Há médicos internos a chumbar por não terem cirurgias suficientes
Presidente da secção sul da Ordem dos Médicos reuniu com coordenadores do internato médico dos hospitais
FORMAÇÃO Há médicos internos em Portugal que chumbam na especialidade por não conseguirem realizar o número mínimo de cirurgias exigidas na formação, alerta a Ordem dos Médicos, avisando que em muitas especialidades foi ultrapassada “a linha vermelha que defende a qualidade”.
A Ordem dos Médicos decidiu reunir-se, pela primeira vez, com todos os diretores do internato médico do país. O Conselho Regional do Sul da Ordem esteve hoje com todos os diretores de internato da região sul para debater aspetos da formação médica a nível hospitalar, da medicina geral e familiar e de saúde pública.
“Chegámos à conclusão, quer a Ordem quer os diretores do internato médico, de que em muitas especialidades já cruzámos a linha vermelha que defende a qualidade. Significa que estamos muitas vezes, em determinados centros, a aceitar formação onde ela não é prestada na melhor qualidade. Queríamos perceber se os vários hospitais têm essa perceção. Verificámos que atingimos o de capacidades formativas já há algum tempo e que estamos nalgumas áreas a ultrapassá-las”, afirmou à agência Lusa o presidente do Conselho Regional do Sul da Ordem, Alexandre Valentim Lourenço.
Segundo o responsável, as áreas em que o problema é mais evidente são as da anestesiologia e cirurgia. “A falta de anestesia, de blocos operatórios e de capacidades cirúrgicas diminuem capacidades de formação. Já há internos a chumbarem porque não atingiram números mínimos de formação em várias especialidades cirúrgicas”, disse Alexandre Valentim Lourenço, adiantando que o mesmo se verifica tanto em hospitais periféricos como nos centrais. “Cada vez há mais trabalho mas menos capacidade para o fazer”, acrescentou.
Os internos têm de cumprir um determinado número de cirurgias para terminar a especialidade. Se não o alcançam é considerado que não têm a experiência necessária para exercer de uma forma autónoma como especialista. A Ordem dos Médicos insiste que a formação é essencial para aceder, no futuro, a mais e melhores cuidados.
A saída do SNS de especialistas intermédios e dos mais graduados – para o privado ou para o estrangeiro – cria dificuldades adicionais à formação: “Se temos menos professores, teremos menos alunos.” A Ordem afirma que pretende “intensificar o processo ativo de acompanhamento de todas as unidades de saúde” para evitar que “a qualidade da formação médica possa ser posta em causa”.
No início do ano, a Ordem publicou um regulamento impondo limites aos hospitais no recurso a internos para as urgências (não podem fazer mais de três fins de semana a cada oito, nem podem fazer mais de 50% das urgências em horário noturno) e proibiu que fossem obrigados a fazer horas extra dois meses antes do exame de fim de especialidade. O então bastonário José Manuel Silva admitiu que os diretores clínicos que não cumprissem as regras poderiam ser alvo de processos disciplinares. “Elaborámos um regulamento que proíbe os internos de fazerem mais de 58 horas de trabalho por semana e há hospitais em que isso criou dificuldades”, disse na última entrevista que deu ao DN.