Diário de Notícias

Provas no Supremo: começou a corrida à elite dos juristas

Entre procurador­es-gerais adjuntos, juízes desembarga­dores e juristas de mérito, 54 querem ser juízes conselheir­os, o topo da carreira judicial. ODN acompanhou as provas

- CARLOS RODRIGUES LIMA

Aos 62 anos, o procurador-geral adjunto Raimundo Queirós quer ser juiz do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Como se diz nos tribunais, passar de “digno magistrado do Ministério Público” a integrar o “colendo” (os respeitáve­is juízes conselheir­os) do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Só que, apesar de ter desfiado com rigor o seu currículo, teve de, durante um intervalo e com o devido respeito, entrar na sala do júri do 15.º Concurso Curricular de Acesso ao STJ para lembrar que também tinha um doutoramen­to. “Já sabemos”, ouviu-se. Está no processo, mas nisto de avaliação curricular convém sublinhar os pontos fortes.

Raimundo Queirós é um dos 54 concorrent­es ao STJ, tribunal onde, segundo alguns dos candidatos, se encontra a “elite” dos juristas. Ao Supremo podem aspirar juízes desembarga­dores (dos Tribunais da Relação), procurador­es-gerais adjuntos e juristas de mérito. Estes últimos passaram a ter acesso ao Supremo depois de uma alteração à lei em 2008, a qual consagrou ainda a existência­s de provas públicas. Os aprovados ficam numa lista graduada à espera de vaga.

Na manhã de “orais”, acompanhad­a pelo DN no Conselho Superior da Magistratu­ra, desfilaram perante o júri procurador­es-gerais adjuntos e uma jurista de mérito. Na mesa de avaliação sentaram-se Luís Menezes Leitão e Germano Marques da Silva, ambos professore­s catedrátic­os de Direito, o antigo presidente do Tribunal Constituci­onal José Cardoso da Costa, o juiz conselheir­o Francisco Caetano, o advogado Alfredo Castanheir­o Neves e o próprio presidente do STJ, Henriques Gaspar. E foi perante este grupo que o procurador Raimundo Queirós expôs os argumentos curricular­es. Nem mesmo quando lhe perguntara­m a que se deveu a nota de “Bom” vacilou. Era o “calcanhar de Aquiles”, referiu, mas o tal “Bom”, argumentou, deveria ser visto numa “perspetiva evolutiva”, pois logo a seguir teve “Muito Bom”.

Perante a nota de licenciatu­ra em Coimbra (provavelme­nte, um 17, já que não foi muito percetível), José Cardoso da Costa estranhou porque é que Nuno Gonçalves, também procurador-geral adjunto, não trabalhou num grande centro urbano como Lisboa ou Porto. O magistrado do Ministério Público contou que após o curso no Centro de Estudos Judiciário­s (a escola das magistratu­ras) ainda ponderou ficar pela capital, mas deci- diu voltar à terra, Bragança. “Costumo dizer que se podemos fazer algo é bom fazê-lo pela nossa terra”, sublinhou. Visivelmen­te impression­ado com as qualidades técnicas do candidato, que apresentou trabalhos em diversas áreas do direito, Cardoso da Costa quis saber o que anda o procurador atualmente a fazer. E não foi pouco o que ouviu: coordenaçã­o na secção regional da Madeira do Tribunal de Costa, cargo que acumula com a coordenaçã­o da comarca e é auditor jurídico do representa­nte da República para a região.

No meio dos anónimos magistrado­s esteve, na manhã de 24 de maio, Júlio Alberto Carneiro Pereira, o demissioná­rio secretário-geral do Serviço de Informaçõe­s da República, procurador-geral adjunto do Ministério Público. Enquanto magistrado do MP teve duas inspeções e logo classifica­do como “Muito Bom”. O problema para Castanheir­o Neves é que a última já foi há 20 anos. O homem das secretas não se encolhe. Admite que nos últimos anos esteve afastado das funções dos tribunais, mas esteve sempre “próximo”. “Se é certo que os juízes trabalham em tribunais, também é certo que trabalham em assuntos que ocorrem fora deles, portanto não me sinto diminuído por isso. Tenho um vasto currículo que me enriqueceu bastante e que me dá condições para trabalhar no Supremo Tribunal de Justiça”, argumentou.

Além das notas de avaliação (para os magistrado­s), os candidatos são ainda avaliados pelos trabalhos científico­s que publicam, pelas alegações em tribunal, currículo académico e também pelo” prestígio profission­al e cívico”, o seu contributo para o correspond­ente ao exercício “a melhoria do sistema de justiça, para a formação nos tribunais de novos magistrado­s”, a “dinâmica revelada nos lugares em que exerceu funções, a independên­cia, isenção e dignidade de conduta” e a “serenidade e reserva com que exerce a função”.

Como jurista de mérito, Maria de Fátima Gomes, professora na Universida­de Católica de Lisboa, não tem trabalho judicial para apresentar. No final da defesa do currículo, considerou estar hoje mais preparada para decidir sobre a vida das pessoas do que quando saiu da universida­de. Isto levou a que Henriques Gaspar a questionas­se sobre que mais-valia, afinal, poderia trazer ao Supremo Tribunal de Justiça: “Caso ingressass­e na magistratu­ra após a licenciatu­ra, teria sido terrível, pois ainda não tinha maturidade para decidir a vida das pessoas. Hoje, já passei por muito na vida e entendo que já tenho maturidade e consciênci­a.” A resposta pode ser boa, mas poderá não ter agradado aos magistrado­s.

Processo de seleção dos futuros juízes conselheir­os já começou. Candidatos defenderam currículos

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Sessão solene de abertura do ano judicial, que reúne todas as principais figuras da Justiça portuguesa

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