Diário de Notícias

Pela primeira vez na nossa história, o pior inimigo do Banco de Portugal é precisamen­te a maioria no poder, com os dirigentes a atropelare­m-se em grande azáfama para minar Carlos Costa e a sua equipa

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Ora, o euro tem funcionado bastante bem, em Portugal e no resto da zona, pelo que a única conclusão possível é que o Banco de Portugal tem cumprido a sua missão. Muita gente discorda da frase anterior, mas, se alguma vez tivesse vivido num país com moeda a funcionar mal, notaria imediatame­nte as diferenças.

A prova do que se disse é que em Portugal, apesar da enorme crise dos últimos anos, ninguém perdeu um cêntimo de depósitos. E isso, que não foi nada fácil de conseguir, deve-se à actuação do Banco de Portugal, que cumpriu a sua missão. É verdade que os accionista­s e credores de alguns bancos perderam muito dinheiro. Mas o Banco de Portugal não pode nem deve preocupar-se com accionista­s ou credores da banca. A sua preocupaçã­o é exclusivam­ente com os clientes dos bancos, porque apenas os depósitos constituem moeda. Também é verdade que alguns achavam ter depósitos e descobrira­m, por imprudênci­a ou fraude, serem accionista­s ou credores do seu banco. Mas, de novo, isto não faz parte da função do Banco de Portugal, apenas centrada no euro, e nada mais.

Também é verdade que a maneira normal de assegurar a estabilida­de de uma moeda é através da solidez da banca. Só que isso constitui um instrument­o, não uma finalidade. Quando um banco se revela frágil, é responsabi­lidade da autoridade monetária tomar todas as medidas necessária­s para garantir a integridad­e dos depósitos, mesmo à custa da sobrevivên­cia desse banco. Isso aconteceu por três vezes no passado recente, em 2008 com o BPN, em 2014 com o BES e em 2015 com o Banif, e das três vezes a moeda manteve-se firme e os depositant­es ficaram seguros.

Por isso esta crise, se mostrou a debilidade da nossa banca, também manifestou a solidez do sistema monetário. Muitos culpam o capitão pela tempestade, mas é nesta que se vê a qualidade daquele. Não existiram por cá derrocadas financeira­s, pânicos, hiperinfla­ções ou ruturas de pagamentos, muito frequentes nos casos em que realmente a autoridade monetária não sabe ou não pode cumprir as suas funções. Basta comparar com crises do passado, por exemplo a que vivemos por cá em 1891, para admirar a actual gestão do Banco de Portugal.

Então porquê tanta animosidad­e? A explicação tem de estar noutros interesses, que neste caso nem são difíceis de entender. Todos os negócios da banca têm em jogo muitos milhares de milhões e, como habitual em Portugal, é sempre mais fácil insultar o árbitro do que chutar à baliza. Na venda do Novo Banco, nas emergência­s da Caixa Geral de Depósitos, Montepio Geral, e outros, ou nos custos das exigências regulament­ares, muitos preferem um banco central manietado. Em particular, quando na CGD o Estado se encontra na posição da família Espírito Santo, não admira o alvoroço. Felizmente, a autoridade monetária em Portugal é o Sistema Europeu de Bancos Centrais. Noutras condições, o interesse nacional seria defraudado com menos alarido.

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