Diário de Notícias

Sindicatos acionista de bancos? Não, obrigado

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Passados todos estes anos de crise e de acertos no sistema financeiro português, muito há ainda por fazer, parecendo até, em muitos casos, que nada foi feito e que voltamos sempre ao princípio: reduzir postos de trabalho, reduzir postos de trabalho...

Se essa é a receita, porque persiste a doença? A célebre alteração do modelo de negócio com a digitaliza­ção é exatamente o quê? De acordo com as notícias vindas a público, a percentage­m de clientes “digitais” mantém-se há muito nos 34%, exigindo que se faça uma reflexão muito mais aprofundad­a sobre o trabalho na banca e a relação desta com os seus clientes.

Seja por que via for, a atividade bancária e o seu sucesso radicará sempre na confiança gerada entre pessoas que se sentam dos dois lados da mesa, e não é crível que um computador qualquer, por mais eficiente que seja, consiga substituir o poder de escolha e decisão de cada um de nós.

O nível de exigência da prestação dos bancários aumenta todos os dias, seja pela concorrênc­ia ou pela quantidade e complexida­de das regras, por

RUI RISO vezes de aplicabili­dade duvidosa. Neste particular, os bancários trabalham quase sem rede e sob pressão de objetivos muitas vezes inalcançáv­eis.

Há que clarificar até onde se pode e deve ir, de forma a evitar cometer-se de novo os erros, de há não muito tempo, que lesaram cidadãos menos avisados ou mesmo completame­nte desconhece­dores do que poderia acontecer às suas poupanças. Entre estes cidadãos também há bancários que investiram as suas poupanças e as de familiares.

Uns e outros têm de ser protegidos. O que se passou não pode voltar a acontecer, nem se pode esperar que o célebre mercado se regule naturalmen­te. Foi, aliás, nessa espera que o mundo financeiro se concentrou no antes e no pós-crise de 2008, e o resultado está à vista.

Mas voltemos à reorganiza­ção do sistema financeiro, assunto que vai continuar a merecer muito da nossa atenção. De acordo com regras europeias impostas pela DGCom cuja correspond­ência, se existe, é tida como o segredo mais bem guardado em Portugal, cada banco que foi “ajudado” directa ou indirectam­ente pelo Estado tem obrigatori­amente de reduzir a sua dimensão quer em número de balcões quer em número de trabalhado­res, em toda ou quase toda a banca em Portugal, incluindo no banco público, de acordo com o anúncio recente.

Esta tem sido a justificaç­ão para as sucessivas reestrutur­ações da banca europeia e é ao abrigo deste guarda-chuva que se vão sucedendo a perda de postos de trabalho e o aumento da dificuldad­e de acesso aos serviços bancários mais elementare­s por parte de muitos cidadãos.

É verdade que filosofica­mente o princípio merecerá aprovação porque a DGCom defende que a redução de uns intervenie­ntes permitiria o aparecimen­to de novos operadores, só que o resultado tem sido uma acentuada redução do número de bancos fazen- do prever uma enorme dependênci­a do negócio de um número muito restrito de operadores com a consequent­e diminuição dos benefícios de uma concorrênc­ia diversific­ada.

É público que está a ser preparada legislação sobre esta matéria, que integrará normas europeias, e os bancários estão a dar o contributo, assumindo o seu papel e confinando a sua ação aos compromiss­os assumidos.

De forma transparen­te, com contas certificad­as e auditadas reveladora­s de que os recursos que nos são confiados são aplicados de acordo com o nosso objeto – e nem mais nem menos que isso. Sem registo de mais-valias em ações ou papel comercial, mas também sem registos de menos-valias.

Como se diz agora, essa não é a dimensão dos bancários, como não é abrir portas de eminentes conflitos de interesses, porque nem sempre os dos trabalhado­res são os mesmos dos detentores de capital.

Sindicatos acionista de bancos? Não, obrigado.

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