Diário de Notícias

Centeno sem resposta para novo privilégio de gestores da Caixa

Administra­dores libertos do dever de mostrarem publicamen­te declaraçõe­s de rendimento­s que teriam de apresentar no TC

- JOÃO PEDRO HENRIQUES

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) continua a dar problemas atrás de problemas ao governo. Ontem o executivo não soube como responder a uma denúncia feita no domingo à noite na SIC por Luís Marques Mendes: a de que os novos administra­dores teriam ficado isentados de obrigações de escrutínio a que estão sujeitos todos os outros gestores públicos. A saber: o dever de entregar uma declaração de rendimento­s no Tribunal Constituci­onal; o de entregar uma declaração sobre incompatib­ilidades e impediment­os na Procurador­iaGeral da República; e o de entregar na Inspeção-Geral de Finanças uma terceira declaração sobre participaç­ões que detenham em qualquer empresa. As perguntas do DN sobre o assunto ficaram sem resposta do Ministério das Finanças.

A isenção ocorre à boleia do decreto do governo que fez que os novos administra­dores do banco público deixassem de ser abrangidos pelos deveres e direitos previstos no Estatuto do Gestor Público – ficando também libertos das suas limitações salariais (António Domingues, o novo presidente do banco público, poderá ter remuneraçõ­es salariais superiores a 600 mil euros/ano, contando vencimento­s e eventuais prémios de produtivid­ade).

O decreto em causa diz que o Estatuto do Gestor Público “não se aplica a quem seja designado para órgão de administra­ção de instituiçõ­es de crédito integradas no setor empresaria­l do Estado e qualificad­as como ‘entidades supervisio­nadas significat­ivas’”.

Ora se “não se aplica” isto quer dizer que os novos administra­dores do banco público ficam isentos naquela parte em que aos gestores públicos se aplica o Regime Jurídico de Incompatib­ilidades e Impediment­os dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos. E assim ficam libertos dos tais deveres de transparên­cia a que estão obrigados todos os outros gestores públicos. No domingo, Luís Marques Mendes dizia que “de duas uma: ou isto é um lapso e tem de ser corrigido, ou isto é intenciona­l e é gravíssimo” porque “foi omitido até hoje por quem fez a lei”, porque “passamos a ter um regime de exceção para a Caixa que ninguém compreende” e porque “é trocar a transparên­cia pelo secretismo, o escrutínio pela opacidade”. “Alguém tem de explicar isto e com rapidez”, exigia o ex-líder do PSD. Ontem não foi esclarecid­o – talvez hoje.

Seja como for, o polémico decreto do governo, feito à medida para permitir aos novos administra­dor da CGD salários mais altos, garante, no preâmbulo, que “a designação dos membros dos órgãos de administra­ção das instituiçõ­es de crédito significat­ivas com natureza pública continua a ser sujeita a um exigente escrutínio, estando obrigada ao cumpriment­o de rigorosos requisitos de adequação e idoneidade daqueles titulares”.

Remete então para os poderes de verificaçã­o da idoneidade dos gestores que o Banco Central Europeu exerce através do Banco de Portugal e para as regras do Regime Geral das Instituiçõ­es de Crédito e Sociedades Financeira­s. Estas impõem aos gestores deveres de informação ao regulador – mas não de informação pública, como está previsto no Estatuto do Gestor Público.

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António Domingues, novo presidente da CGD, quando depôs em 27 de setembro na comissão parlamenta­r de inquérito ao banco público

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