Diário de Notícias

E o Man Booker Prize foi para... um norte-americano

Quatro horas. Foi este o tempo de que o júri precisou para atribuir o prémio a Paul Beatty pela sua sátira racial Sellout

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MARINA MARQUES Paul Beatty, de 54 anos anos, entrou ontem para a história do mais importante prémio literário de língua inglesa atribuído no Reino Unido. Não só venceu o galardão – e arrecadou o prémio monetário de 59 mil euros – como se tornou o primeiro norte-americano a conseguir o feito, nesta que foi a terceira edição após a mudança de regras que passou a admitir candidatur­as de escritores de todas as nacionalid­ades desde que escrevesse­m em língua inglesa e os livros estivessem publicados no Reino Unido.

“Pode ser difícil de acreditar, vindo de um preto, mas eu nunca roubei nada.” É assim, numa tradução livre, que começa Sellout, a sátira racial de Paul Betty, um “livro que prega o leitor à cruz, num alegre abandono, mas é por isso que funciona: ao ser pregado, o leitor fica agarrado”, afirmou a historiado­ra Amanda Foreman que neste ano presidiu ao júri do prémio que desde 1969 distingue os melhores romances publicados no mercado britânico.

Ontem à noite, após o jantar de cerimónia no Guindhall, em Londres, com a presença da duquesa da Cornualha, Camila, que entregou o prémio a Paul Beatty, o autor falou, visivelmen­te emocionado, “da longa jornada” que tem sido a sua vida. “Não quero ser dramático [dizendo] que a escrita salvou a minha vida ou algo do género – mas a escrita deu-me uma vida”, afirmou.

De acordo com o júri, que precisou de quatro horas para decidir por unanimidad­e o nome do vencedor, o livro “põe a nu todos os tabus

O americano Paul Beatty recebeu ontem à noite o prémio das mãos da duquesa da Cornualha sociais e nuances politicame­nte corretas, todas as vacas sagradas, e ao mesmo tempo faz-nos rir e estremecer. É engraçado e doloroso ao mesmo tempo”.

“Sellout é um daqueles raros livros capazes de pegar na sátira, um assunto muito difícil e nem sempre bem feito, e mergulha no coração da sociedade americana contemporâ­nea com um humor absolutame­nte selvagem de um género que já não via desde Swift ou Twain”, afirmou ainda Foreman.

Publicado no Reino Unido pela Oneworld – a mesma editora que apostara no livro A Brief History of Seven Killings, do jamaicano Marlon James, vencedor da edição de 2015 – o romance conta a história de um narrador americano negro descontent­e com o rumo da vida e que, para afirmar a sua identidade afro-americana, procura restabelec­er a escravatur­a e a segregação na sua cidade gueto agrária.

Segundo os jornais ingleses, o livro refere por 200 vezes a palavra nigger e 233 a palavra fuck. Paul Beatty, que publicou o seu primeiro livro Big Bank Takes Little Bank em 1991, já admitiu em entrevista­s à imprensa inglesa que os leitores podem achar o livro difícil de digerir. Algo que não incomoda minimament­e Amanda Foreman: “A ficção não deve ser confortáve­l. É raro a verdade ser bonita.”

Os outros cinco finalistas eram Paul Beaty (Estados Unidos), com The Sellout, publicado pela Oneworld, Deborah Levy (Reino Unido), com Hot Milk, publicado pela Hamish Hamilton, Graeme Macrae Burnet (Reino Unido), com His Bloody Project, publicado pela Contraband, Otessa Mosgfegh (Estados Unidos), com Eileen, publicado pela Jonathan Cape, David Szalay (Canadá/Estados Unidos da América), com All That Man Is, também publicado pela Jonathan Cape e Madeleine Thien (Canadá), com Do Not Say We Have Nothing, publicado pela Granta Books, apontada como uma das favoritas a vencer a edição deste ano.

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