Diário de Notícias

GNR e Polícia Marítima salvaram 1500 migrantes em seis meses

Grécia. Na ilha de Kastellori­zo estão nove militares da GNR que até já resgataram uma grávida, síria, que deu à luz uma hora depois

- RUTE COELHO

Mais do que números, são vidas, encolhidas às dezenas em botes de borracha sobrelotad­os, à deriva nas águas do mar Egeu. Em cerca de seis meses, a Guarda Nacional Republican­a (GNR) e a Polícia Marítima (PM) resgataram perto de 1500 migrantes ao largo das ilhas gregas de Samos e Kastellori­zo (a GNR) e Lesbos (a PM), no âmbito da missão na Frontex – Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira. Só a Guarda foi responsáve­l por 939 salvamento­s, na maioria de pessoas em fuga da Síria.

497 migrantes foram resgatados pela equipa de nove militares baseada na pequena ilha de Kastellori­zo, sob o comando do alferes Tiago Brandão, de 27 anos. “Somos obrigados a controlar a nossa carga emocional perante as situações que vemos no mar. Há coisas que mexem connosco, como o choro das crianças”, conta o oficial. Dos migrantes que resgataram, 241 eram originário­s da Síria, 222 têm a nacionalid­ade iraquiana, 31 vinham do Koweit e havia ainda dois da Palestina e um da Eritreia. Dos muitos dramas humanos a que já assistiu, Tiago Brandão recorda o caso da cidadã síria , grávida, que viajava com o marido e os três filhos num bote de borracha mais do que lotado. Com o nervosismo e o stress rebentaram as águas à mulher, ainda a bordo. “Resgatámos a senhora, em segurança, para a nossa embarcação, e uma hora depois ela entrou em trabalho de parto no único hospital de Kastellori­zo. Houve uma médica na ilha que assumiu a responsabi­lidade da situação. Depois do parto, essa médica acompanhou a paciente e a família na transferên­cia para a ilha de Rhodes, onde havia melhores condições de internamen­to e assistênci­a.”

Há cerca de uma semana, a equipa deparou-se, ao largo de Kastellori­zo, com uma embarcação de borracha com sete metros de compriment­o e 60 pessoas a bordo. “Os adultos vão sentados nos flutuadore­s e as crianças vão no meio. Arriscam muito. Para navegar de forma segura, teriam de ir no máximo dez pessoas naquele barco. Por vezes encontramo­s passageiro­s com gripe, febre e enjoos”, contou.

A 26 de agosto, a missão da GNR em Kastellori­zo também resgatou um iraquiano que viria a ser detido pelas autoridade­s gregas por facilitar a imigração ilegal. A detenção de suspeitos por crimes como tráfico de seres humanos ou imigração ilegal nunca é assegurada pela GNR, que os encaminha sempre para as autoridade­s helénicas. Os militares asseguram que o resgate e o encaminham­ento são feitos em segurança.

Os migrantes vêm por terra até à

“Resgatámos a senhora, em segurança, e uma hora depois ela entrou em trabalho de parto no hospital”

ALFERES TIAGO BRANDÃO

CHEFIA A EQUIPA DA GNR EM KASTELLORI­ZO

fronteira da Turquia, onde apanham os barcos para as ilhas gregas. Os pagamentos por pessoa, por travessia, variam entre os 500 e os 2000 euros. E a imigração ilegal envolverá redes em que se encontram iraquianos, sírios e turcos.

À GNR cabe fazer a primeira abordagem. “Primeiro identifica­mos quem fala inglês no barco. Já houve uma situação em que ninguém a bordo falava inglês e então comunicámo­s por gestos.”

A equipa de Kastellori­zo usa uma embarcação de alta velocidade de patrulhame­nto costeiro, para onde transfere os resgatados. Na ilha de Kastellori­zo, que tem apenas 492 habitantes, os nove militares da GNR constituem a única presença estrangeir­a. “Estamos alojados num hotel. Falamos com a família várias vezes, agora ainda mais facilmente pois já não se paga roaming na Europa. Adaptámo-nos aos costumes e à comida grega, embora haja aí algum pessoal da equipa que de vez em quando faz uns pratos tradiciona­is portuguese­s, para matar saudades”, conclui Tiago Brandão. Ficarão até 31 de outubro.

Na Grécia estão também 11 agentes da Polícia Marítima que desde maio já salvaram 538 migrantes. Esta equipa ao serviço da Frontex, na missão Poseidon 2017, opera a partir de Molivos, na ilha de Lesbos, disse o porta-voz da Autoridade Marítima Nacional, comandante Coelho Dias. Ao contrário da missão realizada em 2015-16, esta participaç­ão da PM está “muito mais focada no controlo da fronteira” – na sequência do acordo estabeleci­do entre a UE e a Turquia – e menos na busca e salvamento no mar. Os agentes fazem ações de controlo e vigilância das fronteiras marítimas gregas, abrangendo o combate à imigração ilegal, ao tráfico de armas e droga ou outros crimes transfront­eiriços. A missão deveria durar seis meses, até final de outubro. Mas a pedido da Frontex e das autoridade­s gregas, a presença da PM vai prolongar-se até 31 de janeiro do próximo ano. A equipa da PM opera com uma embarcação com cabina – tendo outra de reserva – nas águas entre a Turquia e a Grécia, além de ter uma viatura de vigilância costeira. Conta ainda com dois técnicos de manutenção: um militar cedido pela Marinha para a área das máquinas e um faroleiro, da Autoridade Marítima, responsáve­l pelas componente­s elétrica e eletrónica daqueles meios, referiu Coelho Dias. Com MANUEL CARLOS FREIRE

 ??  ?? Dois elementos da equipa da GNR em Kastellori­zo num resgate. Em baixo, o alferes Tiago Brandão (à esquerda), que lidera o grupo
Dois elementos da equipa da GNR em Kastellori­zo num resgate. Em baixo, o alferes Tiago Brandão (à esquerda), que lidera o grupo
 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal