DOIS MORTOS NO DIA EM QUE A VENEZUELA SAIU À RUA
Oposição e apoiantes de Nicolás Maduro inundaram ontem Caracas e outros pontos do país. Data marcada por morte de duas pessoas que não faziam parte dos protestos
Era a “mãe de todas as marchas” da oposição contra a “marcha histórica” promovida pelo governo do presidente Nicolás Maduro. O dia, 19 de abril, assinalava o 207.º aniversário da revolução de 1810, que levou à independência da Venezuela. A Guarda Nacional Bolivariana usou gás lacrimogéneo para dispersar focos de protestos antirregime em várias cidades. Um jovem de 17 anos acabou por morrer em Caracas depois de ser baleado na cabeça logo após o início das manifestações opositoras. O rapaz, que faria 18 anos dentro de dois dias, ainda foi levado para o hospital de moto, mas acabou por morrer horas mais tarde. Os disparos terão sido feitos por um grupo paramilitar, referiram várias testemunhas. Segundo o El Nacional, Moreno estava no primeiro semestre de Economia na Universidade Central da Venezuela e, quando foi atingido pelo disparo, ia fazer desporto, não fazendo parte dos protestos.
Já no estado de Táchira registou- -se outra vítima, uma mulher de 23 anos. “Ela não participava no protesto. Estava a quatro quarteirões do protesto e abrigou-se na Praça San Carlos, quando começaram os tumultos”, relatou à agência Efe um jornalista presente no local. A mesma fonte indicou que, segundo testemunhas, a mulher saiu da praça vários minutos depois e que um grupo de supostos civis armados, que haviam atuado contra a manifestação, disparou sobre ela “à queima-roupa e sem troca de palavras”.
Os protestos de ontem marcados pela oposição eram contra duas sentenças em que o Supremo limitou a imunidade parlamentar e assumiu as funções do Parlamento, onde a oposição detém a maioria, decisões que foram revertidas mas que continuam a ser vistas como um “golpe de Estado”.
Antecipando o protesto dos opositores, Maduro havia ordenado às Forças Armadas Bolivarianas (FAB) que se espalhassem por todo o país e anunciado a aprovação de um plano para aumentar para 500 mil os membros da Milícia Bolivariana que, armados, serão enviados “em defesa da moral, da honra, do compromisso com a pátria”.
A Guarda Nacional Bolivariana reprimiu manifestantes opositores em vários pontos das zonas oeste e sul de Caracas, recorrendo a gás lacrimogéneo. O deputado José Manuel Olivares indicou que um elemento da GNB lhe disse que não poderiam marchar pelo bairro Libertador, onde fica o centro do poder da Venezuela – Palácio de Miraflores, o local de trabalho do presidente, a Assembleia Nacional, o Supremo Tribunal de Justiça, entre outros.
Lilian Tintori, a mulher do opo- sitor Leopoldo López (detido desde 2014), publicou vários vídeos durante a marcha de protesto nos quais surgia de máscara para evitar gás lacrimogéneo, juntamente com mensagens “Queremos paz! Não violência!”, “A Guarda Nacional reprime-nos com bombas. Seguimos, não nos cansamos”.
Situações de caos e confrontos com as forças policiais que se repetiram também em cidades como San Cristóbal, Santa Mónica, Maracaibo e El Paraíso. Um dos porta--vozes da manifestação a favor do regime bolivariano foi o presidente da Câmara de Caracas, Jorge Rodríguez, que garantiu que o governador de Miranda, o opositor Henrique Capriles, iria saber ontem o verdadeiro significado do 19 de abril ao ouvir o povo revolucionário gritar “paz, liberdade e independência”. Capriles, que participou nos protestos em Caracas, foi uma das vítimas do gás lacrimogéneo lançado pela GNB.
Manifestantes opositores e motards identificados com o partido de Maduro ficaram frente a frente na autoestrada Francisco Fajardo, onde estava um piquete da GNB, que após discussões sem agressões entre as duas partes, acabou por separar os grupos. A decisão de Maduro de armar 500 mil civis, elementos da chamada Milícia Bolivariana, foi condenada pela Organização dos Estados Americanos, que pediu ontem a Caracas que proteja o direito dos venezuelanos a defender a democracia e a liberdade. Também o gabinete do alto-comissário da ONU para os Direitos Humanos advertiu o governo de Maduro que a entrega de armas a civis só irá exacerbar a tensão.
Guarda Nacional Bolivariana usou gás lacrimogéneo para dispersar manifestantes da oposição um pouco por todo o país