Dinheiro, viagens, televisores, jantares e convites pagavam corrupção no fisco
Quadros das Finanças são suspeitos de eliminar dívidas fiscais, fornecer informação confidencial, cessar atividades e até apressar processos de levantamento de penhoras
CARLOS RODRIGUES LIMA A dívida de 2,5 milhões de euros à Caixa Geral de Depósitos transtornava o casal, que procurou os conselhos de um advogado para tentar resolver a situação, já que lhe tinha sido instaurado um processo de execução fiscal. Depois de algumas reuniões, ficou combinado que o casal lhe pagaria 25 mil euros, dos quais seriam retirados 2500 para pagar a dois funcionários das Finanças, que tratariam de apagar a dívida do sistema por “prescrição”. Esta é uma das situações relatadas pelo Ministério Público na acusação contra 45 pessoas, suspeitas de integrarem um esquema de corrupção nas Finanças.
No caso do casal que recorreu ao advogado, uma posterior reclamação da Caixa Geral de Depósitos junto do Tribunal Tributário acabaria por anular a tese da prescrição, congeminada pelo advogado e por dois funcionários do fisco, agora acusados pela 9.ª secção do Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa (DIAP) por crimes de corrupção ativa e passiva respetivamente.
Os dois funcionários das Finanças fazem parte de um leque de 15 quadros do fisco (dois deles já reformados) apanhados na investigação da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária (UNCC), que também recolheu suspeitas contra empresários, gestores de empresas e técnicos oficiais de contas. No leque dos eventuais corruptores ativos constam João Silveira Botelho, administrador da Fundação Champalimaud e José Manteigas Martins, um dos mais conhecidos advogados de Lisboa – ambos acusados de
O DN procurou obter, durante o dia de ontem, uma reação destes dois últimos acusados ao despacho do MP, mas não obteve resposta.
Além de entregas em numerário, a investigação da UNCC apurou que outra das vantagens alegadamente recebidas pelos funcionários das Finanças passaria por viagens. Isto mesmo foi apurado em relação a um chefe das Finanças, suspeito de ter viajado com a família, em março de 2016, para o Brasil, sendo a respetiva viagem e a estada pagas por um empresário. Ou, noutro exemplo que consta de acusação, depois de ter classificado como “artigos avariados e sem valor”, como LCD, frigoríficos e máquina de lavar roupa, ou seja, não comercializáveis, um empresário terá oferecido uns quantos a dois funcionários das Finanças. Foram acusados de corrupção ativa e passiva.
Noutros casos identificados pela investigação, os funcionários das Finanças ficavam satisfeitos com um jantar ou com um almoço para aceder aos pedidos. Ontem, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, Paulo Ralha, reclamou melhores salários para a classe, para não serem tentados a aceitar subornos.