A nova vida dos Tindersticks chega aos palcos nacionais
A banda britânica está de regresso a Portugal para três concertos que servem de apresentação ao último The Waiting Room, “um novo começo” segundo Stuart Staples
Já lá vão mais de duas décadas, desde a primeira apresentação dos Tindersticks em Portugal, num memorável concerto na Aula Magna que ainda hoje o vocalista Stuart Staples inclui “no top 10 dos mais memoráveis”. Foi também o início de uma longa relação de amor entre o público português e a banda britânica, alimentada, ao longo dos anos, por muitos mais concertos, onde foram sempre recebidos como nessa primeira vez.
“Chegámos a Lisboa de comboio. No dia anterior tínhamos tocado em Madrid, para pouco mais de 300 pessoas, e aí tínhamos uma verdadeira multidão à nossa espera”, afirma ao DN. No início dos anos 1990, a sonoridade contida, quase de câmara, dos Tindersticks, bem como um universo poético muito próprio, que transformava a melancolia em canções perfeitas, representou um corte com os cânones então vigentes na música dita alternativa, muito mais virada para as guitarras ou para a eletrónica. “Éramos apenas uns miúdos de Nottingham que escreviam canções, sem pensar se eram ouvidas ou não, e, de repente, chegamos aqui e encontramos um público que entendia muito bem as emoções da nossa música. Foi uma total surpresa para nós”, reconhece.
Desde então, mudaram muito pouco a receita desse sucesso inicial, o que acabou por conduzir a banda a uma “encruzilhada” a dada altura da carreira. “Os nossos primeiros anos foram fantásticos e sentíamos que estávamos a ficar presos à nostalgia de um passado cada vez mais distante. Mas há um momento em que temos de seguir em frente. Foi isso que finalmente conseguimos fazer com este disco”, sustenta o músico.
Depois do último registo de originais, The Something Rain, editado em 2012, o grupo apenas regressou a estúdio no ano passado, depois de uma extensa digressão comemorativa das duas décadas de carreira, para dar início às gravações de um novo disco, o décimo da carreira da banda. O resultado foi The Waiting Room, um álbum editado no início deste ano e que agora os traz de volta a Portugal. Trata-se, porventura, do mais ambicioso e diverso trabalho dos Tindersticks em muitos anos, no qual, além de um punhado de belas canções, a banda apresenta uma nova vontade de surpreender, através da experimentação de outros caminhos musicais, sejam eles a soul,o funk, o afrobeat e até o krautrock ou pelos melódicos arranjos de sopros do compositor e músico de jazz inglês Julian Siegel.
“Foi como se recomeçássemos tudo de novo e fico muito satisfeito que isso se sinta ao ouvir o disco”, afirma Stuart Staples. O mais importante, sublinha, foi a banda “voltar a sentir cada canção como algo de muito profundo”, o que, reconhece, “por vezes e passados tantos anos é difícil de conseguir”. Quanto às razões que levaram ao desgaste, prefere não se alongar muito: “O que interessa é agora voltámos a estar realmente juntos. Não era cansaço de nada, somos apenas pessoas e isto basta para debilitar uma relação tão longa como a nossa”. Um disco cinematográfico O ponto de viragem aconteceu precisamente depois da edição de The Something Rain, após a qual o grupo se desdobrou em diversos projetos laterais, de bandas sonoras para filmes a discos de música eletrónica. “Precisámos de algum tempo para percebermos a nova banda que nos havíamos tornado e andámos a fazer coisas muito diferentes durante esse período”, lembra. Pelo meio, estiveram ainda entretidos com o álbum Across Six Leap Years, um coletânea lançada para comemorar os 20 anos de carreira, que reunia algumas regravações de temas antigos, e a consequente digressão de aniversário. “O facto de termos novamente de tocar essas canções ao vivo permitiu-nos largar de vez esse passado, ao qual estávamos há muito amarrados. E quando a digressão terminou, sentimos uma enorme liberdade, quase como se estivéssemos prontos a recomeçar do zero novamente”, assume.
Cada canção de The Waiting Room vem acompanhada de uma pequena curta-metragem, da autoria de diferentes realizadores, o que o transforma quase num álbum de música visual. A ideia surgiu de uma colaboração de Stuart Staples com o festival internacional de curtas-metragens de Clermont-Ferrand, em França, no qual foi jurado, em 2012. “Durante uma conversa com o diretor do festival, falámos na hipótese de convidar realizadores para fazerem um conjunto de pequenos filmes baseados em músicas. E em 2014 voltei a pegar na ideia, mas desta vez usando as nossas novas canções, para fazer uma espécie de versão visual do álbum.”
A seleção dos realizadores que mais se identificassem com o projeto e de lhes apresentar as canções foi feito em colaboração com a equipa do festival. “Foi um processo longo, mas ao mesmo tempo muito recompensador, especialmente pelo modo como cada realizador se sentiu inspirado pela nossa música. Foi surpreendente ver a maneira como cada um interpretava as diferentes canções”, refere Stuart Staples. Quando convidado a escolher os seus filmes favoritos, o vocalista responde de imediato que gosta de todos, mas o que mais o tocou “talvez tenha sido o vídeo do Christoph Girardet”, criado pelo realizador alemão para a segunda faixa do disco Second Chance Man. Além das curta-metragens que acompanham cada um dos temas, The Waiting Room inclui ainda dois surpreendentes duetos, um com a falecida cantora americana Lhasa De Sela e outro com a britânica Jehnny Beth, vocalista do grupo Savages.
“Este álbum é um momento importante na história da banda e queremos mostrá-lo aos nossos fãs em todo o seu esplendor”, anuncia o vocalista, em jeito de antevisão para os concertos em Portugal, onde também não faltarão alguns dos temas mais antigos e emblemáticos da banda. “Vamos fazer uma mistura desses dois momentos”, promete o cantor, garantindo desde já aos fãs “um grande espetáculo” – como, aliás, é norma nos Tindersticks sempre que visitam Portugal.
Primeiro concerto da banda na Aula Magna está “no top 10 dos mais memoráveis”