SEF não é burocracia, é segurança
Nas vésperas de o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) assinalar o seu dia, vale a pena recordar – pelas piores razões – o discurso da ministra da Administração Interna de 26 de maio, no qual Constança Urbano de Sousa disse que a atividade principal do SEF é “essencialmente burocrática” e relacionada com o “controlo documental”.
Ora o SEF é um órgão de polícia criminal com competências específicas na investigação de crimes complexos, como o tráfico de seres humanos e o auxílio à imigração ilegal, crimes quase sempre perpetrados de forma organizada e transnacional, e conexos como o da falsificação e contrafação de documentos ou o casamento de conveniência. Estes crimes estão quase sempre associados a outros, como o branqueamento de capitais, e são instrumentais relativamente à atividade terrorista.
Trata-se de investigações complexas e relevantes para a segurança nacional e o espaço comum de liberdade, segurança e justiça, a União Europeia. A título de exemplo, recorde-se que dois suspeitos de terrorismo detidos em França foram referenciados pelo SEF.
O SEF lidera na Europol o dossiê do casamento de conveniência. Integra o Sistema de Seguran- ça Interna e participa – incluindo com representantes permanentes – em instâncias nacionais e internacionais que tratam de criminalidade grave e organizada. Tem representantes e oficiais de ligação em embaixadas portuguesas, Europol, Frontex e outras agências, Nações Unidas, Comissão Europeia e, internamente, no Ministério Público. É exatamente por exercer estas competências que o SEF adquiriu ao longo das três décadas da sua existência um acervo, um know-how e uma eficiência que fazem que seja constantemente solicitado a colaborar com outras polícias, nacionais e estrangeiras.
Por isso, as declarações da ministra só podem nascer de um profundo desconhecimento do serviço que tutela. O sindicato que representa os inspetores do SEF tem alertado para a contínua diminuição de recursos, numa relação inversamente proporcional ao aumento das responsabilidades e dos riscos. Há departamentos à beira do colapso e inspetores que, além das funções operacionais, acumulam funções administrativas por não haver funcionários para tal.
O SEF tem um departamento de investigação criminal em todas as suas direções regionais e uma direção central que deveria dedicar-se à investigação de casos mais complexos, redes organizadas e crimes transnacionais. Contudo, a falta de pessoal determinou que a direção central tenha de assumir tarefas regionais, ao mesmo tempo que o seu quadro de inspetores diminuiu 50% – apesar do considerável aumento no volume de processos complexos que lhe são remetidos para investigação pelo Ministério Público. O parque informático é obsoleto e insuficiente, o equipamento necessário à recolha de indícios de prova está desatualizado.
Os 13 inspetores dedicados exclusivamente à investigação criminal são constantemente requisitados para colaborar com outras unidades orgânicas do SEF, especialmente em operações e fiscalizações, mas também indigitados para reforçar os aeroportos de Lisboa e Faro nos meses de junho a setembro.
É este o estado atual do SEF: inspetores em permanente exercício, incluindo sábados, domingos e feriados, com a investigação criminal próxima do esgotamento.
Ao tentar esvaziar a carreira de investigação e fiscalização do SEF das suas competências, a ministra da Administração Interna expressou a intenção clara de desinvestir na segurança nacional e europeia. É preciso combatê-la com firmeza.