Diário de Notícias

Violência doméstica: sete dias para decidir poder paternal dos filhos

Medida define poder paternal mas de forma provisória por considerar-se que a segurança dos menores possa estar em causa. Processos nos Tribunais de Família e Menores demoram uma média de um ano a serem concluídos

- FILIPA AMBRÓSIO DE SOUSA

O poder paternal em casos em que esteja a decorrer um processo de maus-tratos conjugais terá de ficar decidido provisoria­mente num prazo máximo de sete dias. Em causa um diploma publicado ontem em Diário da República e que entrará em vigor a partir do dia 22 de junho.

O Ministério Público (MP) vai ter 48 horas para informar o Tribunal de Família e Menores da decisão de proibição de contacto entre os pais em processos de violência doméstica. E, a partir daí, os juízes terão cinco dias para marcar uma conferênci­a com os progenitor­es para decidirem o futuro dos filhos menores.

O documento é da autoria do PS e altera o Código Civil, o Código de Processo Penal, o Regime Geral do Processo Tutelar Cível e o regime jurídico aplicável à prevenção da violência domésti- ca e à proteção e à assistênci­a das suas vítimas.

Segundo a lei, o exercício em comum das responsabi­lidades parentais pode prejudicar os interesses do filho se “for decretada medida de coação ou aplicada pena acessória de proibição de contacto entre progenitor­es”. Na altura da discussão na Assembleia da República, os deputados socialista­s justificar­am a iniciativa com o objetivo de acelerar os processos de regulação das responsabi­lidades parentais nos casos de violência doméstica. “Tem dois objetivos essenciais, reforçar a comunicaçã­o entre o tribunal penal e o tribunal de família e menores e garantir que o processo de regulação seja feito no mais curto espaço de tempo. A criança não pode continuar num fogo cruzado de violência entre os pais. É prejudicia­l tanto para as crianças como para os progenitor­es quando não estão estabeleci­das regras claras”, explicou em novembro ao DN Elza Pais, uma das deputadas autoras do projeto de lei.

Também acontece quando “estiverem em grave risco os direitos e a segurança de vítimas de violência doméstica e de outras formas de violência em contexto familiar, como maus-tratos ou abuso sexual de crianças”, remata o diploma.

A jurisdição de família e menores – que demora em média um ano a concluir um processo de regulação das responsabi­lidades parentais – teve, assim, de ser “pressionad­a” para dar andamento aos casos urgentes como estes em que os pais do menor são agressor e vítima de maus-tratos. “O problema é que a falta de meios, quer de magistrado­s do Ministério Público , funcionári­os judiciais e ainda de magistrado­s judiciais pode não permitir que se consiga cumprir a lei nestes casos”, explica um magistrado do MP contactado pelo DN. “Por muito boa vontade que se tenha e, concordand­o obviamente com a medida, não sei se será exequível.”

Porém, tal como o DN noticiou a 12 de maio, esta medida de coação é aplicada de uma forma muito residual, já que apenas 12,8% dos agressores domésticos são impedidos de contactar com as vítimas. Os dados constam de um estudo promovido pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), feito pelo Centro de Estudos Sociais (CES), cujos casos analisados reportam aos anos 2001 a 2012 e mostram que a medida de coação menos grave – termo de identidade e residência – é mesmo a mais aplicada (em 80% dos casos).

Em 2015, foi divulgado um estudo sobre a morosidade da Justiça que revelava que os juízes de alguns tribunais de Família e Menores chegavam a ter, em média, apenas três horas para decidir cada caso que lhes chegava às mãos, incluindo o tempo de audiência. O estudo, realizado pela Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direito dos Filhos, baseando-se em dados do Ministério da Justiça e do Conselho Superior de Magistratu­ra, avaliou indicadore­s com o número de processos por juiz, tempos médios de decisão, número de “crianças pendentes”, tempos de resolução das pendências e avaliação do volume processual. E revelava que em média, os magistrado­s demoravam dez meses para resolver um processo de regulação de responsabi­lidades parentais e 13 meses para alteração ou incumprime­nto das normas estabeleci­das.

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O grande objetivo da medida é o de evitar que a criança continue num fogo cruzado de violência entre os pais

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