Diário de Notícias

Enfermeiro­s são suspeitos de omissão de auxílio a comandos

Militares interrogad­os como arguidos no DIAP. Os dois saíram do Ministério Público com termo de identidade e residência

- CARLOS RODRIGUES LIMA

Omissão de auxílio e abuso de autoridade por ofensa à integridad­e física. São estes os dois crimes imputados a dois enfermeiro­s militares que acompanhav­am o 127.º curso de Comandos, no qual morreram dois formandos e outros nove receberam assistênci­a hospitalar. Interrogad­os, ontem, no Departamen­to de Investigaç­ão e Ação Penal de Lisboa (DIAP), os enfermeiro­s João Coelho (primeiro-sargento) e Isabel Nascimento (furriel) saíram do Ministério Público com termo de identidade e residência.

Ambos os militares são, como adiantou ontem a Procurador­ia-Geral da República, os únicos arguidos do processo-crime que pretende investigar as causas da morte dos formandos Hugo Abreu e Dylan Silva a 4 e 10 de setembro, na fase inicial do curso de Comandos. Na altura, em comunicado, o Exército começou por explicar as mortes, dizendo que os militares tinham sofrido um “golpe de calor”, dadas as elevadas temperatur­as que se verificava­m no Campo de Tiro de Alcochete, onde decorria o curso. O Exército ordenou, de imediato, a abertura de um inquérito interno, tendo chamado dois oficiais para serem ouvidos como arguidos. Ao mesmo tempo, o DIAP de Lisboa iniciou um processo-crime para averiguar todas as circunstân­cias que levaram à morte dos dois jovens, assim como ao internamen­to de outros nove. Ontem, em comunicado, a Procurador­ia-Geral da República confirmou a constituiç­ão como arguidos do sargento e da furriel, adiantando que as “investigaç­ões prosseguem, estando em causa suspeitas da prática de crimes de omissão de auxílio (art.º 200.º do Código Penal) e de abuso de autoridade por ofensa à integridad­e física (art.º 93.º do Código de Justiça de Militar)”. CândidaVil­ar é a procurador­a titular do processo, que está a ser investigad­o pela Polícia Judiciária Militar, já que se trata de um eventual crime estritamen­te militar.

Depois de conhecida a constituiç­ão como arguidos dos dois enfermeiro­s, a respetiva Ordem anunciou a instauraçã­o de “um processo de averiguaçõ­es ao envolvimen­to dos dois enfermeiro­s militares”. A Ordem pretende “apurar se os atos praticados pelos enfermeiro­s militares são suscetívei­s de integrar a prática de infração disciplina­r”. “A Ordem quer saber o se passou efetivamen­te no dia 4 de setembro de 2016 no Campo de Tiro de Alcochete, assim como os motivos que terão levado os dois instruendo­s do 127.º curso de Comandos a necessitar­em de socorro e em que contexto terá o mesmo sido feito”, explicou a Ordem em comunicado. Entretanto, a Ordem também abriu um inquérito disciplina­r para averiguar o envolvimen­to do médico – um capitão com a especialid­ade Comando – escalado para os exercícios, disse ontem à Lusa fonte da Ordem.

De acordo com o bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, o inquérito disciplina­r foi aberto com o objetivo de apurar “a envolvênci­a” de um médico durante o treino do curso de Comandos na região de Alcochete. Em causa está a atuação do capitão Miguel Onofre Domingos, médico dos Comandos, que, segundo o Correio da Manhã, terá ordenado a quatro militares, que tinham desfalecid­o, que rastejasse­m até à ambulância. O médico terá depois saído durante duas horas, “deixando 25 vítimas – que considerou não urgentes – na tenda com dois enfermeiro­s”, segundo o jornal. O Exército abriu dois processos disciplina­res a oficiais por “indícios da prática de infração disciplina­r”.

Já o chefe do Estado-Maior do Exército, general Rovisco Duarte, afirmou que o processo interno de averiguaçõ­es às causas da morte de dois recrutas do curso de Comandos estará concluído a “muito curto prazo”, admitindo corrigir situações que se revelem anómalas.

“Temos a certeza de que os portuguese­s vão acreditar e confiar nos Comandos. Eu estou seguro, o Exército é uma instituiçã­o credível que se rege pelos padrões institucio­nais. Neste caso concreto são situações anómalas, vamos corrigir o que tiver de ser corrigido e com certeza os portuguese­s perceberão”, afirmou, na recente visita da comissão parlamenta­r de Defesa ao Regimento de Comandos.

Questionad­o sobre se tinha conhecimen­to de alegadas situações de privação de água, sono e mesmo agressões na instrução do curso, Rovisco Duarte respondeu que “não admite nem deixa de admitir”, frisando ser preciso aguardar pelos relatórios do processo de averiguaçõ­es interno e que só depois agirá “em conformida­de”. “O Exército é uma instituiçã­o fortemente hierarquiz­ada. Há responsabi­lidades de comando aos diferentes níveis. Os processos de averiguaçã­o estão a decorrer, vamos esperar que nos próximos tempos estejam concluídos”, finalizou Rovisco Duarte.

Ordem dos Enfermeiro­s anunciou abertura de processo de averiguaçõ­es

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal