Diário de Notícias

No Leste da Europa, com a Hungria e a Polónia em destaque, crescem os sentimento­s nacionalis­tas de povos que chegaram recentemen­te à União. Governa-se contrarian­do o espírito europeu, cerceando liberdades, e ninguém se mostra preocupado com isso

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a política interna. Dá-se o caso de essa política estar altamente dependente da soberania que partilhamo­s com as instituiçõ­es europeias em Bruxelas e Frankfurt. A fragilidad­e da posição portuguesa em relação ao projeto europeu também se encontra nesta ambiguidad­e da política nacional. O consenso para governar faz-se à esquerda, mas o consenso em relação à Europa faz-se à direita.

Numa Europa em que os interesses comuns se estabelece­m mais depressa pela proximidad­e geográfica do que ideológica, as várias velocidade­s em que os diferentes governos querem caminhar só pode resultar num afastament­o ainda maior. É evidente que a direita espanhola prefere estar com os socialista­s franceses, portuguese­s e italianos, ou mesmo com a extrema-esquerda grega, como é evidente que o Sul se transformo­u num problema eleitoral para os partidos do arco de poder no Centro e Norte da Europa, ameaçados por populismos de direita. Por isso, também ninguém estranha que o socialista Dijsselblo­em tenha incluído o discurso populista no seu repertório.

No Leste da Europa, com a Hungria e a Polónia em destaque, crescem os sentimento­s nacionalis­tas de povos que chegaram recentemen­te à União. Governa-se contrarian­do o espírito europeu, cerceando liberdades, e ninguém se mostra preocupado com isso. É uma das velocidade­s que mais adeptos ganha nesta Europa das geografias, a velocidade da marcha-atrás. Anda por isso muito longe da memória, para uma maioria dos eleitores europeus, a Europa que se construiu depois do Tratado de Roma, muito assente na social-democracia e na democracia-cristã, com a esquerda e a direita, sem perderem as suas matrizes ideológica­s, a encontrare­m consensos para um desenvolvi­mento social que acompanhas­se o desenvolvi­mento económico.

As geografias ganharam espaço quando as ideologias o perderam, com campos políticos a incorporar­em a retórica dos adversário­s à procura de votos para a eleição seguinte. As conquistas sociais, que fizeram da Europa um exemplo para o mundo, transforma­ram-se num problema. Como era preciso reganhar competitiv­idade, o valor do trabalho foi desvaloriz­ado. E não, não foi agora com a direita tradiciona­l a ficar mais populista, ou mesmo socialista­s como Dijsselblo­em com discursos sexistas e xenófobos. A ideologia foi metida na gaveta e a Europa social enfraqueci­da também pela terceira via de Blair, com um sucesso tal que a imitação de outros partidos socialista­s foi quase imediata. Como a esquerda se quis parecer com a direita, acabou por lhe entregar, por muitos anos, o poder na maior parte dos países europeus. E, agora moribundos na Grécia ou em agonia na Espanha, afastados do poder em muitos outros países, os socialista­s europeus vivem numa União Europeia totalmente dominada pelo capital. Muito contribuír­am para que se chegasse até aqui.

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