Diário de Notícias

PARTIDOS APOIAM COMISSÃO DE PERITOS PROPOSTA PELO PSD REPORTAGEM DE CÉU NEVES NA TERRA QUEIMADA

IGAI ainda não está no terreno mas partidos já concordam que técnicos independen­tes apurem as causas da tragédia

- CARLOS RODRIGUES LIMA e VALENTINA MARCELINO

Todos os passos dos bombeiros no combate aos incêndios que deflagrara­m no sábado em Pedrógão Grande estão registados numa espécie de caixa negra, semelhante à dos aviões, na Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC). Segundo informaçõe­s recolhidas pelo DN, o sistema regista a data e hora da ocorrência, assim como as medidas tomadas para reagir à mesma. Também o sistema de comunicaçõ­es SIRESP contém a opção de gravar todas as comunicaçõ­es, porém até à hora de fecho desta edição o DN não conseguiu confirmar se tal se encontra ativado.

A análise destes dois elementos pode ser crucial numa eventual investigaç­ão, seja ela parlamenta­r, por uma comissão independen­te como a proposta pelo PSD e com abertura de outros partidos, ou até mesmo judicial, à resposta dada pelas autoridade­s ao incêndio de Pedrógão – que matou pelo menos 64 pessoas e feriu 204 – e às decisões tomadas pela cadeia de comando para, por exemplo, fechar a fatídica estrada, onde morreram 47 pessoas. Toda a informação que circulou entre bombeiros e GNR está depositada no tal sistema informátic­o, o qual pode fornecer uma radiografi­a do que se passou em matéria de coordenaçã­o. Outro elemento importante prende-se com as comunicaçõ­es feitas através do sistema SIRESP. Se as comunicaçõ­es entre os vários intervenie­ntes ficaram gravadas, tal poderá fornecer informação sobre a coordenaçã­o do dispositiv­o no terreno, a avaliação feita, assim como eventuais ordens emanadas do comando operaciona­l para os elementos no terreno.

Neste momento está a decorrer apenas um inquérito aberto pelo Ministério Público (MP) para “averiguar as causas e consequênc­ias do incêndio em Pedrógão Grande”, confirmou ao DN fonte oficial da Procurador­ia-Geral da República. Questionad­a sobre se esse inquérito também podia estender-se a questões de coordenaçã­o e gestão de meios no combate, não respondeu. Um ex-inspetor da PJ perito na investigaç­ão de fogos, que pediu anonimato, diz que “apenas num caso em que houvesse evidências claras de negligênci­a grosseira na atuação dos comandos” a investigaç­ão criminal poderia ter esse alcance. Não há registo de situações dessas no “histórico” que tem nas investigaç­ões da Judiciária. De qualquer forma, as causas deste incêndio foram identifica­das menos de 24 horas depois, quando o próprio diretor nacional da PJ revelou que eram “naturais”, provenient­es da trovoada seca. Tese, entretanto contestada pelo presidente da Liga de Bombeiros, Jaime Marta Soares, que no Fórum TSF disse suspeitar de “mão criminosa”, com o argumento de que a tempestade só chegou duas horas depois de o fogo ter começado. O DN tentou confirmar com o IPMA a hora certa da trovoada, face à hora registada do alerta do ignição, mas não obteve resposta.

Outra entidade com capacidade para investigar esta situação é a InspeçãoGe­ral da Administra­ção Interna (IGAI), mas terá de ser a ministra Constança Urbano de Sousa a determinar a abertura do processo. Ontem, em entrevista à RTP, a governante esclareceu que este inquérito ainda não avançou (ver peça secundária) por não estar concluída a “linha de tempo” de todos os acontecime­ntos, pois ainda está em curso a operação de combate aos incêndios iniciada no sábado. A IGAI tem neste momento a decorrer um inquérito à coordenaçã­o da ANPC nos incêndios de São Pedro do Sul, em 2016.

A exigência de uma investigaç­ão profunda ao que se passou em Pedrógão Grande tem estado na ordem do dia. O ex-presidente do PSD e comentador político Luís Marques Mendes defende que já deveria ter sido constituíd­a uma comissão ad hoc, dirigida por um magistrado e com três ou quatro técnicos da área da proteção civil, meteorolog­ia e segurança. Mas diz que não ficaria “chocado” caso a investigaç­ão fosse feita por IGAI, porque é uma entidade dependente do Estado, mas com garantias de independên­cia.

“Concordo com o primeiro-ministro que as conclusões devem ser só no final, mas a experiênci­a mostra que para tirar conclusões no final é preciso ter um inquérito global ordenado e uma comissão de investigaç­ão escolhida”, assinala. “A pergunta que falta fazer ao governo é: para ter conclusões é preciso um inquérito e onde é que ele está?”, interroga, acrescenta­ndo: “Se eu fosse membro do governo propunha já a aprovação da comissão neste Conselho de Ministros”. O problema do timing é muito importante para Marques Mendes: “Dentro de dias não haverá condições para fazer uma investigaç­ão à séria. Por isso a investigaç­ão tem de ser feita em paralelo com a proteção e a salvação das pessoas. Cada dia que passa é cada vez mais preocupant­e”, conclui.

No Parlamento, foi o PSD a protagoniz­ar a iniciativa de pedir que seja constituíd­a uma comissão técnica de peritos independen­tes que possa responder às perguntas e dúvidas. Todos os partidos estão disponívei­s, à exceção do PCP, que rejeita “repetir comissões e relatórios”. Com PAULA SÁ e MIGUEL MARUJO

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