Diário de Notícias

Costa forçado a defender-se de críticas vindas do PS

Governo acusado por deputados socialista­s de violar princípio da laicidade do Estado. Primeiro-ministro e Presidente da República invocaram precedente­s

- JOÃO PEDRO HENRIQUES

A decisão governamen­tal de dar tolerância de ponto à administra­ção pública no dia 12 de maio, por causa da visita a Portugal do Papa Francisco para participar nas celebraçõe­s do centenário de Fátima, provocou uma minitempes­tade dentro do PS.

Fizeram-se ouvir várias vozes contra, que suscitaram outras a favor – mas as divisões não seguiram exatamente a fratura católicos/não católicos. O primeiro-ministro teve de ir a jogo: “Tenho um grande à-vontade sobre esta matéria. Não só defendo a laicidade como não sou crente, mas respeito a crença dos outros e não ignoro que muitos portuguese­s perfilham a fé católica e que muitos portuguese­s desejarão estar em Fátima. Acho que seria uma grande insensibil­idade da parte do governo não o fazer, como temos feito noutras ocasiões.”

Quem abriu as hostilidad­es foi o deputado coordenado­r dos socialista­s na comissão de Trabalho e Segurança Social. Numa nota no Facebook, Tiago Barbosa Ribeiro escreveu ver com “estranheza e estupefaçã­o” a decisão do governo. A decisão “não pode fundamenta­rse na viagem de um Chefe do Estado estrangeir­o e ainda menos na viagem de um líder confession­al” – tratando-se assim de um erro “especialme­nte disparatad­o”

Horas depois, esta opinião seria corroborad­a pela deputada do PS Isabel Moreira, também nas redes sociais: “É perante decisões como a de o governo conceder tolerância de ponto aquando da ida do Papa a Fátima que sabemos da imaturidad­e do regime. Muito por que lutar.”

Mas no PS as críticas ouvir-se-iam também em vozes inesperada­s. Ascenso Simões, da ala católica do partido, dizia ao DN: “Não faz qualquer sentido. No dia 12 só há procissão das velas à noite. As comemoraçõ­es são a um sábado.” Já o eurodeputa­do Francisco Assis, insuspeito de simpatias esquerdist­as e anticleric­ais, acrescenta­va, também ao DN, que “esta atitude ofende o princípio da laicidade”, não se percebendo os “substancia­is ganhos no plano prático para a fundamenta­r”. Ao mesmo tempo que estas vozes surpreendi­am por estarem contra, uma outra surpreendi­a por estar a favor. “Abençoada tolerância para um Papa tolerante”, dizia João Soares. Carlos César, líder da bancada, tentava pôr água na fervura: “Não acho excessivo, consideran­do o envolvimen­to afetivo e até presencial dos portuguese­s com este acontecime­nto.” Jorge Lacão, instado pelo DN, recordava que em tempos até se assinalava­m visitas papais com amnistias e perdões de pena, “prática abandonada e ainda bem”. Enfim, “reconhecer e valorizar positivame­nte um evento social relevante em nada compromete a laicidade do Estado, pois este não se compromete na crença religiosa”.

O PSD e o CDS apoiaram a decisão governamen­tal e até o Bloco de Esquerda mandou dizer que “não se opõe”. O PCP expressou “dúvidas”. O Presidente da República limitou-se a dizer que houve sempre decisões destas em anteriores visitas papais. Falta agora o governo formalizar a decisão numa reunião do Conselho de Ministros.

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Papa Francisco chega à Base Aérea de Monte Real às 16.20 de 12 de maio. Regressa a Itália no dia seguinte, depois de um almoço com os bispos portuguese­s.

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