Fim de transmissão
Boné enterrado na cabeça, braços caídos ao largo do corpo, olhar perdido mas amigável. Gibbs Dike está parado no meio de um corredor, olhando para os adolescentes que serpenteiam o centro de convenções de Anaheim, buscando algo de interessante para passar o tempo. Veio do Arizona, explica-me, para acompanhar o filho de 15 anos à maior convenção de vídeo online do mundo, aVidCon, nesta localidade que é conhecida por albergar a Disneyland original.
“Ele é youtuber há dois anos”, conta. Mas Gibbs não sabe bem que tipo de vídeos o adolescente faz; está a passar por uma série de mudanças que o tornam defensivo. “Não comunica lá muito bem comigo”, confidencia, encolhendo os ombros e piscando os olhos muito azuis. Gibbs tem seis filhos e este é o mais novo. Praticamente não vê televisão e assim que chegaram à convenção desapareceu com o grupo de amigos. O pai por ali anda, a iniciar conversas casuais, a comer barras de Snickers que estão a ser oferecidas, e a descobrir um mundo que desconhecia.
A audiência é extremamente jovem. As miúdas aparentam 13, 14, 15 anos, mas andam todas com maquilhagem pesada, impecável, certa- mente inspirada nos tutoriais de beleza que tanto sucesso fazem no YouTube. Os miúdos têm cortes de cabelo à Justin Bieber, andam de câmaras na mão e vestem T-shirts com mensagens indecifráveis para quem não está por dentro da coisa. Não sei em que letra vamos em termos de geração, mas isto é mais que millennials com esteroides. É uma subcultura com códigos e linguagem própria, que gera superestrelas de nível galáctico. Os seguranças iam perdendo a cabeça com os youtubers famosos que cometeram a asneira de entrar no hall da convenção pela porta da frente: multidões de fãs aos gritos seguiam-nos como um enxame de abelhas, compacto e determinado, levando tudo à frente. Aqui e ali, pais e mães passeavam de mãos nos bolsos, perguntando ocasionalmente “quem é aquele?” “Não sei.”
Estes adolescentes praticamente deixaram de ver televisão convencional; isso é para velhos. As marcas sabem que é no vídeo online que têm a melhor chance de chegar a este grupo etário, e estavam lá todas – desde chocolates Dove e M&M’s à Amazon, Nyx, drones DJI, Calvin Klein e Disney.
O YouTube é o rei desta selva. Na habitual apresentação da empresa, que pertence à Google, a CEO Susan Wojcicki anunciou que o site de partilha de vídeos tem agora 1,5 mil milhões de utilizadores mensais, o que o torna a mais importante plataforma do mercado. É algo que Mark Zuckerberg quer mudar, com os investimentos brutais que está a fazer para empurrar a miudagem para o Facebook e o Instagram. Já não é apenas o Facebook Live nem os vídeos do “Insta”; Zuckerberg vai investir para criar séries originais no Facebook, indo buscar “influenciadores” que ganharam dimensão no YouTube. Do outro lado da barricada, o rival Snapchat continua a sua ascensão e anunciou na semana passada que a Time Warner irá investir cem milhões de dólares em anúncios e conteúdos na app Snap.
Para lá desta competição, que se passa sobretudo nos dispositivos móveis, o notável é pensar no que isto significa para o futuro da televisão. Não há muitas dúvidas de que esta geração, que está a crescer liberta do hábito de se sentar no sofá a papar Morangos e concursos, vai forçar mudanças profundas em toda a estrutura da indústria. Quando eles forem a maior fatia de consumidores, quem é que vai assinar pacotes de TV com 200 canais e assistir a programas com dez intervalos de publicidade? Não foi por acaso que a NBC teve um megastand na VidCon a promover alguns dos seus shows mais populares, como o TheVoice eo The Tonight Show with Jimmy Fallon. Nos painéis da VidCon, já não se perguntou se a televisão do futuro vai passar para estas plataformas na internet, mas quando. O serviço YouTube TV, que tem apenas alguns meses, já oferece quase 50 canais e está a expandir-se rapidamente nos Estados Unidos, custando 35 dólares por mês para seis contas de YouTube e armazenamento ilimitado para gravação de programas.
Parece um futuro distante, dado que o grosso do mercado ainda subscreve televisão paga tradicional, mas a única forma de sobreviver aqui é olhar para o futuro. E estudo atrás de estudo aponta para a mesma conclusão: a televisão, como a conhecemos, terá em breve os dias contados.
Não há muitas dúvidas de que esta geração, que está a crescer liberta do hábito de se sentar no sofá a papar concursos, vai forçar mudanças profundas em toda a estrutura da indústria