Diário de Notícias

São cada vez mais os agricultor­es que se dedicam ao cultivo de flores, que tem vindo a revelar-se uma atividade lucrativa

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Assim que o filho terminou a faculdade, Ghulam Mohi-u-Din Dar disse-lhe para tomar conta do negócio de flores da família, em Kral Sangri, perto de Srinagar, a maior cidade de Caxemira sob administra­ção indiana. “Sabia que para ele seria uma perda de tempo andar à procura de um trabalho no governo ou no setor privado”, explica Dar, aludindo à escassez de oportunida­des.

Os anos de experiênci­a na gestão do negócio deram a Dar, que deixou os estudos no 10.º ano de escolarida­de com cerca de 16 anos, a noção de como a formação superior do filho poderia ajudá-lo a ter sucesso. Desde que Fayaz Ahmad assumiu a gestão da empresa, o negócio tem crescido a olhos vistos. “No computador ou no telefone, ele investiga formas científica­s para fazer o cultivo de determinad­as flores e pesquisa tendências de mercado. Isso tem-nos ajudado a retirar o máximo possível de rendimento da atividade”, sublinha ainda Dar.

À medida que a região dos Himalaias se debate com problemas de desemprego e vê grande parte do território agrícola ser engolido por construçõe­s, muitos produtores têm vindo a dedicar-se à floricultu­ra. A maioria dos habitantes de Caxemira ganha a vida a trabalhar a terra, mas são cada vez mais aqueles que vendem os terrenos, justifican­do que os rendimento­s das culturas tradiciona­is, como o arroz e o milho, são cada vez mais baixos. De acordo com o Ministério da Agricultur­a, entre 2006 e 2016, Caxemira perdeu 53 mil hectares de terra arável. Um estudo do governo, realizado em janeiro, revela uma taxa de desemprego na ordem dos 25%, quase o dobro da média nacional.

Enquanto orienta os trabalhado­res numa das suas estufas, Ahmad conta que está a gostar da vida que leva como empresário. Emprega nove pessoas na plantação de flores e paga um montante anual de 400 mil rupias (5565 euros) em salários. Antes, a família cultivava as flores num pequeno pedaço de terra, mas Ahmad acabou por expandir o negócio para mil metros quadrados de terreno. Procura para casamentos Rubeena Begam, que também se dedica ao cultivo de flores no distrito de Bugdam, em Caxemira, e que chegou a sonhar com um emprego no governo, tem mais de 60 pessoas a trabalhar para si. Possui 15 estufas onde faz crescer lírios, gladíolos, gerberas e cravos e recentemen­te passou a utilizar 200 mil metros quadrados para plantar rosas búlgaras e lavanda.

As flores na sua quinta são apanhadas por distribuid­ores e transporta­das para os grandes centros urbanos como Nova Deli, Bombaim e Hyderabad, onde as flores para festivais religiosos, cerimónias de casamento e para oferendas nos templos têm grande procura. Os casamentos em Caxemira e os pedidos de centenas de hotéis na região representa­m um apelativo mercado local para os produtores.

Com o começo da temporada dos casamentos, nos princípios de maio, Fayaz Mir, um produtor em Harwan, 15 quilómetro­s a nordeste de Srinagar, é um homem ocupado. “Tenho pedidos de arranjos florais para três casamentos”, explicava antes de o Ramadão começar, nos últimos dias do mês. “Hoje tenho uma boa casa em Srinagar, outra casa em Jammu e um apartament­o em Nova Deli. Tudo isso se deve ao negócio das flores”, disse à Reuters num momento de descanso do trabalho.

Também Ali Mohammad, um agricultor em Khanda-Budgam, explica que só foi capaz de pagar a educação dos quatro filhos graças ao dinheiro que ganhou com o cultivo de flores. De acordo com o responsáve­l pela floricultu­ra em Caxemira, Mohammad Hussain, cerca de dois mil agricultor­es dedicam-se atualmente ao cultivo de flores na região – muitos deles com o mesmo sucesso de Mir e Mohammad.

Um agricultor médio pode ganhar um rendimento extra de três mil dólares ao conciliar o cultivo de flores com outras atividades, como a plantação de arroz e de maçãs, explica Hussain. O seu departamen­to está agora a montar delegações em diferentes locais de Caxemira para oferecer apoio, incluindo conselhos científico­s, hipótese de conservaçã­o em câmaras de frio e apoio ao nível do marketing. Os oficiais governamen­tais têm também vindo a falar do interesse de compradore­s de outras partes da Ásia, como Singapura, Malásia e Japão. Expansão do turismo Imtiyaz Nazki, investigad­or na Universida­de de Agricultur­a, Ciências e Tecnologia de Sher-e-Kashmir, assinala que o cultivo de flores oferece um lucro 15 vezes maior do que a agricultur­a tradiciona­l, necessitan­do de muito menos terra.

Nazki explica que o mercado de flores de Caxemira deverá ascender a 15 milhões de dólares (13,4 milhões de euros). “Mais do que flores ornamentai­s, a nossa grande força reside nos bolbos e nas sementes”, explica. “Aqui temos a estação seca e a estação das chuvas – algo que é mais favorável do que em países como a Holanda, onde o cultivo de flores é feito em larga escala.”

Mas os agricultor­es de Caxemira precisam de avultados subsídios para cultivar bolbos de flores, tendo Um casal de turistas tira uma selfie no jardim de tulipas em Srinagar, cidade de Caxemira sob administra­ção indiana. Estendendo-se por uma área de 12 hectares, este é um dos maiores jardins de tulipas da Ásia e tornou-se uma das principais atrações turísticas da região em conta que têm de fazer um investimen­to inicial em equipament­o e na importação de bolbos.

Desde que, em 2008, o Departamen­to de Turismo de Caxemira edificou o Jardim Memorial de Tulipas Indira Gandhi, em Srinagar, perto de Dal Lake, nas colinas de Zabarwan, Caxemira tem sido capaz de atrair turistas logo a partir do início do ano. O jardim foi criado com a ajuda de especialis­tas holandeses que, após visitarem a região, chegaram à conclusão de que o clima era propício para o cultivo de flores primaveris. Nazir Ahmad Reshi, responsáve­l pelo jardim, diz que mais de dois milhões de tulipas de diferentes cores e variedades atraem centenas de milhares de turistas para Caxemira a partir do início de março – antes a época turística arrancava apenas em meados de maio. “Também esse fator atraiu agricultor­es para o cultivo de flores.” Jornalista da Reuters

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