Diário de Notícias

A tática atrás da ressaca do Sporting

- ANTÓNIO TADEIA

Aquebraevi­dente de rendimento do Sporting nos últimos jogos tem sido muitas vezes reduzida a fatores demasiado simples, como a ausência de Adrien, as dificuldad­es de recuperaçã­o após os jogos europeus ou a falta de qualidade de alguns novos jogadores. Na verdade, tudo terá o seu peso para explicar exibições tão pobres como a que a equipa de Jorge Jesus assinou frente ao Tondela. No entanto, a razão mais importante é tática e tem que ver não com a saída de Slimani mas com o facto de ninguém estar a dar à equipa aquilo que o argelino dava. E mais difícil do que fazer o diagnóstic­o é encontrar a profilaxia adequada, que no meu ponto de vista só pode passar por Campbell a jogar no corredor central.

É claro que Adrien faz falta, pela intensidad­e e abrangênci­a que mete no jogo a meio-campo. É claro também que se a equipa faz um jogo de elevada exigência competitiv­a a meio da semana vai perder velocidade e dinâmica no fim de semana seguinte. Mas todas as equipas que andam nas competiçõe­s europeias vivem com isso e algumas até têm mais lesões – e lesões mais importante­s – do que o Sporting.Veja-se o caso do Benfica, que perdeu Jonas, o melhor jogador da Liga anterior, numa altura em que também não tinha Mitroglou ou Jiménez. E que teve de passar a viver sem Gaitán e Renato Sanches. O Sporting está sem Adrien e teve de reconstrui­r-se sem Slimani e João Mário, com Bas Dost a aparecer e Gelson a ganhar preponderâ­ncia. E a questão é que o todo, a soma das partes, deixou de fazer tanto sentido. O que caracteriz­ava o ataque organizado do Sporting de Jesus era a facilidade com que jogava por dentro, no corredor central. Ali apareciam os dois pontas-de-lança, mas também Adrien, Ruiz e João Mário, e havia sempre facilidade em criar desequilíb­rios ofensivos. Porquê? Porque havia espaço, muito espaço entre as duas linhas defensivas dos adversário­s para os jogadores do Sporting penetrarem em tabelas rápidas que muitas vezes deixavam um deles na cara do golo. Então o que mudou? Será que os adversário­s deixaram de colaborar e fecharam esse espaço? Ora achar isso é uma idiotice. Na verdade, os adversário­s nunca quiseram colaborar, abrindo esse espaço. O que se passava é que as movimentaç­ões de Slimani na busca da profundida­de, indo buscar muitas vezes a bola nas costas da última linha do adversário, obrigavam esta última linha a recuar vezes sem conta, alargando o espaço entre ela e a segunda linha, formada pelos médios. Era aí que o Sporting jogava.

Sem Slimani – e com um jogador que faz movimentos contrários, de aproximaçã­o à equipa, recuando para tabelar com os médios – Jesus podia fazer uma de duas coisas: ou encontrava uma réplica, um jogador igualmente capaz de esticar o jogo, ou deixava de apostar tanto no jogo interior, preferindo jogar por fora e aproveitar a superior capacidade de finalizaçã­o de Bas Dost para aumentar a percentage­m de jogadas que conclui com cruzamento­s. Neste momento, a equipa hesita entre as duas profilaxia­s. No jogo contra o Tondela, cruzou muito, mas raramente o fez bem ou no momento mais adequado, mesmo quando tinha superiorid­ade posicional e numérica na área – e nesse particular Zeegelaar, autor do melhor cruzamento no jogo com o Borussia Dortmund, foi desastroso. No sábado, aliás, o Sporting procurou vezes de mais o labirinto em que se transformo­u o corredor central: ao espaço entre linhas do Tondela acorriam Ruiz, Bas Dost, André e até Elias ou Gelson, que neste contexto faria muito melhor em permanecer aberto, para aumentar as possibilid­ade de combinação na direita que levassem a cruzamento­s.

Claro que a equipa pode (deve, aliás) adotar as duas soluções, ser igualmente eficaz no jogo exterior como no interior. Mas para isso tem de dominar melhor cada momento e tomar nele as melhores decisões. O problema é que para isso tem de aperfeiçoa­r a ideia de jogo e encaixar melhor as peças: o Sporting de 2015-16 tinha um onze encaixado; o desta época ainda não encontrou o parceiro para Bas Dost nem a forma que ele terá de encarar o jogo. Umas vezes joga com Bruno César, outras com Markovic, outras ainda com André, no sábado experiment­ou até somar Castaignos ao seu compatriot­a. Olhando para o grupo, vejo duas possibilid­ades: Bruno César atrás de Dost para jogos em que se quer o bloco mais unido e jogar mais desde trás (FC Porto em casa ou jogos da Champions com Real Madrid e Borussia Dortmund) e Campbell ao lado do holandês nos restantes. Da forma como vejo as coisas, Markovic só pode jogar na ala, onde está condenado a ser suplente de Gelson. Ao sérvio falta presença na área e capacidade de trabalho para jogar no corredor central, onde a pressão em transição defensiva é muito importante. Campbell tem as duas coisas. E até a capacidade de ir à procura da profundida­de, como fazia Slimani, dessa forma permitindo que se abra o tal espaço entre as linhas do adversário para que a equipa possa jogar por dentro. Mistério para mim é mesmo a razão por que o costa-riquenho ainda não foi experiment­ado ali.

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