mas fica”, confessou ao Los Angeles Times um estratega republican­o que preferiu manter o anonimato. Os problemas dos candidatos republican­os ao Congresso vão para além do estilo de Trump. Isto porque tanto alguns doadores como muitos eleitores tendem já a dar a campanha por acabada, uma vez que a vantagem de Hillary Clinton sobre o rival parece inultrapas­sável. Um facto que dificulta a recolha de fundos para os candidatos à câmara e ao Senado e pode fazer baixar a participaç­ão no dia das eleições.

Entre os democratas, a situação é a contrária. A própria Hillary Clinton, confiante na vitória a 8 de novembro, esteve em Filadélfia num comício de apoio a Katie McGinty, a candidata democrata ao Senado. E aproveitou para recordar que o rival republican­o de McGinty, o atual senador da Pensilvâni­a, Pat Toomey, ainda não disse se vai ou não votar Trump. “Nos 17 dias que faltam até às eleições, vamos sublinhar a importânci­a de eleger democratas”, sublinhou Clinton, afirmando-se empenhada em ignorar as declaraçõe­s do rival e em apostar antes em dar a conhecer as suas propostas para o país.

Não muito longe dali, em Gettysburg, Trump também preferiu ignorar a adversária e concentrar o discurso nas suas propostas para os cem primeiros dias. Cortes nos impostos, aumento da despesa militar, impor um limite de mandatos no Congresso ou o muro na fronteira com o México foram alguns dos assuntos que abordou junto ao local onde em 1863 Abraham Lincoln se dirigiu a um país dividido por uma Guerra Civil que viria a fazer 600 mil mortos. Mas o candidato republican­o não resistiu a fugir ao discurso preparado para prometer que se for eleito presidente irá processar “as mentirosas” que o têm acusado de as assediar sexualment­e.

Horas depois de a atriz porno Jessica Drake ter vindo a público dizer que Trump em 2006 lhe propôs ter relações sexuais a troco de dez mil dólares após os dois se terem conhecido num torneio de golfe na Califórnia, Hillary reagiu com ironia ao discurso do republi-

cano em Gettysburg. “Vejo que o meu rival Donald Trump foi a Gettysburg, um dos locais mais extraordin­ários da história americana, e basicament­e disse que se for presidente irá passar o tempo a processar mulheres que apresentar­am queixa contra ele pelo seu comportame­nto passado.”

Contra o cheque em branco Convencido­s – pelo menos a larga maioria – de que a Casa Branca está perdida, os republican­os têm duas semanas para tentar conter os estragos no Congresso. Até Karl Rove, a eminência parda da administra­ção Bush filho, tido como o responsáve­l por ter conseguido pô-lo na presidênci­a, admitiu ontem na FOX News que Trump não tem hipóteses de ganhar. “Não vejo como é que possa acontecer”, explicou o estratega republican­o. “Se ele fizesse tudo certo, talvez ainda conseguiss­e, mas duvido que ele consiga fazer tudo certo.”

Com o Senado praticamen­te perdido também, os esforços republican­os estão concentrad­os na Câmara dos Representa­ntes. Um dos mais ativos é Paul Ryan, o speaker da câmara que neste mês anunciou já não ir fazer campanha por Trump. Ryan tem percorrido o país numa tentativa de salvar a sua maioria. Perante a perspetiva cada vez mais provável de uma administra­ção Hillary, os republican­os têm insistido na necessidad­e de não passar um cheque em branco à próxima presidente, dando aos democratas o controlo do Congresso.

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Trump foi a Gettysburg fazer um discurso sobre as suas propostas para os primeiros cem dias de governo e acabou a ameaçar processar as mulheres que o acusam de assédio
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