Diário de Notícias

“Era um atleta que ninguém conhecia. Não estava à espera de ganhar”

António Pinto recorda a primeira vitória na Maratona de Londres, que o lançou para a ribalta mundial. Aconteceu há 25 anos

- RUI MARQUES SIMÕES

“Fiquei surpreendi­do com o desenrolar da corrida mas sabia que, no fim, era dos mais fortes”, recorda Pinto sobre a primeira vitória

Há lendas que nascem assim, quando quase ninguém está a contar. António Pinto ia correr a segunda maratona da carreira, não tivera tempo para se preparar a 100% para ela, e, por mais que acreditass­e nas suas capacidade­s, não sabia até onde podia ir. Foi até ao 1.º lugar do pódio. “Foi uma chegada quase ao sprint, a meta ainda era próxima ao Big Ben. Quando a vi, já sabia que era o mais rápido dos que lá estavam”, recorda o antigo atleta, que começou aí o seu enamoramen­to com a Maratona de Londres. Foi há 25 anos.

Em vésperas de mais uma edição da mítica prova londrina (corre-se domingo, a partir das 8.55), é impossível não recordar as façanhas de António Pinto, um dos recordista­s de vitórias (três) e ainda o último branco e europeu a ganhar a competição masculina. Afinal, tudo começou na edição de 1992 (corrida a 12 de abril), uma estreia de sonho para o atleta de Amarante.

“Eu era um atleta que ninguém conhecia. Não estava à espera de ganhar”, recorda, ao DN, António Pinto. “Não estava à espera da vitória porque era apenas a minha segunda maratona e era em Londres, a prova mais competitiv­a do mundo, que junta um grande leque de atletas de topo. Eu já tinha ganhado provas importante­s, de meia-maratona e 10 000 metros, mas acabei por surpreende­r tanto a organizaçã­o como a maioria dos treinadore­s e atletas concorrent­es”, explica o ex-atleta.

Na altura, apesar da juventude (tinha 26 anos, quando os trintões ainda imperavam na distância), António Pinto já mostrava potencial de maratonist­a – “sabia que podia ser candidato”. “Não tinha podido preparar a maratona a 100%, como entendia, porque tinha muitos compromiss­os com o clube [Benfica] e com a seleção”, explica. Mas isso não o afetou: destacou-se na frente e, apesar da oposição do polaco Jan Huruk (que recuperou distâncias nos quilómetro­s finais) e do tanzaniano Thomas Robert Naali (uma lebre que aguentou o ritmo até ao fim...), segurou a vitória, em 2:10:02 horas, com cinco e seis segundos de avanço sobre os perseguido­res. “Fiquei um bocado surpreendi­do com o desenrolar da corrida mas sabia que, no fim, era dos mais fortes”, sublinha.

Aquele triunfo mexeu com a carreira de António Pinto. “Claro que mudou muita coisa: abriu-me muitas portas para futuras maratonas. Ganhar em Londres, que na altura era a mais importante, tirando a dos Jogos Olímpicos, lançou-me para outras grandes maratonas, que era onde se ganhava dinheiro”, confidenci­a. No entanto, apesar de outras vitórias saborosas – como a de Berlim, em 1994 – nenhuma dessas provas teve o mesmo simbolismo para o ex-atleta nortenho.

Londres – onde colecionou três vitórias (1992, 1997 e 2000), dois segundos e dois terceiros lugares – era mesmo especial. “A organizaçã­o quase que me achava indispensá­vel. Eu ia dar espetáculo, sempre na cabeça da corrida (nunca fui de andar atrás, à espera que os colegas suportasse­m a despesa...). Preparava-me imenso, dava-me bem com o percurso e o público apreciava-me, porque era branco, europeu e dava o máximo”, descreve.

As memórias são tão gratas que o amarantino até prefere esquecer as polémicas envolvendo Jon Brown, a maior estrela britânica da época, que o acusou de doping, por suspeitar da forma como António Pinto recuperava rapidament­e das provas de maratona para os 10000, 5000 ou 1500 metros. “Havia pessoas que ficavam surpreendi­das com as minhas mudanças de ritmo e perguntava­m como é que um branco conseguia tão bons resultados e era tão consistent­e, como, se calhar, só Tergat, Gebrselass­ie e Farah conseguira­m ser... Simplesmen­te, fazia bem a transição da maratona para a pista. António Pinto ao cortar a meta, no primeiro triunfo em Londres, com marca de 2:10.02. O atleta luso repetiria a festa em 1997 e 2000

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