Trumputin?
Em 2013, Tillerson recebeu a Ordem da Amizade, a mais importante condecoração que a Rússia oferece a um estrangeiro. Na época, as suas relações com Putin não podiam ser melhores. Mas como presidente da ExxonMobil, o racional Tillerson sabia que tinha a última palavra quando falava em nome da empresa petrolífera e Putin também sabia o que valia aquilo que o americano lhe dizia, e parecia ser bastante.
Ontem, Tillerson esteve com o governante russo. E em teoria num cargo mais poderoso do que o de líder de uma empresa. Mas a verdade é que o secretário de Estado obedece ao seu presidente, e se isto sempre condicionou quem tem de gerir a política externa, no caso da administração Trump é ainda mais evidente. Tillerson esteve com Putin sabedor do que Trump disse ontem sobre a Rússia, mas desconhecedor daquilo que dirá amanhã.
Eleito sob a suspeita de ter beneficiado de manipulação russa contra Hillary, Trump esforça-se agora por manter as distâncias com Putin, de quem já se confessou admirador. E usou a Síria para tentar pôr Putin em guarda, relembrando que os americanos são mais poderosos, seja qual for o termo de comparação, desde a economia até às forças armadas (tirando o nuclear, onde existe um equilíbrio). Já a Rússia, sabendo que tem de fazer milagres com os atuais meios, faz voz grossa dizendo que não permitirá novo ataque ao seu aliado árabe.
Não se sabe se Trump ainda vê a Rússia como um parceiro para travar a ascensão da China. Ideia arriscada mas não absurda, basta pensar em como Nixon fez da China um parceiro contra a União Soviética. Quando se ouve Mattis, secretário da Defesa, dizer que a luta contra o Estado Islâmico continua a ser a prioridade, percebe-se que pelo menos no Médio Oriente Trump ainda não desistiu de trabalhar com Putin – até o avisou do ataque contra a base aérea síria.
No final das reuniões de Moscovo, russos e americanos concordaram que a relação bilateral está num ponto péssimo (e para complicar, Trump declarava em Washington que a NATO importa). Não disseram, nem Tillerson nem o seu homólogo Lavrov, mas quase que se podia acrescentar que até está pior do que na era Obama. Como inverter este caminho tão inesperado como perigoso? Suspeito que só quando Trump e Putin se encontrarem se perceberá o sentido de Trumputin.