Diário de Notícias

“Os menos esclarecid­os chamam-lhes adoradores do diabo”

- PAULO MENDES PINTO Coordenado­r da Área de Ciência das Religiões da Universida­de Lusófona

Qual a origem do povo yazidi? Não se sabe ao certo a origem deste povo, desta identidade. Possivelme­nte são uma reformulaç­ão, com algum sincretism­o com o islão e o cristianis­mo, das antigas religiões persas, especialme­nte o zoroastris­mo e o culto a Mitra. A origem geográfica deve encontrar-se maioritari­amente na atual Síria e no Iraque. Quais as suas crenças religiosas? Trata-se de uma religião monoteísta, em que se encontra patente, na figura de sete anjos, algumas funções como que delegadas por Deus. Desse grupo de sete anjos, que atuam no mundo como imagem de Deus, salientase o Anjo Pavão, uma figura que vem na tradição das divindades que reinam sobre o mundo (o anjo chama-se Melek Taus e a palavra melek quer dizer rei). Este anjo acabou por ser sincretiza­do com o Anjo Caído da tradição judaico-cristã-islâmica. Assim, o seu nome é também Iblis, o nome do Diabo no Alcorão. Por isso são tidos por muitos muçulmanos menos esclarecid­os como “adoradores do diabo”. Porque foram tão perseguido­s pelos terrorista­s do autoprocla­mado Estado Islâmico? Além de não serem muçulmanos, pelo facto de serem “adoradores do diabo”; isto é, por adorarem o Anjo Pavão, Melek Taus, assimilado ao Iblis corânico, o diabo. Como será a sua integração em Portugal? A integração de membros deste grupo em nada diferirá das restantes. Não vejo aspeto algum que seja mais desafiante, inibidor ou de risco do que com as restantes comunidade­s da região, sejam islâmicas, cristãs ou yazidis, que têm sido acolhidas. Podem existir choques culturais? Como em todos os casos de acolhiment­o de comunidade­s estrangeir­as. Nada de muito diferente do que acontece com outros grupos. Os refugiados que têm sido acolhidos em Portugal têm sido dispersos por todo o país, para evitar a guetização? Os yazidis são uma comunidade que não se separa. Devem manter-se juntos? Essa é sempre uma dúvida nestes processos: espalhar os membros do grupo pode ajudar à integração na população de acolhiment­o. Mas a manutenção em grupo reforça as formas de entreajuda... Nenhuma solução é perfeita. O mais importante é fazer nos locais de acolhiment­o uma boa pedagogia junto das populações, para que a relação com a envolvente seja sem preconceit­os.

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