Governo escolhe pela segunda vez diplomata para liderar as secretas
Depois do desaire com o embaixador José Júlio Pereira Gomes, o primeiro-ministro volta a indigitar para a liderança do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) um diplomata. Desta vez uma mulher
Fonte oficial do PSD salientou que esta nomeação não tinha “o respaldo do partido”, pois Passos Coelho não se tinha pronunciado
A expectativa não é pequena para avaliar Maria da Graça Mira Gomes, a embaixadora que o governo indigitou para secretária-geral do SIRP, a estrutura que coordena as secretas. Adip lo mataéasegun da escolha de António Costa, que tinha definido esta carreira como perfil, depois do desaire com José Júlio Pereira Gomes, obrigado a renunciar ao convite, envolvido em acesa polémica sobre o seu desempenho profissional como embaixador em Timor-Leste.
Mira Gomes vai enfrentar uma estrutura em plena crise, segundo as palavras do ainda secretário-geral Júlio Pereira, que ocupa o cargo desde 2005. As secretas nacionais perderam“dignidade ”,“operacionalidade ”,“competitividade” e têm um estatuto “obsoleto” para enfrentar as ameaças à segurança nacional, escreveu Júlio Pereira num do- cumento/parecer que enviou à Assembleia da República, a propósito da lei dos metadados. Vai enfrentar também uns serviços ainda a recuperar daquela que será a maior fuga de informações da história das nossas secretas: o caso do agente do SIS suspeito de espiar para a Rússia. Júlio Pereira pediu a sua exoneração em maio último, dias antes da visita do Papa Francisco.
Não é inédita a escolha de uma mulher para as secretas, embora seja a primeira a este nível superior. Em 2004, a juíza desembargadora Margarida Blasco, atual inspetora-geral da Administração Interna, foi nomeada por Durão Barroso para diretora-geral do Serviço de Informações de Segurança (SIS), agência que, com o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), constitui o SIRP.
Graça Mira Gomes terá grande poder nas suas mãos, pois estão na dependência do secretário-geral todas as decisões relacionadas com a gestão de recursos humanos, orçamentos do SIS e SIED, segurança das operações e toda a estratégia definida para os espiões. Poderá ter de substituir o atual diretor do SIED, Casimiro Morgado, que já manifestou internamente esse interesse, e diplomaticamente pode querer manter por perto o atual diretor do SIS, Neiva da Cruz, que lhe poderá servir como elo de ligação a uma estrutura que lhe é estranha e cheia de peculiaridades, características do mundo dos espiões. Para o SIED, que lida com a espionagem no estrangeiro, pode chamar um diplomata com experiência internacional.
Atual representante permanente de Portugal na Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), com sede em Viena, desde 2015 (nomeada ainda durante o anterior governo), Graça Mira Gomes é considerada uma mulher determinada. “Conheço-a bem enquanto embaixadora na OSCE e estamos perante uma excelente profissional. Extremamente dedicada, discreta e com grande espírito de missão”, sintetiza a deputada socialista Isabel Santos, atual vice-presidente da Assembleia Geral da OSCE.
O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia, ex-presidente do Conselho de Fiscalização do SIRP, acredita que “a experiência” que Graça Mira Gomes tem tido na OSCE “em matéria de segurança e da coope- ração internacional pode ser, no atual contexto de ameaça terrorista, uma mais-valia para o cargo que irá desempenhar”. PSD não se oporá? Em declarações à Lusa, fonte oficial do PSD salientou que a nomeação não tinha “o respaldo” do partido, pois Pedro Passos Coelho não se tinha pronunciado. No entanto, fonte social-democrata com conhecimento do processo de escolha contou ao DN que Passos Coelho foi informado por António Costa do novo nome há cerca de duas semanas. “Não manifestou a sua concordância nem oposição. Apenas registou”, confidenciou. Mas acrescenta que, “quando se realizar a audição no Parlamento, o PSD não se vai opor”.
A nomeação de Graça Mira Gomes será ainda precedida de uma audição parlamentar conjunta com as comissões de Defesa e de Assuntos Constitucionais.