Diário de Notícias

Caso BES tem mais de 1500 processos nos tribunais

Entre as ações há sete inquéritos-crime à gestão, 200 queixas de privados e 50 para impugnar a decisão de resolução do Banco de Portugal. 19 mil pessoas e empresas reclamam créditos. Advogados admitem falta de capacidade e temem que não haja desfecho em p

- CARLOS RODRIGUES LIMA

“Isso é brutal.” Foi esta a reação de um juiz aos números revelados pela comissão liquidatár­ia do Banco Espírito Santo no processo de falência: há mais de 1500 ações nos tribunais nas quais o banco é demandado. Destas, 50 pretendem a anulação da medida de resolução tomada pelo Banco de Portugal, em 2015, 1225 são ações cíveis, maioritari­amente pedidos de indemnizaç­ão a antigos administra­dores e ao banco e reclamação de créditos. A estes números há que somar os sete inquéritos-crime relacionad­os com a gestão do BES, que correm no DCIAP e DIAP de Lisboa, os quais têm atreladas cerca de 200 queixas particular­es.

Os números podem tornar-se ainda mais complicado­s, uma vez que, como decorre da lei, muitas das ações declarativ­as, sobretudo aquelas que pedem indemnizaç­ões ao banco, terão de ser declaradas extintas e os pedidos passarem para o processo de insolvênci­a, que corre no Tribunal do Comércio de Lisboa. Processo este que, ainda de acordo com os dados da Comissão Liquidatár­ia, conta com 17 mil requerimen­tos de 19 mil pessoas e empresas a reclamar créditos. “Se no Tribunal do Comércio o toner das impressora­s tem de estar de manhã num juízo e à tarde noutro, como é que pode ter capacidade para despachar um processo destes?”, comentou ao DN o advogado António Pragal Colaço, manifestan­do pouca fé com um desfecho a médio prazo favorável aos credores. “Tendo em conta a dimensão do processo, muito provavelme­nte o Conselho Superior da Magistratu­ra terá de tomar medidas de gestão do processo”, explicou ao DN João Paulo Raposo, secretário-geral da Associação Sindical dos Juízes. Estas medidas podem passar por colocar juízes da bolsa como adjuntos do juiz titular do processo. Só que aqueles não terão poder decisório, dado o princípio do juiz natural.

Foi este cenário de enorme litigância, como admitiu ao DN Ricardo Ângelo, presidente da Associação dos Lesados do Papel Comercial, que levou ao acordo celebrado, em dezembro do ano passado, entre os lesados, o Banco de Portugal e o governo. “Pessoas com altas responsabi­lidades neste país alertaram-nos logo para o problema da justiça e de uma decisão num prazo razoável”, declarou ao DN Ricardo Ângelo, explicando que, após o acordo, os lesados que avançaram com queixas vão transmitir os direitos jurídicos das mesmas para o Fundo de Resolução, que irá litigar nos tribunais. Até 500 mil euros aplicados no BES, recorde-se, os clientes podem recuperar até 75% do valor, com um teto máximo de 250 mil euros.

“A média de idades dos nossos associados são 60 anos. Se estivéssem­os à espera de uma decisão dos tribunais, como nos disse o anterior primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, muitas dessas pessoas já teriam morrido”, acrescento­u o presidente da Associação de Lesados do Papel Comercial. A própria comissão liquidatár­ia informou o tribunal que também avançou com processo contra sociedades ligadas ao antigo Grupo Espírito Santo, reclamando créditos na ordem dos 300 milhões de euros. Só à Rioforte foram reclamados 198 milhões. Sete inquéritos-crime Se no comércio, cível e administra­tivo o cenário é aterrador, no crime não muda muito de figura. Há sete inquéritos a correr no Ministério Público relacionad­os com a suspeita de crimes durante a gestão de Ricardo Salgado e outros administra­dores. Seis estão no Departamen­to Central de Investigaç­ão e Ação Penal (DCIAP), um está no Departamen­to de Investigaç­ão e Ação Penal de Lisboa (DIAP). Este último diz respeito a clientes do Banco Privée Espírito Santo do Luxemburgo e conta com 51 queixas apensadas.

No que diz respeito ao chamado processo principal do BES, uma última decisão do juiz Carlos Alexandre prolongou o segredo de justiça até setembro de 2018. De acordo com o pedido do Ministério Público, a investigaç­ão a este caso desenvolve-se em três frentes: Portugal, Suíça e Luxemburgo, tendo sido criada uma equipa conjunta devido à complexida­de do caso.

De forma a harmonizar os prazos de três jurisdiçõe­s diferentes, os procurador­es do DCIAP considerar­am que, para não prejudicar a investigaç­ão em nenhum dos países, o segredo (que, no fundo, impede o acesso à totalidade do processo por parte dos arguidos) deveria ser prolongado mais do que um ano. Ainda de acordo com o pedido do MP, as autoridade­s helvéticas já colocaram à disposição do MP português três milhões de documentos para análise. O problema é que, segundo o procurador, estão em língua estrangeir­a, carecendo, por isso, da respetiva tradução. Ao mesmo tempo, os autos contêm 15 milhões de documentos para análise, aos quais foram acrescenta­dos 5 terabytes de informação que chegaram recentemen­te ao processo vindo de outro caso.

Associação de lesados fez acordo para evitar calvário dos processos judiciais, disse ao DN o presidente, Ricardo Ângelo Associação Sindical dos Juízes considera que Conselho Superior deve tomar medidas para a gestão do processo de insolvênci­a do BES

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Nos últimos anos, os chamados “lesados do BES” promoveram diversas manifestaç­ões. O alvo principal foi o Banco de Portugal que, em 2014, considerav­a o BES como uma instituiçã­o segura, levando milhares de pessoas a subscrever produtos aos balcões de um...

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