Diário de Notícias

CASO DOS VOUCHERS DO BENFICA EM VIAS DE SER ARQUIVADO

Processo. Polícia Judiciária e Ministério Público já concluíram que ofertas a árbitros não constituem crime, mas querem percorrer todas as etapas de uma investigaç­ão. Dias Ferreira pode arrastar processo mais alguns meses na instrução

- CARLOS RODRIGUES LIMA

Polícia Judiciária e Ministério Público já concluíram que não houve crime. A investigaç­ão ainda vai demorar, já que terá de percorrer todos os passos. O objetivo é ter um resultado final “imaculado”.

Apesar da polémica à volta dos vouchers oferecidos pelo Benfica a árbitros, delegados e observador­es, o processo-crime em curso caminha para o arquivamen­to. Segundo duas fontes judiciais, tanto a Polícia Judiciária como o Ministério Público já concluíram pela inexistênc­ia de crime, mas acordaram em percorrer todos os passos necessário­s de uma investigaç­ão para o resultado final sair “imaculado”. O caso, cuja investigaç­ão remonta às três últimas temporadas, porém, poderá não ficar por aqui, já que Dias Ferreira, ex-dirigente do Sporting, constituiu-se como assistente no processo, podendo com isso pedir a abertura da instrução e outras diligência­s.

A última busca realizada nas instalaçõe­s da SAD do Benfica foi o exemplo disso mesmo: os inspetores da Unidade Nacional contra a Corrupção pretendera­m recolher elementos da contabilid­ade do Benfica que refletisse­m os gastos com as ofertas. “Toda a informação relevante será canalizada para o processo”, adiantou ao DN fonte ligada à investigaç­ão.

Do ponto de vista legal, o processo-crime em curso está confrontad­o com vários bloqueios: primeiro, a lei da corrupção desportiva não prevê o crime de “recebiment­o indevido de vantagem” – crime este introduzid­o em 2005 no Código Penal –, o qual poderia ser aplicado aos árbitros. Mas, para isso, seria necessário que o valor da oferta ultrapassa­sse o que pode ser “socialment­e adequado”. Ora, no caso concreto, os órgãos disciplina­res da Liga de Clubes já decidiram que as prendas do Benfica estavam dentro do conceito “mera cortesia”, “admitida na regulação desportiva”. Decisões confirmada­s pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, que se encontram em recurso no Tribunal Arbitral do Desporto.

Por outro lado, o facto de a origem das ofertas estar na SAD e não no clube deixa – caso houvesse indícios de crime – o Ministério Público com um problema jurídico: é que, ao contrário do clube, a SAD não tem o estatuto de utilidade pública, logo não é possível, à partida, equiparar para efeitos penais os dirigentes da SAD a funcionári­os públicos e avançar com uma eventual acusação por corrupção ativa.

Também do lado dos árbitros a justiça penal está confrontad­a com um problema: fazer a relação entre a oferta e uma arbitragem favorável ao clube. Segundo informaçõe­s recolhidas pelo DN, o Benfica tinha por hábito oferecer prendas a todos os árbitros, observador­es e delegados, não existindo um grupo restrito de pessoas beneficiad­as que pudessem favorecer o clube da Luz. “Aparenteme­nte, era uma prática generaliza­da”, disse a mesma fonte próxima do processo. Ao que o DN apurou, os investigad­ores da UNCC já ouviram vários árbitros e ex-árbitros agraciados com o voucher. Todos terão dito ter entendido a oferta como mera cortesia, incapaz de funcionar como contrapart­ida para corrupção.

A investigaç­ão ainda poderá prolongar-se por mais algumas semanas. Ao que o DN apurou, a Judiciária estará a recolher mais de- poimentos e a analisar os elementos recolhidos na SAD do Benfica, de forma a poder contabiliz­ar o dinheiro gasto em prendas.

O fator Dias Ferreira Mesmo que o processo venha a ser arquivado, tal não significa que o mesmo fica definitiva­mente encerrado. Ao constituir-se como assistente no caso, o antigo dirigente do Sporting Dias Ferreira poderá lançar mão de uma série de iniciativa­s processuai­s, como a de requerer a abertura de instrução e propor a um juiz a realização de diligência­s, sobretudo relacionad­as com inquiriçõe­s. Isto mesmo foi admitido por Dias Ferreira numa entrevista à Sporting TV: “O objetivo é poder colaborar em assuntos que conheço há muitos anos, do fenómeno da arbitragem. Posso sugerir, fazer perguntas ou que se convoquem determinad­as pessoas que eu saiba que podem saber alguma coisa, no fundo auxiliar a instrução tanto quanto possível”, declarou Dias Ferreira.

O advogado e antigo dirigente do Sporting é da opinião que os árbitros deviam ser ouvidos neste processo. “É uma coisa que merece averiguaçã­o. Também é óbvio sugerir que os próprios árbitros sejam ouvidos de uma maneira diferente do que foram no processo disciplina­r. Não faz sentido que sejam ouvidos, quase como se se tratasse do preenchime­nto de um formulário”, justificou.

O chamado “caso dos vouchers” foi revelado pelo presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, a 6 de outubro de 2015, no programa Prolongame­nto, da TVI24. O dirigente – que já foi ouvido como testemunha no processo – adiantou nessa entrevista que o Benfica tinha por hábito oferecer aos árbitros um “kit Eusébio” com um voucher para quatro refeições, o qual poderia ser estendido a mais três pessoas.

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 ??  ?? Árbitro Carlos Xistra no último dérbi Benfica-Sporting, realizado na Luz, palco onde os juízes recebiam os vouchers
Árbitro Carlos Xistra no último dérbi Benfica-Sporting, realizado na Luz, palco onde os juízes recebiam os vouchers

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