Mil dias depois, Felipe VI pode enfim sair da sombra
Formado um novo governo e conhecida a sentença do caso Nóos, o reinado de Felipe VI poderá agora, finalmente, começar
Com a crise política controlada, a Catalunha converte-se no principal problema interno. A Generalitat quer convocar referendo
A sombra do pai, quase um ano sem um novo governo, visitas de Estado ao estrangeiro adiadas e o lastro do Caso Nóos. FelipeVI cumpre amanhã os primeiros mil dias como rei de Espanha. Um período durante o qual não faltaram dificuldades e o protagonismo da Casa Real foi menor do que o esperado. O monarca assistiu neste período à instabilidade política no país. Em oito meses realizou cinco rondas de consultas com os partidos políticos enquanto o pai, Juan Carlos, em 38 anos e meio, teve só dez. Uma instabilidade que o forçou a ter um papel mais discreto do que o normal, nomeadamente no plano internacional. O seu papel de “embaixador” acabou por se tornar muito discreto, mas tudo indica que, em 2017, recupere algum do tempo perdido.
Com a crise política controlada, a Catalunha converte-se agora no principal problema interno. Este ano a Generalitat quer convocar um referendo independentista. Na Zarzuela defende-se a operação diálogo comandada pela ministra Soraya Sáenz de Santamaría, com quem o monarca mantém uma boa relação. Tal como sublinhou no seu discurso de Natal, defende “o respeito de todos os espanhóis” face aos enfrentamentos “estéreis” e atitudes que ignoram a lei.
“O reinado de Felipe VI começa realmente agora”, afirma ao DN Ana Romero, jornalista especializada na Casa Real. “Juan Carlos I está em segundo plano e finalmente foi conhecida a sentença do caso Nóos”, acrescenta. Na sua opinião, houve pequenos detalhes nos últimos meses que marcam a diferença. Por um lado, o rei emérito não apareceu na última reunião da COTEC, em Madrid, no passado 10 de fevereiro. “É muito significativo porque ele promoveu esta entidade.” Por outro lado, a viagem do presidente da Argentina a Espanha “foi o início deste novo reinado”. Durante esta visita vimos a rainha Letizia “pela primeira vez com a tiara real da flor-de-lis e o chefe do Estado argentino foi recebido no Palácio Real e não no Palácio d’O Pardo. Tudo tem conotações”.
Durante muitos anos ouviu-se que havia muitos “juancarlistas” e não monárquicos. Com a chegada de Felipe VI ao trono há quem ponha em questão o futuro da monarquia. “Juan Carlos I pôs em perigo a instituição com o seu comportamento”, refere Ana Romero. Mas considera que a ala republicana é muito pequena – “quase reduzida a Alberto Garzón e seus seguidores na IU” – e que sem a monarquia “o Estado sofreria muito”.
A sentença do Caso Nóos, onde está envolvida a irmã do rei, Cristina, também tem repercussões na reputação da coroa. “Mais uma vez todos os detalhes deste caso não ajudam a Casa Real. Estão a viver um exílio dourado com um alto nível de vida”, lembra a jornalista. À espera da sentença do Tribunal Supremo, o cunhado do rei, Iñaki Urdangarín, “continua em liberdade mas acho impensável que não vá para a prisão”. Ana Romero imagina que a condenação “ficará reduzida a dois anos, por boa conduta depois de realizar serviço comunitário”. Lembra que a relação entre os dois irmãos não existe mas considera “normal” que o resto dos familiares ajudem a Cristina, “como faria qualquer família espanhola”.