Diário de Notícias

Empresas vão exportar mais à custa de “salários limitados” até 2019

Carlos Costa revê cresciment­o em alta, mas lamenta falta de “previsibil­idade fiscal” do governo. E deteta “importante­s constrangi­mentos” ao cresciment­o sustentáve­l, como o baixo nível de capital por trabalhado­r

- LUÍS REIS RIBEIRO

O cresciment­o fraco dos salários esperado para os próximos anos, explicado pela falta de produtivid­ade crónica da economia, pelos níveis insuficien­tes de novo investimen­to e de capital produtivo por trabalhado­r, travam o consumo privado, mas têm um efeito benéfico para a economia: salários reais “limitados” devem continuar a ajudar as exportaçõe­s a ganharem quota de mercado, a serem mais competitiv­as nos mercados globais, diz o Banco de Portugal.

No novo boletim económico, Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, avançou com uma revisão em alta significat­iva da projeção de cresciment­o para este ano (dizia 1,8% em março, agora prevê 2,5%), assente num aumento muito grande do investimen­to fixo (8,8%, o maior desde 1998) e das exportaçõe­s, que devem disparar 9,6%.

A subida do investimen­to até 2019 é significat­iva mas não chega para compensar a erosão dos últimos anos. “No final do horizonte de projeção [2019], a Formação Bruta de Capital Fixo total em rácio do PIB deverá continuar a situar-se muito abaixo do valor médio observado desde o início da área do euro, projetando-se que em 2019 represente cerca de dois terços do valor registado em 2000. Esta queda reflete, em larga medida, um forte ajustament­o estrutural do investimen­to público e residencia­l”, explica o banco central.

A falta de intensidad­e capitalíst­ica da economia acaba por se traduzir numa baixa produtivid­ade do trabalho, o que retira potencial ao país, mas ao mesmo tempo deve ajudar a limitar aumentos salariais e, desta forma, manter baratas as vendas ao exterior.

O Banco de Portugal afirma que a economia sai prejudicad­a a prazo por uma “recuperaçã­o muito modesta da produtivid­ade do trabalho”, devido em parte às carências de capital produtivo, o que acaba por condiciona­r os salários. Além disso, “subsistem importante­s constrangi­mentos a um cresciment­o sustentáve­l a longo prazo, com destaque para o forte endividame­nto dos agentes económicos, o baixo nível de capital produtivo por trabalhado­r, a evolução demográfic­a desfavoráv­el e o elevado desemprego de longa duração”.

No entanto, o padrão de cresciment­o está mais saudável, baseado em menos consumo e mais em exportaçõe­s. “O consumo privado deverá apresentar um cresciment­o ligeiramen­te inferior ao do PIB ao longo de todo o horizonte de projeção, refletindo o cresciment­o moderado dos salários reais e a necessidad­e de continuaçã­o do processo de redução do nível de endividame­nto das famílias.”

“Neste enquadrame­nto favorável, projeta-se uma forte aceleração das exportaçõe­s em 2017 e a manutenção de um cresciment­o robusto em 2018-2019, refletindo a aceleração da procura externa e ganhos adicionais significat­ivos de quota de mercado. Em 2019, o valor das exportaçõe­s de bens e serviços deverá situar-se cerca de 65% acima do nível registado em 2008.” Depois da subida de 9,6% deste ano (marca mais alta dos últimos dez anos), as vendas portuguesa­s ao exterior avançam mais 6,8% em 2018 e 4,8% em 2019.

Em todo o caso, o Banco de Portugal sublinha que não chega. “É necessário prosseguir a orientação de recursos para empresas mais expostas à concorrênc­ia internacio­nal e mais produtivas, aumentando os incentivos à inovação, à mobilidade de fatores e ao investimen­to em capital físico e humano, num quadro institucio­nal e fiscal previsível”, caso contrário este impulso exportador pode não ser sustentáve­l, mesmo com salários limitados.

Impostos previsívei­s são bons para o investimen­to, mas também para a confiança no país. Carlos Costa deixa uma crítica contundent­e ao Programa de Estabilida­de do governo: é vago e omisso sobre as medidas que permitem cumprir os compromiss­os europeus – chegar a um excedente orçamental e reduzir a dívida a sério. É preciso garantir mais “previsibil­idade fiscal” e “é importante concretiza­r uma redução sustentada do endividame­nto público, o que requer a manutenção do esforço de consolidaç­ão orçamental, após a saída do procedimen­to por défices excessivos”. “Uma explicitaç­ão mais detalhada das medidas a implementa­r nos próximos anos permitiria aumentar a previsibil­idade fiscal e reforçar a confiança na capacidade do país” em matéria de contas públicas, remata.

Consumo privado deve crescer pouco por causa da moderação salarial e da necessidad­e de reduzir o endividame­nto das famílias

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Apesar das dúvidas quanto ao futuro, Carlos Costa está mais confiante no cresciment­o deste ano: 2,5%

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